Audiência pública sobre concessão de terreno para Instituto Lula vira bate-boca

São Paulo – O que era para ser um debate sobre a concessão de um terreno público para uma instituição privada instalar um espaço cultural acabou se transformando numa acalorada […]

São Paulo – O que era para ser um debate sobre a concessão de um terreno público para uma instituição privada instalar um espaço cultural acabou se transformando numa acalorada discussão. O assunto era a cessão, pela prefeitura de São Paulo, de um terreno onde o Instituto Lula, criado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ergueria o chamado Memorial da Democracia (leia quadro abaixo). E o fórum era uma audiência pública, hoje (10), na Câmara Municipal. Apesar do ambiente adequado, o viés ideológico e partidário adquirido pelo evento contaminou seu rumo.

Salvo exceções, representantes dos movimentos Revolucionários Online e NasRuas proferiam discursos odiosos contra Lula e contra o PT, palavras sustentadas também pelo vereador Floriano Pesaro (PSDB). “O PT sempre jogou contra a democracia”, disse o parlamentar tucano, apoiado por Marcelo Reis, do grupo Online: “Nós queremos ali uma área para o povo, isso é para o PT. O ato de doar é ilegal, é imoral e é criminoso”, disse.

Entenda o projeto

Proposto pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD), o Projeto de Lei número 29/2012 prevê a concessão, por 99 anos, de uma área de aproximadamente 4.000 metros quadrados ao Instituto Lula, comandado pelo ex-presidente, para a construção do chamado Museu da Democracia

Localizado à Rua dos Protestantes, no centro de São Paulo, na área conhecida como “cracolândia”. Perto do terreno já existem o Museu da Língua Portuguesa e o da Resistência.

A concessão do terreno vem sendo conversada entre Kassab e Lula desde meados do ano passado. Entretanto tornou-se público somente no início deste ano, junto com rumores de que Kassab ensaiava uma aproximação a Lula no processo de migração do DEM para seu novo partido; e de que Lula o estimulava na empreitada a fim de fragilizar o histórico dueto PSDB-DEM.

Hostilizado pela plateia, o vereador Alfredo Alves, o Alfredinho (PT), lembrou que a audiência pública foi idealizada pensando em servir como um debate técnico. “A maioria das fundamentações foi ideológica, em alguns momentos até para o campo do ódio, da raiva. Somente alguns tentaram fundamentar tecnicamente a sua defesa”, afirmou. Para ele, o instituto será, no futuro, um importante centro de referência para a pesquisa.

“Transformar uma única concessão numa espécie de substituto de todas as creches que são Paulo precisa é um argumento de natureza ideológica”, disse o petista José Américo. “O Instituto Lula virá para ajudar a revitalizar aquela área (a chamada cracolândia)”, defendeu.

Diversos oradores ponderaram que seria preferível a construção de uma escola, hospital ou creche no local. A concessão de um terreno avaliado em aproximadamente R$ 20 milhões foi o ponto central das críticas. “Nossa proposta é que se construa um posto de saúde para atender dependentes químicos e especiais”, disse Carla Zambelli, do Movimento NasRuas.

O fator Lula

Sonia Barbosa, do grupo Voto Consciente, afirmou que todos os vereadores que votaram favoravelmente ao projeto de concessão teriam sido “comprados” pelo prefeito Gilberto Kassab. Marcelo Brunella, que afirmou não pertencer a nenhuma organização partidária ou social – mas que se define como “tucano” em seu perfil no Facebook –, discordou “que apenas um nome (Lula), dentre tantos heróis que tivemos, seja o farol da democracia. Isso é um desrespeito a todos que lutaram”.

O presidente da audiência, vereador Tião Farias (PSDB), afirmou que o Brasil precisa de um espaço para mostrar a luta pela democracia. Entretanto, isso, segundo ele, precisa ser idealizado por um grupo plural. “O memorial da democracia é uma coisa da sociedade, tem de ser feito por um colegiado de partidos, de entidades, e não um instituto. Isso é contrariar o bom senso.” Ele contou que o PSDB irá apresentar um projeto substitutivo para se fazer o memorial da democracia.

O vereador Francisco Chagas (PT) lembrou que a iniciativa foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça da Casa, responsável por avaliar a constitucionalidade das propostas. “Do ponto de vista jurídico e técnico não há nenhuma ilegalidade. Não havendo problema técnico, há de se discutir se é ou não pertinente ao interesse político”, disse.