Saúde pública

Suprema Corte do México declara inconstitucional criminalização do aborto

Tribunal, por unanimidade, declarou a nulidade da legislação que punia interrupção voluntária da gravidez. Antropóloga cobra o mesmo entendimento dos ministros do STF no Brasil

Diario Evolucion
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"A Suprema Corte do Brasil precisa aprender a lição do México: o aborto não pode ser um crime. É um problema de saúde pública", analisou Debora Diniz

São Paulo – Em decisão unânime, a Suprema Corte de Justiça do México declarou nesta terça-feira (7) inconstitucional o artigo 169 da Código Penal do estado de Coahuila, no norte do país, que criminalizava o aborto com pena de prisão de até três anos. A decisão, considerada histórica por ativistas e especialistas, cria jurisprudência para que as gestantes com até 12 semanas possam ajuizar ações de inconstitucionalidade contra leis locais que impeçam a interrupção voluntária da gravidez. Apesar de se tratar da descriminalização em apenas um estado, a decisão passa a ser critério para que os tribunais regionais e juízes federais invalidem punições do tipo à prática do aborto em todo o país.

Ao revogar as sanções, o tribunal considerou o “direito de decisão das mulheres e pessoas grávidas, sem enfrentar consequências criminais”. De acordo com o presidente do Supremo do México, Arturo Zaldívar, a criminalização do aborto “pune as mulheres mais pobres, as mais marginalizadas, as esquecidas e mais discriminadas do país”. Zaldívar destacou que o parecer levou em conta a autonomia e o direito à vida da mulher deve ser garantido. Ainda segundo ele, o Estado deve se abster de uma postura “paternalista”. 

De acordo com dados do Observatório de Mortalidade Materna, o aborto clandestino é a quarta causa de mortes maternas no México. Um levantamento do Instituto Guttmacher, em 2018, apontou que, no país, entre 750 mil e 1 milhão de gestantes recorrem a esse tipo de prática, anualmente, por conta da criminalização. “Condenar as mulheres à prisão, passar à clandestinidade, colocar sua saúde e vida em risco, não é só profundamente injusto, mas abertamente inconstitucional. Ele projeta uma mensagem estigmatizante e discriminatória”, completou o presidente do Supremo.

Mobilização no México

Até o momento, apenas quatro estados – Cidade do México, Oaxaca, Hidalgo e Veracruz –, descriminalizaram o aborto no país. Na capital, a despenalização ocorreu também após decisão da Suprema Corte em 2008. De maioria católica e sob forte influência de grupos antiaborto e de líderes religiosos, mais da metade dos 32 estados mexicanos, por outro lado, aprovaram emendas contrárias à interrupção voluntária da gravidez. Apesar da pressão, o Supremo Tribunal vem decidindo pela garantia do acesso ao aborto. A expectativa é de que, até o final desta semana, a Corte decida sobre a constitucionalidade da prática em Sinaloa. No estado também está em pauta uma alteração na legislação. 

De acordo com o jornal Público, a atuação do Judiciário está ligada ao movimento de milhares de mulheres no México que têm ido às ruas para reivindicar seus direitos sexuais e reprodutivos. Assim como a “onda verde” que garantiu o acesso ao aborto na Argentina. “Exercer nossos direitos também significa que nossas decisões são respeitadas e apoiadas. Celebramos a decisão do SCJN de impedir a criminalização de mulheres e grávidas em Coahuila e apoiar nossa autonomia”, declarou o grupo feminista Maré Verde do México.

A decisão do tribunal também estabelece que o direito à interrupção voluntária da gravidez deve ser garantido pelo Estado na rede pública de saúde.

Lição para o Brasil

Pelo Twitter, a antropóloga, professora e pesquisadora da Universidade de Brasília (UNB), Debora Diniz, militante feminista e dos direitos humanos, analisou que “a corte suprema do México fez a pergunta certa quando se discute direitos reprodutivos: deve o aborto ser crime?”. “A resposta foi ainda mais certa: não. Aborto é questão de direitos fundamentais e de saúde pública”, garantiu a especialista. 

Debora também reivindicou que o Supremo Tribunal Federal (STF) tenha entendimento similar. Desde 2018, a Corte tem em pauta a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442 que trata da despenalização do aborto no país. Os ministros também podem tornar nulos os artigos 124 e 126 do Código Penal que instituem como crime a interrupção voluntária da gravidez. “A Suprema Corte do Brasil precisa aprender a lição do México: o aborto não pode ser um crime. É um problema de saúde pública. Um dia de esperança para mulheres, grávidas e meninas”, cobrou. 

Apesar da vitória, as organizações feministas do México já anunciaram que devem continuar em luta pela descriminalização do aborto em todo o país. O presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, que já considerou o debate “polêmico”, declarou nesta terça, antes da decisão, que se limitará a respeitar o que a Corte decidir.

Redação: Clara Assunção
(*) Com Informações da Telesur, Brasil de Fato e Opera Mundi
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