Para especialista blog da Petrobras revela mudança de paradigma

Em entrevista à Rede Brasil Atual o professor Venício Lima (UnB) declarou que não dá mais para continuar com o jornalismo de 'suposição e de tese'

“Esses jornalões se sentem ameaçados porque nessa mudança de paradigma seu monopólio de mediadores vai desaparecer.” (Foto: Marcello Casal Jr/ABr)

Em entrevista à Rede Brasil Atual o professor Venício Lima, do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da Universidade de Brasília (UnB) comentou às discussões entre os veículos de comunicação e a Petrobras que criou no dia 2 de junho o blog Fatos e Dados onde publica, entre vários conteúdos relativos à estatal, perguntas e respostas que são enviadas por jornalistas à sua assessoria de imprensa.

“O Blog da Petrobras, na verdade, exacerba um conjunto de transformações e de mudanças que estão acontecendo no jornalismo e que o velho jornalismo não se apercebe”, declarou. Confira os principais trechos da entrevista.

O professor Venício Lima é pesquisador-sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da Universidade de Brasília, autor de diversas pesquisas e análises que abordam temas envolvidos no debate sobre o direito à comunicação no Brasil. É autor do livro Mídia: Crise Política e Poder no Brasil e coordenou a coletânea A Mídia nas Eleições de 2006.

RBA – O senhor acha que a divulgação antecipada das perguntas e respostas enviadas por jornalistas dos grandes veículos de comunicação a Petrobras e que vem sendo publicados no blog Fatos e Dados da estatal antes dos jornais é uma quebra de sigilo da informação?

A reação da grande mídia a iniciativa da Petrobras não me surpreende. Estamos, na verdade, assistindo a resistência da mídia tradicional, mais especificamente dos chamados jornalões a uma transformação, uma mudança de paradigma que está acontecendo no jornalismo diante da qual essa mídia não sabe como proceder e resiste a aceitar as mudanças em curso. A iniciativa de uma fonte tornar pública às respostas que dá às perguntas formuladas pela grande mídia evidencia a capacidade que a internet tem de minimizar a importância dos jornais tradicionais em prol do interesse coletivo. Ou seja, o Blog da Petrobras, na verdade, exacerba um conjunto de transformações e de mudanças que estão acontecendo no jornalismo e que o velho jornalismo não se apercebe.

RBA – O presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, na entrevista ao Roda Viva da TV Cultura disse que “como toda mídia por definição, edita, estamos querendo apresentar à íntegra”. O que ele pode querer dizer é que as informações podem ser editadas do ponto de vista a corroborar a tese do jornalista ou do jornal? Nesse sentido o senhor acha que o blog é legítimo?

Acho que a legitimidade do blog não está sendo questionada nem pela histeria coletiva da grande mídia, nem pelos que se mobilizam pra dizer que isso é “terrorismo de estado”, como tem hoje uma entrevista no jornal O Globo. O blog da Petrobras se justifica dentro da pluralidade e da liberdade de expressão. No Brasil se confunde muito liberdade de expressão com liberdade de grupos de mídia. No presente momento em que falamos há uma disputa judicial entre a Universidade Federal de Minas Gerais e o jornal Estado de Minas, de Belo Horizonte. A Universidade ganhou na justiça um direito de resposta que não foi cumprido, ganhou em 1º instância e o jornal recorreu. Enquanto isso a Universidade, no seu blog, colocou todos os esclarecimento que achava importante dar em função das questões levantadas pelo jornal. Esses jornalões se sentem ameaçados porque nessa mudança de paradigma seu monopólio de mediadores vai desaparecer.

RBA – O senhor acha que esse fato pode retomar um jornalismo que é o do bate-papo cara a cara em vez de privilegiar o comodismo de fazer entrevistas por e-mail?

Esse negócio de mandar um e-mail e ficar esperando o que a fonte vai responder não é jornalismo. Veja só, o Blog da Petrobras não impede o jornalista de fazer o que é mais importante, ir além das respostas e fazer um jornalismo investigativo comprometido com a verdade. A possibilidade de uso da informação dada pela fonte no sentido que interessa ao jornal também não é jornalismo. É partidarização, disputa política, favorecimento, interesses. Tenho insistido a exaustão que não dá mais para continuar com esse jornalismo de suposição e de tese. Não cabe mais esse monopólio de alguns jornais que não tiram nem 300 mil exemplares dia. Isso já era, acabou, mas não se deram conta disso.