Campeão de votos do PSOL propõe ‘nenhum voto ao Serra’

Em conversa com a Rede Brasil Atual, Chico Alencar lembra que há grandes diferenças entre PT e PSDB, e classifica de 'moralismo medieval' o trabalho da campanha de José Serra

Rio de Janeiro – “A decisão tomada pelo PSOL, por absoluta unanimidade, foi que não é concebível sob o ponto de vista programático e da história de nosso jovem partido se afiliar à candidatura demotucana de José Serra. Nós não temos nenhuma identidade programática, de visão de mundo e de prática política com o PSDB e o DEM. Portanto, nenhum voto ao Serra”. A afirmação do deputado federal Chico Alencar, reeleito pelo Rio de Janeiro com 240,7 mil votos, reflete a postura que já havia sido antecipada nas ruas pela militância do PSOL contra a eleição do candidato tucano à Presidência, que o partido qualifica como retrocesso político no país.

Em conversa exclusiva com a Rede Brasil Atual, Chico Alencar contou que outra decisão unânime tomada pela direção do PSOL na reunião de sexta-feira (15) foi não se alinhar ou participar do futuro governo, mesmo em caso de vitória da candidata do PT, Dilma Rousseff, a quem o partido decidiu recomendar o voto crítico: “Os parlamentares eleitos pelo partido, assim como seus representantes nas organizações dos movimentos sociais, terão independência crítica em relação ao novo poder nacional que será constituído, qualquer que ele seja”, diz o deputado.

Feita esta ressalva, Chico é categórico: “A situação conjuntural mais imediata, que diz respeito ao segundo turno, nos coloca diante dessa opção: de um lado o regressismo conservador e com uma campanha de um moralismo medieval, retrógrada e onde se usa o nome de Deus em vão à vontade que o demotucanato promove; de outro, a candidatura, ainda que recuada e com constantes retrocessos em termos de declaração e rebaixamento programático, que Dilma representa”.

Chico considera que um eventual governo Dilma dará ao PSOL e à esquerda em geral um patamar de contradições e possibilidades de avanços maiores: “No governo de Dilma, nós entendemos que os movimentos sociais terão mais espaço, ainda que com a prática do governo Lula de cooptá-los. Mas, isso é muito superior a reprimi-los como é a prática do tucanato, das elites e do DEM”.

O papel do Estado, ponto onde as concepções petista e tucana entraram em clara rota de colisão durante a mais recente crise econômica global, também é citada pelo deputado: “Nos toca a questão do próprio Estado e do poder público como um ente importante para viabilizar políticas que interessem, sobretudo, aos mais explorados e mais pobres. A concepção do PT, mesmo rebaixada com a aliança com o PMDB, é diferente da concepção do PSDB e do DEM. Para nós, a do PT nesse caso também permite mais e maiores avanços”.

Por fim, Chico aponta a política externa como outro campo onde a volta de tucanos e demistas ao poder representaria claro retrocesso para o Brasil: “Para DEM e PSDB, a política externa brasileira precisa estar inteiramente atrelada aos ditames do império, às coordenadas dos Estados Unidos. O PSOL defende uma política externa independente e de diálogo com governos populares latino-americanos como em significativa parte o governo Lula promoveu. Portanto, nesse caso não há dúvidas”, afirma.

Chico conclui sua análise afirmando que a declaração de voto crítico em Dilma não significa um alinhamento programático ou mesmo a apresentação de uma pauta de reivindicações do PSOL à candidata do PT: “É simplesmente um voto sabendo que para o Brasil não é a mesma coisa um governo de PSDB e DEM e um governo do PT, apesar das alianças preferenciais que fez”.

“PSOL mais amadurecido”

O PSOL saiu um pouco modificado das urnas. Reeleições com votação expressiva fizeram de Chico Alencar o segundo deputado federal mais votado do Rio de Janeiro (atrás somente do ex-governador Anthony Garotinho, reeleito pelo PR) e reconduziram Ivan Valente a um novo mandato de deputado federal por São Paulo. Por outro lado, o partido não conseguiu reeleger Luciana Genro, uma de suas mais emblemáticas figuras, no Rio Grande do Sul. Outra derrota, inesperada pela maioria da militância do PSOL, foi a não-eleição de Heloísa Helena ao Senado por Alagoas.

Apesar dos percalços eleitorais, com a chegada dos novatos Jean Wyllys (RJ), Marinor Brito (PA) e Randolfe Rodrigues (AP), o PSOL aumentou sua bancada federal em uma cadeira. Para Alencar, o partido se coloca como uma sigla pequena de esquerda, mas que tem contato com os movimentos “reais da sociedade”.  “Um exemplo disso é nossa posição em relação ao segundo turno, que não fica na proclamação do voto nulo e na visão – ao nosso ver, superficial – de que as duas candidaturas e os dois projetos para o Brasil são absolutamente iguais. Há semelhanças, sim, pois não afetam no âmago os interesses do grande capital, mas não é a mesma coisa”, analisa.

O partido, segundo o deputado, está mais maduro: “A decisão em relação ao segundo turno mostra um PSOL talvez mais amadurecido, que vai manter firmeza programática e de princípios, mas que terá também a sabedoria de fazer as flexibilidades táticas necessárias. Um partido que, sem perder as fronteiras éticas e ideológicas que muitas vezes o PT perde, vai saber dialogar com os movimentos vivos da sociedade, vai saber ter o censo de onde avançar e de onde não dá para avançar. Não vamos rebaixar o nosso projeto de resignificação do socialismo, mas também não vamos ficar em um gueto olhando para o próprio umbigo”.