Juca Ferreira defende que Marina tome posição no 2º turno

Fundador do PV vê 'onda Marina' como responsável pelos 19 milhões de votos recebidos pela candidata. 'Não houve 'onda verde'', alerta

Juca Ferreira ainda não sabe se voltará ao PV depois da eleição (Foto: Wilson Dias/Agência Brasil)

São Paulo – O ministro da Cultura Juca Ferreira, fundador do PV, defende que a terceira colocada na disputa à Presidência da República, Marina Silva, deveria tomar posição no segundo turno. Para ele, a senadora tem sinalizado que poderia manter uma postura de neutralidade, mas seria importante garantir, a partir de um “diálogo programático”, formas de continuar o que ele considera como avanços para o país.

Em entrevista exclusiva à Rede Brasil Atual, Ferreira explica que o comando do PV tende a apoiar Serra, mas que não necessariamente a legenda como um todo acompanharia os dirigentes. Figuras como o presidente nacional da sigla, José Luiz Penna, eleito deputado federal por São Paulo neste ano, e Fernando Gabeira (PV-RJ) – derrotado no pleito ao governo fluminense – defendem o voto em Serra.

Afastado desde março por um pedido de suspensão da filiação, Ferreira lembra que o PV elegeu o mesmo número de deputados que em 2006. “Não foi uma ‘onda verde’, foi uma ‘onda Marina'”, opina. Por isso é que a posição da candidata tende a ter tanto peso. Ele ainda não sabe se voltará à legenda depois da eleição.

O ministro ainda fala sobre a ausência do debate sobre cultura na campanha eleitoral – fruto do “aprisionamento” da campanha pelos marqueteiros – e sobre as discussões relacionadas ao aborto e a temas religiosos, permeadas de boatos e informações incompletas. Ferreira qualifica como a ação como “demagogia feita para reduzir a vantagem de votos de Dilma sobre o outro concorrente”.

Confira os principais trechos da conversa.

Rede Brasil Atual – O sr. é membro do PV, embora tenha solicitado a suspensão da filiação. Como o sr. tem visto a movimentação dentro do partido para o segundo turno?

“PV não cresceu, elegeu o mesmo número de deputados que na eleição passada. Quem teve 19 milhões de votos foi Marina. Não foi uma ‘onda verde’, foi uma ‘onda Marina'” – Juca Ferreira, ministro da Cultura e fundador do PV.

Juca Ferreira – Não há qualquer definição até o momento. Estou afastado do partido, mas por ser filiado tenho interesse na posição assumida. Amanhã (neste sábado 9), um artigo meu será publicado em um jornal da grande imprensa em que me posiciono a respeito. Pelo que acompanho nos jornais, há três posições. Uma pela neutralidade, atribuindo voto aos eleitores e sem escolher posição. Outros são pró-Serra e pró-Dilma. Tudo isso em meio a todo tipo de declaração, resmungos e manifestações a que todos têm direito. Quem controla o partido tende para o Serra, mas não necessariamente o partido vai acompanhar o senhor (José Luiz) Penna (presidente nacional do PV).

Rede Brasil Atual – A votação expressiva de Marina entra na conta?

“Acredito que ela (Marina) deveria buscar um diálogo programático, porque assim é a democracia. O diálogo com o diferente permite alianças importantes para fortalecer um processo como o atual de desenvolvimento com milhares de brasileiros saindo da miséria e da pobreza.” – Juca Ferreira, ministro da Cultura e fundador do PV.

Juca Ferreira – O PV não cresceu, elegeu o mesmo número de deputados que na eleição passada. Quem teve 19 milhões de votos foi Marina. Não foi uma “onda verde”, foi uma “onda Marina”. E identifico três origens de voto da candidata. Os 8% a 13% iniciais vêm da identificação com questões relacionadas à proteção do meio ambiente e à sustentabilidade. Depois, juntaram-se votos evangélicos, de pessoas contrárias ao aborto, contra o casamento gay; um voto mais religioso e carregado de conotação moral. Por último, está o voto ligado ao caso Erenice (Guerra, ex-ministra-chefe da Casa Civil), de eleitores zangados com o PT, mas que não votariam em Serra. O voto mais ligado ao PV é a parte associada a temas ambientais. Por isso, vai ser decisiva (a posição) para onde Marina for.

Rede Brasil Atual – Que posição o sr. vislumbra para Marina?
Juca Ferreira
– Ela (Marina) deu declarações indicando uma possível neutralidade, talvez para tentar ser ainda uma terceira via e se candidatar novamente em 2014. Acredito que ela deveria buscar um diálogo programático, porque assim é a democracia. O diálogo com o diferente permite alianças importantes para fortalecer um processo como o atual de desenvolvimento com milhares de brasileiros saindo da miséria e da pobreza.

“Os marqueteiros acham que a cultura não dá votos, ficam em temas como educação, saúde, segurança pública, aprisionando um pouco o debate. Acredito que não basta alimentar a população, é preciso garantir acesso a conhecimento, a cultura” – Juca Ferreira, ministro da Cultura e fundador do PV.

Rede Brasil Atual – Depois desse processo, o sr. pretende voltar ao PV?
Juca Ferreira
– Sou fundador do PV, filiado há mais de 20 anos. A relação com o partido político quando é sincera é como um casamento, é programática e também afetiva. Usei meu direito de cidadão de suspender minha filiação. Ainda preciso pensar se quero voltar, se me querem de volta.

Rede Brasil Atual – A Cultura, área da pasta presidida pelo sr. no governo federal, é um tema deixado de lado na campanha apesar da tônica de comparação adotada pela candidatura governista. Por que isso acontece?
Juca Ferreira
– Somos muito melhores do que o governo anterior em todos os aspectos. Em termos éticos, de recursos, de abrangência, de distribuição regional de recursos, financeiros, de estímulo à cultura… Mas os marqueteiros acham que a cultura não dá votos, ficam em temas como educação, saúde, segurança pública, aprisionando um pouco o debate. Acredito que não basta alimentar a população, é preciso garantir acesso a conhecimento, a cultura. Os candidatos se posicionaram eventualmente sobre o tema, mas concordo com você que o debate foi superficial.

Rede Brasil Atual – O sr. mencionou o eleitorado que se pauta por questões religiosas e morais como sendo um dos componentes dos votos de Marina. Como o sr. vê a dominação do aborto sobre o cenário
Juca Ferreira
– Há um equívoco muito grande. Ao eleger um presidente o que se discute é o que o país ganha ou perde com aquela presença. O aborto não é um projeto para o país. Questões de saúde, educação, inclusão social e de meio ambiente. Como o governo Lula é muito melhor do que o anterior, interessa (à oposição) trazer qualquer outro tema. A quantidade de pessoas que deixaram a miséria e a pobreza é equivalente à população da Espanha, um fato extraordinário, é isso que tem de ser discutido. Ninguém é a favor do aborto, mas acontecem 100 mil abortos por ano (apesar da proibição e da criminalização). As mulheres ricas têm acesso a clínicas especializadas, mas as pobres recorrem a garrafadas e soluções sem qualquer segurança. Até agulhas de crochê chegam a ser usadas. É o direito à vida dessas mulheres. Mas a discussão não afeta o governo federal, é uma demagogia e feita para reduzir a vantagem de votos de Dilma sobre o outro concorrente.