Brics dos povos

‘Brasil não tem um problema econômico, tem consequências econômicas de um impasse político’

Durante a segunda mesa do seminário "Brics dos Povos", perspectivas sobre crises econômicas, sociais e ambientais

Isac Nóbrega/PR
Isac Nóbrega/PR
Mídia tenta parecer crítica a Bolsonaro e preservar Paulo Guedes como não se fossem do mesmo governo

São Paulo – O seminário “Brics dos Povos”, que reúne pensadores e lideranças populares dos cinco países que compõem o bloco (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), encerrou o seu primeiro dia de atividades com o tema “Crise econômica, social e ambiental e as alternativas populares de desenvolvimento”. O encontro ocorre entre hoje (11) e amanhã, dias que antecedem a reunião oficial da Cúpula do Brics em Brasília (13 e 14).

Participaram da mesa os pesquisadores Marcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); Biswajit Dhar, do Centro de Estudos Econômicos e de Planejamento, da Universidade Jawaharlal Nehru, da Índia; e Isabela Nogueira, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que falou sobre a China.

Pochmann fez uma análise sobre a natureza e a amplitude da crise que afeta o Brasil, que acumula problemas ambientais, sociais e econômicos, como destruição de biomas e elevada taxa de desempregados, desalentados e precarizados. Mesmo chamando de possível “heresia”, o professor disse não acreditar que o problema do Brasil seja econômico. “O Brasil não tem um problema econômico, tem consequências econômicas decorrentes de um impasse político de grande dimensão.”

Capitalismo e exclusão

“Constituiu-se, a partir de 2015, uma nova maioria política. A economia vai relativamente muito bem para uma parcela pequena da sociedade. Os ganhos financeiros, no ano passado, cresceram sete vezes, em um país de 104 milhões de brasileiros vivendo com um recurso diário menor do que duas passagens de ônibus. O problema do capitalismo é como tratar o excedente populacional”, disse Pochmann.

O capitalismo financeiro, que deixa de fora a mais ampla parcela da sociedade, se organiza por meio de suas instituições controladas pelo capital para perdurar, convencer a massa de ser a única saída. Abusa dos recursos e encontra eco em suas roldanas de sustentação. “Setenta milhões de brasileiros dependem de recursos públicos. O capitalismo não cria condições de vida decentes para esse conjunto.”

O economista lembra que, mesmo com um governo entreguista neoliberal de extrema-direita, que ataca direitos e impõe uma agenda de degradação para a sociedade e também para a natureza, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) ainda encontra porto seguro em instituições do capital. “O problema dos ricos é como administrar essa massa excludente. A despeito de a mídia criticar parte do governo Bolsonaro, estão todos alinhados com o projeto econômico.”

Ihsaan Haffejee

Mudar o modelo produtivo e de organização da sociedade é uma decisão política, segundo Pochmann (Ihsaan Haffejee)

Novos modelos

Pochmann refletiu sobre a situação da luta de classes no capitalismo contemporâneo, e sua perda de significado relativo aos padrões do capitalismo industrial. Sindicatos, argumenta o economista, representam uma porcentagem dos trabalhadores; aqueles de carteira assinada de determinado setor. O capitalismo hoje apresenta novas dinâmicas e novos desafios para a organização de uma totalidade trabalhista.

“Dificilmente teremos resultados diferentes dos atuais fazendo a mesma coisa. Temos uma massa de excluídos sem pertencimento. Quem representa os trabalhadores na totalidade?”, questionou. Para Pochmann, algumas instituições acumulam potencial e veem seus projetos alavancados na política econômica. “As igrejas, que estão aonde moram os excluídos. O número da expansão das igrejas no Brasil é mais amplo do que o que aconteceu no Irã. Em 2032, serão maioria no Brasil. O crime e as igrejas têm visões totalizantes. Oitenta milhões de brasileiros vão à Assembleias de Deus duas vezes por semana. O que tem lá? Tem identidade. Desempregado, é acolhido, tem grupo de procura por trabalho.”


Assista à íntegra do debate, via Brasil de Fato

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