Eleições 2012: ‘Campanha de pobre é assim: na raça’

Sem dinheiro, sem história política e sem tempo de TV, candidatos nanicos a vereador em São Paulo apostam em estratégias baratas (e inusitadas) para chegar à Câmara Municipal

Visitar comércios do bairro onde mora é uam das estratégias de Hilda Furação para conseguir votos (Fotos: Danilo Ramos/ RBA)

São Paulo – Quando chegamos ao escritório do candidato a vereador Antonio D’Agosto (PRB), mais conhecido como Vira-Lata, fomos recebidos pelo primo dele, com ar de preocupação: “Hoje não tem campanha. Ele teve de levar o pai ao hospital”. Algumas horas depois, o candidato telefonou para a redação pedindo desculpas. Ele se divide diariamente entre o trabalho no escritório de contabilidade, os cuidados com o pai, de mais de 80 anos, e sua propaganda eleitoral, que faz sozinho, dirigindo um carro com uma caixa de som que toca seu jingle pelas ruas de São Paulo. “Campanha de pobre é assim: na raça”, resume Vira-Lata.

Essa é a realidade da maioria dos 1.191 candidatos a vereador de São Paulo, que disputam, um a um, os votos dos 8.614.071 eleitores paulistanos para conquistar uma das 55 cadeiras da Câmara Municipal. Sem dinheiro, sem história política e sem tempo de TV, eles saem pelas ruas visitando amigos, distribuindo panfletos, pendurando cartazes e colocando carros de som para tocar.

A motivação para entrar na política também é comum: a vontade de brigar por melhorias para a comunidade. “É possível fazer muito mais pelo povo. Por onde você anda as pessoas estão insatisfeitas com o retorno que não têm dos políticos”, observa Vira-Lata.

Com uma campanha “simples e humilde”, ele promete que se eleito será o “fiscal do povo” e irá monitorar o uso de recursos públicos da cidade. Entre latidos de cachorro e melodias animadas, seu jingle engraçado reafirma a proposta: “Para combater a corrupção Vira-Lata é um cachorro no portão/ Solta Pitbull, menino, que esse Vira-Lata resolve. Pega ele, Vira-Lata!”.

“É a campanha do tostão contra o milhão”

O custo das campanhas para vereadores em São Paulo varia de R$ 5 milhões, limite estipulado pelo PSDB, a R$ 50 mil, teto do PCO. “Eles também contam com o auxilio do partido, que entrega materiais impressos, e podem conquistar doações de amigos. Mas a principal característica das campanhas a vereador, independentemente da cidade, é a falta de recursos”, afirma o coordenador do curso de Marketing Eleitoral da ESPM, Vitor Trujillo.

Transsexual, Bruna não tem propostas para população LGBT (Fotos: Danilo Ramos/ RBA)

É o caso da candidata a vereadora Bruna Babalu (PSOL), que afirmou estar se endividando para tocar a campanha. Recursos até podem faltar, mas sobra força de vontade: ela reuniu cinco amigas e formou uma equipe de trabalho para entregar panfletos e alavancar a candidatura.

No primeiro dia de campanha, as meninas, uniformizadas, se reuniram na saída do metrô Parada Inglesa, na zona norte da cidade, para conversar com os passageiros sobre as propostas da candidata, que incluem ampliar o quadro de funcionários do pronto-socorro de Santana, revitalizar o clube Jardim São Paulo, na região, e “tentar trazer o período integral para as escolas” de ensino fundamental.

O “panfletaço” foi uma sugestão do partido, que doou os materiais de campanha. “Soube que a Leci Brandão fez muitas ações como essa e conseguiu se eleger”, contou no intervalo entre um trem e outro. “É a campanha do tostão contra o milhão. A gente sabe que tem candidatos aí que investem muito, né?! E a gente realmente tem uma campanha mais modesta, mas vamos onde está o cidadão, no corpo a corpo”, conta Bruna.

"Acho que o corpo a corpo dá mais resultado do que mala direta", avalia a candidata

No vaivém apressado do metrô, ela e sua equipe disputavam a atenção com música de barracas de churrasco e gritos de “Só Jesus Salta”, brincadeira de membros de uma igreja evangélica. Mas a candidata recebeu reforços: três mestres da bateria da escola de samba Tom Maior, na qual ela é responsável pelas fantasias, chegaram para tocar. Bruna acompanhava sambando – e abusando de simpatia: “Boa noite! Posso deixar um panfleto com você? Os projetos estão na parte de atrás”.

Além das ações no metrô, Bruna quer divulgar sua campanha nos churrascos realizados regularmente na quadra da escola e visitar os bairros de Campo Limpo e Butantã e a favela São Remo, ao lado da Cidade Universitária, onde tem conhecidos. “Esse trabalho tem de ser diário, principalmente no último mês. O pessoal tem memória curta”.

Aposta na comunidade

Há 50 anos na Vila Carrão, zona leste, a candidata Hilda Furação (PPS) quer usar sua popularidade no bairro para atrair votos. Essa é uma estratégia inteligente, de acordo Vitor Trujillo, da ESPM, para quem “o sucesso da campanha de vereador está mais ligado à popularidade do candidato que ao investimento”.

"Meu nome não veio da novela não. Foi um amigo que me deu porque resolvo qualquer problema", conta a candidata

Aproveitando a rima a candidata criou, sozinha, seu slogan: “Hilda Furação, amiga do povão, que vai dar um jeito no Carrão e na região”. Na batalha para conseguir os “muitos votos” que afirma precisar para se eleger, ela conta com o apoio dos amigos. Em uma força-tarefa, eles estão cadastrando todos os vizinhos para receber visitas da candidata.

Engajada, Hilda trabalha com política desde 1994 e faz parte do conselho de saúde do bairro. “Ela consegue presente para as crianças no Natal, remédios e cadeiras de rodas para quem precisa”, conta o amigo Pedro Amadeu, orgulhoso.

No seu primeiro dia de campanha, Hilda saiu com os amigos em uma feira livre no Carrão para cumprimentar os vizinhos e informá-los sobre sua candidatura. Figurinha carimbada na feira, ela caminhava aos gritos de “agora vai, Furacão!”

Zé da Lua aposta nas redes sociais para conseguir votos

O candidato Wagner da Silva (PTN), conhecido eleitoralmente como Zé da Lua, também aposta nos votos dos grupos culturais em que atua para se eleger. Porém, sua campanha abusará da criatividade: unindo seus conhecimentos de jornalista e de cineasta, ele pretende produzir filmes curtos de campanha e divulgá-los em redes sociais para conquistas os votos.

“Dinheiro não tenho, então tenho de ter uma estratégia boa. Meu foco será mais a internet, para fazer com que as pessoas compartilhem e divulguem minha campanha”, conta. “Quero mostrar que São Miguel, um dos bairros mais antigos de São Paulo, pode ter pela primeira vez um candidato da região eleito vereador”.

Estudioso da cultura nordestina, o candidato quer projeto de lei para preservar o maracatu

Com um trabalho amplo sobre cultura nordestina, escolheu um nome de urna que homenageie aquele que ele considera “o maior artista de todos os tempos”: Luiz Gonzaga, também conhecido como Mestre Lua. Ele planeja criar um projeto de lei para valorizar o maracatu e oferecer remuneração mensal para mestres de cultura que se dediquem exclusivamente a função.

A campanha ainda não está oficialmente lançada, mas ele promete que se vencer as eleições irá cortar o cabelo que deixa crescer há dez anos. “Estou entrando na política inspirado em Padre Cícero. Ele também seguiu esse caminho para defender seu povo.”

 

 

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