PSDB descarta ‘Alckmin paz e amor’

Para tucanos, historicamente hostis ao PT e aos movimentos sociais, reuniões do governador com sindicalistas, reajustes salariais e elogios a Dilma são apenas fruto da conjuntura

A nova postura de Alckmin tenta sugerir uma hostilidade menor com o governo federal (Foto:Cris Castelo Branco/ Divulgação Governo do Estado de SP)

São Paulo – Reuniões com centrais sindicais, aumento salarial para algumas categorias profissionais do serviço público, elogios à presidenta Dilma Rousseff e integração de políticas. Geraldo Alckmin (PSDB) vive o nono mês de seu terceiro mandato como governador de São Paulo em um panorama diferente do que os paulistas acostumaram-se a ver nas gestões do PSDB no estado.

O encontro de lançamento do programa Brasil Sem Miséria – Sudeste, com afagos a Dilma, foi o sinal mais marcante de uma possível versão “paz e amor” do governador. Ao mesmo tempo, uma demonstração de esforço para se descolar de vez de seu principal desafeto dentro do partido, José Serra, cuja postura era sempre de hostilidade ante o governo federal e de poucos amigos em relação aos movimentos sindicais e sociais.

Na bolsa de apostas da política, há quem enxergue na versão 2011 de Alckmin, além de um chega pra lá em Serra, uma forma de oposição no plano federal à la Aécio Neves (PSDB-MG). O senador mineiro faz críticas pontuais, mais moderadas, e volta a se retirar da cena. A aproximação com o Palácio do Planalto também poderia ser útil para viabilizar recursos agora e uma maior visibilidade eleitoral depois.

Parlamentares do PSDB descartam mudanças na conduta de Alckmin. Argumentam que o governador está apenas respondendo a uma nova conjuntura, esta, sim, marcada por uma estabilidade econômica mais duradoura e uma nova titularidade em Brasília.

Fora isso, o governo já antecipou a diversas categorias reajustes salariais aplicados a prestação, nos próximos anos.

Em seu mandato anterior, e também nos quatro anos de José Serra/Alberto Goldman, havia imperado a política de aumentos pífios e diálogo zero. No caso dos professores, ganharam destaque as fórmulas atreladas a desempenho e méritos, sem incorporação ao salário.

“Em cada governo você tem metas e desafios a serem superados”, afirma Duarte Nogueira, líder do PSDB na Câmara dos Deputados. Nogueira considera que o fato de o estado estar bem em termos de infraestrutura abre espaço para um “arcabouço institucional” modernizado e para se “investir em capital humano”. Mas o líder evita comparar Serra e Alckmin, ou o mandato atual com anteriores.

Para Samuel Moreira, líder do governo na Assembleia Legislativa paulista, a questão é que no mandato de Serra houve muito mais pressões por recomposição salarial.“O diálogo no governo Serra foi até onde foi possível”, diz o parlamentar. Ele discorda da leitura de que o Palácio dos Bandeirantes esteve, até este ano, fechado ao diálogo. “Tivemos em 2009 crescimento zero do país”, justifica. Em 2007, 2008 e 2010 o país alcançou bons índices de crescimento e de arrecadação, sem impactos nos rendimentos dos servidores. 

Crescimento da economia brasileira %
20076,1
20085,2
2009-0,6
20107,5

Durante os mandatos anteriores, acumularam-se acusações de que os representantes do governo estadual se negaram a receber sindicalistas. Eram mais recebidos, em suas manifestações, pela Polícia Militar. Logo depois de eleito, ano passado, Alckmin chamou representantes da Força Sindical e da União Geral dos Trabalhadores (UGT) para uma conversa. A CUT, maior central do país, ficou de fora.

Em seguida, convidou para a Secretaria de Emprego e Relações do Trabalho Davi Zaia, do PPS, ex-dirigente do sindicato dos bancários de Campinas e da federação dos bancários de São Paulo e Mato Grosso do Sul – adversária da CUT no estado. Neste ano, o governador foi à celebração do Dia do Trabalho da Força, ocasião em que afirmou que sempre valorizou “mais o trabalhador do que o capital”.

Samuel Moreira admite que o movimento do governador foi uma tentativa de se aproximar da Força, e por tabela do PDT de Paulo Pereira da Silva, mas nega se tratar de uma tentativa de azedar a relação entre as duas centrais historicamente opostas, que sentarem-se como nunca à mesma mesa, no governo Lula, para negociação de temas como os reajustes do salário mínimo, a ponto de o PDT incorporar-se de vez à base aliada do governo Dilma. E Moreira não acredita também que Alckmin teria interesse em pôr o pé da política estadual na porta dessa aliança nacional. “Não é uma estratégia: essas coisas acontecem.”

Dilma e elogios

Em política, elogios nem sempre são uma maneira de agradar. Às vezes, ressaltar qualidades de alguém significa criticar defeitos de outrem. O noticiário, por exemplo, consegue dar à recente troca de afagos entre Alckmin e do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso a Dilma uma forma de atingir José Serra e, principalmente, Luiz Inácio Lula da Silva – o líder, na visão dos tucanos, a ser batido em 2014. 

Dilma, por sua vez, frequentemente “acusada” de ser uma boa gestora que não sabe fazer política, teria aproveitado o ensejo para enviar recados a alguns partidos de sua base “aliada” que andam cobrando menos guerra de investigações em ministérios e autarquias e mais amor, atenção e verbas. “Provemos que a melhor forma de administrar é buscar o bem de todos os brasileiros”, cobrou.

Para deputados alinhados e desalinhados ao Planalto, não há motivo para enxergar segundas intenções nos elogios de grão-tucanos à presidenta. Seriam apenas declarações circunstanciais, durante o lançamento no Sudeste do Programa Brasil sem Miséria, carro-chefe dos planos de governo de Dilma, e em torno do qual todos os governadores da região firmaram participação concreta e integração imediata às iniciativas federais. “Acho que tem de elogiar mesmo a atitude da presidenta”, diz Enio Tatto, líder do PT na Assembleia Legislativa. “Nada melhor que juntar esforços para resolver esse problema tão grave.”

O deputado Fernando Capez, do PSDB, entende que a convivência entre Dilma e Alckmin deve ser um modelo para a política brasileira. Ele considera que a gestão deve se dar em torno de questões técnicas, e não partidárias. Provocado a comparar a atual relação estado-Planalto com as relações entre Serra e Lula, Capez não deixa de sugerir que a diferença pode ter origem nos processos de escolha dos tucanos derrotados à Presidência nas eleições anteriores – Alckmin em 2006 e Serra em 2002 e 2010. “Quando há disputas personalistas em que a visão de cada um suplanta a do próprio partido, isso é muito ruim”, define. 

Os líderes tucanos tanto na Assembleia Legislativa quanto na Câmara Federal demostram que o discurso visando poupar Dilma e desconstruir Lula está afinado, e que a sombra do bem-sucedido ex-presidente perturba mais o PSDB do que um eventual sucesso da presidenta. Duarte Nogueira reitera que não vê mudanças no comportamento do Palácio dos Bandeirantes. Para ele, a mudança se deu em Brasília. “Lula é uma pessoa do rompimento, de fazer a política do contraste e da diminuição de seu adversário.” Samuel Moreira concorda, argumenta que Dilma tem “capacidade intelectual melhor”, embora veja “vaciladas” da presidenta. “De vez em quando ela tem uma recaída de achar que o país só teve sucesso agora, nunca teve melhora. Aí estreita um pouco.” 

O petista Enio Tatto concorda que houve mudanças, mas em São Paulo, e não na capital federal. Para ele, o fechamento de Serra à conversa prejudicou o estado na relação com Brasília, e Alckmin adotou outra postura. “Tomara que continue assim, porque São Paulo já perdeu muito dinheiro por falta de fazer convênios com o governo federal.”

Políticos ligados ao governador discordam que ele tenha adotado uma linha mais branda. Apenas gostam de repetir a máxima de que política é corrida de revezamento, e o corredor que assume o bastão precisa ir melhor que o anterior. Longe deles considerar que Alckmin seja apenas um pacato candidato com um olho na reeleição em 2014 e outro em cacifar-se com menos riscos para a disputa do bastão federal em 2018 – se as regras e o calendário não mudarem até lá.

Tatto, por sua vez, lembra que os tucanos teriam de “combinar com os russos”, pois a corrida de bastão é complexa. “Até lá tem muita coisa pela frente. Vamos para a reeleição da Dilma e depois vamos tentar fazer a sucessão da Dilma com um candidato do PT.” 

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