Para analista, pesquisas eleitorais estão voltadas a alianças

Cientista político lembra que levantamentos encomendados por partidos precisam ser vistos com cautela, mas movimentação ocorre porque prazo para trocar de partido está próximo

(Montagem de fotos de Gilberto Nascimento/Agência Câmara, Antônio Cruz/Agência Brasil e José Cruz/Agência Brasil, da esquerda para a direita)

O cientista político Humberto Dantas, diretor do Centro de Pesquisa e Comunicação (Cepac), acredita que a divulgação do resultado de pesquisa eleitoral encomendada por partidos políticos precisa ser analisada com cautela. Em entrevista à Rede Brasil Atual, ele sustenta que os dados têm um importante papel para a definição das posições no jogo político para 2010 e a movimentação neste momento está relacionada ao fato de que o prazo para mudança de partido termina no fim de setembro – um ano antes da votação de primeiro turno.

Para Dantas, caso a pesquisa divulgada pelo Partido Verde tenha sido realizada com seriedade, os resultados mostram um cenário preocupante para a pré-candidata do governo, Dilma Roussef (PT-RS). “É um tanto complicado para o governo, porque mostra que uma candidata sobre a qual o presidente, com sua imensa popularidade, vem se debruçando há mais de um ano atrás de uma ministra preterida por ele”, pondera.

Entrevista

Humberto Dantas

Cientista político e diretor do Cepac, empresa de pesquisa e comunicação na área política

Isso coloca ainda a dúvida sobre a viabilidade de uma aliança nacional com o PMDB, considerada fundamental para a candidata governista. “Todo mundo sabe que todo o custo de apoiar (a permanência de José) Sarney no Senado está aliada a buscar o PMDB para garantir mais tempo de TV”, afirma.

O cientista político ainda avalia que, enquanto a postura de Marina Silva (PT-AC) está vinculada a um projeto, a reação de Ciro Gomes (PSB-CE) está ligada ao jogo político. A avaliação de Dantas é de que a senadora do Acre poderia alcançar 10%, porque teria menos tempo de TV e estrutura de campanha.

Confira os principais trechos da entrevista:

RBA – Como o senhor analisa a divulgação de pesquisas eleitorais encomendadas por partidos políticos?

“São dados muito preliminares. Ainda que sejam feitas com seriedade, são conjunturais, fotografias de um momento que não necessariamente é estratégico para o resultado da eleição”– Humberto Dantas

Pesquisas encomendadas dentro dos partidos ocorrem a todo instante. É preciso entender com que bases foram feitas antes de analisar. A reportagem do Estadão diz que a Dilma está atrás do PV no confronto direto, Heloísa Helena na frente da Marina, Ciro com 16%.

Que pesquisa foi essa e quem a realizou? São dados muito preliminares. Ainda que sejam feitas com seriedade, são conjunturais, fotografias de um momento que não necessariamente é estratégico para o resultado da eleição. É um período importante para o que se anuncia em relação a alianças, acordos e acertos políticos.

Agora, se os dados procederem, é um tanto complicado para o governo, porque mostra que uma candidata sobre a qual o presidente e sua imensa popularidade vem se debruçando há mais de um ano atrás de uma ministra preterida por ele. Seria extremamente preocupante para o governo.

RBA – Mas os dados são plausíveis. Ou o senhor encontra inconsistências?

“O fim de setembro está aí. Até lá, um ano antes da eleição, as peças precisam estar em suas casas no tabuleiro para o jogo de xadrez começar. É preciso definir o partido, definir se vai ser torre ou peão até lá”– Humberto Dantas

Para me inspirar no presidente Lula e comparar com futebol, é aquele negócio: dois times vão a campo. Mas se o goleiro não jogar, empata. Se o treinador, se o camisa 10 e se a torcida não puderem entrar no estádio… É muito “se”, é difícil analisar.

RBA – E por que as pesquisas neste momento?

Porque o fim de setembro está aí. Até lá, um ano antes da eleição, as peças precisam estar em suas casas no tabuleiro para o jogo de xadrez começar. É preciso definir o partido, definir se vai ser torre ou peão até lá. Depois, esqueça. Por isso é um momento estratégico e por isso essa movimentação toda.

RBA – O que esses dados indicam?

“A lógica de precisar de muito tempo é como a de (Gilberto) Kassab em São Paulo. Em agosto, o prefeito chegou a estar atrás de (Paulo) Maluf, por um ou dois pontos percentuais. E veja o impacto posterior” – Humberto Dantas

O momento é muito instável, mas Marina Silva poderia ser “traço” (não ter percentual relevante de intenção de votos) e, nesta pesquisa, não é o caso. Ter até 20% não é para se jogar fora. Quando se começa a briga eleitoral, a coisa muda. Dilma deve ter a máquina (a seu favor), muito tempo de TV, o PT e o Lula. Todo mundo sabe que todo o custo de apoiar (a permanência de José) Sarney no Senado está aliada a buscar o PMDB para garantir mais tempo de TV. Isso é algo muito precioso para ela. A lógica de precisar de muito tempo é como a de (Gilberto) Kassab em São Paulo. Em agosto, o prefeito chegou a estar atrás de (Paulo) Maluf, por um ou dois pontos percentuais. E veja o impacto posterior.

Dilma tende a crescer, o que não significa que vá ganhar. Claro que pode bater em um limite, pode haver revertério no cenário e Serra tem boa adesão a seu nome. Talvez Heloísa Helena, Ciro Gomes e Marina Silva tenham atingido um limite. Acho que Marina é capaz de cravar 10% (das intenções de voto) por ser um partido pequeno, que dificilmente vai estabelecer grandes alianças para ter horário eleitoral mais longo. Também não vai ter os mesmos recursos das candidaturas de Dilma e de Serra para a campanha, viagens, tecnologia. Tenho dúvidas se este não seria um limite.

RBA – Desde 1994 o PMDB não lança candidato e apenas em 2006 apoiou um candidato nacionalmente. Por sua análise, considerando a fragmentação e as divisões internas, a aposta do governo em manter Sarney viabilizaria uma aliança nacional com o PMDB?

A viabilidade da aliança efetiva guarda relação direta com a demanda por tempo de TV. Isso é importantíssimo para uma candidata que não é tão conhecida. Ouvi uma história de bastidor que ilustra o que quero dizer. Quando o Corinthians foi campeão da Copa do Brasil, Lula quis receber o time. A senadora Ideli Salvatti queria um autógrafo ou uma foto com o Ronaldo. Ao chegar ao Centro Cultural Banco do Brasil, onde o presidente tem despachado, alguns torcedores a viram e gritaram: “El-el-el, a Dilma é da Fiel”. As pessoas não sabem quem é a Dilma.

E há a pergunta: o que é o PMDB? O do Maranhão e de Alagoas é uma coisa, enquanto o de Pernambuco, Rio Grande do Sul e Mato Grosso são completamente diferentes. É o partido que caracteriza de forma mais clara o federalismo, são 27 partidos mais o nacional, e sequer controlam as prefeituras. Em seu estatuto, os organismos locais são mais fortes do que em outras legendas, é dado muito valor à descentralização. Claro que isso desperta uma discussão que poderia se estender até amanhã: pode ser visto como importante porque se ouvem as bases ou que é mais fisiológico porque permite ação diferente em cada local.

RBA – Além de Marina, atualmente no PT, a pesquisa também aponta Ciro Gomes com um percentual importante de votos. Isso pode complicar a estratégia do governo de contar com o apoio do PSB?

Acredito em duas interpretações. Do ponto de vista da Marina, há a insatisfação com o PT, com o governo. Ela embarca em um projeto, em um desejo ou sonho de se tornar nacionalmente conhecida por questões de valorização do meio ambiente. Claro que há interesses envolvidos, não quero dizer que ela seja ingênua. Mas ela parte para esse projeto a partir das brigas no governo, com Mangabeira (Unger), Dilma e Lula. E isso seria feito dentro do partido que, por lógica, tem tudo a ver com esse discurso ambientalista.

O Ciro faz o puro jogo político. Ele sabe que o candidato do governo muito provavelmente vai ao segundo turno. Com o resultado da pesquisa, ele pode forçar um pedido muito alto, querer ser o nome do governo à Presidência, ter mais vantagens para aceitar a candidatura em São Paulo, ou pleitear a indicação do vice (de Dilma). Ele faz o jogo da tentativa de valorização.