Memória

Te recuerdo, Víctor Jara: Justiça do Chile condena assassinos do cantor

Ele foi torturado e morto com mais de 40 tiros em 1973, logo depois do golpe que levou Augusto Pinochet ao poder

Fundação Víctor Jara

Cantor e militante político esteve prestes a completar 41 anos quando foi preso e assassinado pela ditadura

São Paulo – A Justiça chilena condenou nove oficiais do Exército pelo assassinato do cantor Víctor Jara, morto logo depois do golpe militar deflagrado em 11 de setembro de 1973, que levou Augusto Pinochet ao poder. Um dia depois de sua prisão, no dia 15, a duas semanas de completar 41 anos, ele foi encontrado morto. Em seu corpo, deixado na rua, perto do Cemitério Metropolitano, foram identificados 44 impactos de bala. Segundo relatos, ele foi espancado e teve as mãos quebradas.

O juiz Miguel Vásquez, da Corte de Apelações, condenou oito oficiais a 15 anos e um dia de prisão pelas mortes de Víctor Jara e do advogado e diretor do sistema prisional Littré Abraham Quiroga Carvajal, também preso e torturado, e a mais três anos pelo sequestro das vítimas. Enquanto Jara foi preso na Universidade Técnica do Estado, atual Universidade de Santiago, onde lecionava, Quiroga se entregou voluntariamente. Seus corpos  foram encontrados perto de outros três, do lado de fora do Cemitério Metropolitano. O local é hoje um espaço de memória e tornou-se monumento nacional.

Outro envolvido foi condenado a cinco anos e um dia por encobrir o crime. O Estado do Chile deverá pagar uma indenização de 1,370 bilhão de pesos (aproximadamente US$ 2,1 milhões) a familiares das vítimas. Jornais lembram que o ex-militar Pedro Pablo Barrientos, acusado de torturar e atirar no músico, vive desde 1989 nos Estados Unidos, e há uma campanha por sua extradição.

“Em Víctor não se pode separar o homem do artista. Ambos estão indissoluvelmente unidos, como dois rios que se nutrem e se reinventam de maneira contínua”, diz texto na página da Fundação Víctor Jara, criada há 25 anos e presidida por Joan, viúva do cantor, pesquisador, diretor de teatro e professor, militante comunista e ativo defensor do projeto do presidente socialista Salvador Allende, que se suicidou no dia do golpe.

“Sou um homem simples, de origem camponesa. Tive a sorte e o privilégio de realizar estudos universitários, de ser um diretor teatral. Por esta razão é que me sinto muito mais comprometido com o povo. Quero que meu canto faça vibrar a essa gente modesta, porque a eles está dirigida a mensagem de minhas canções”, afirma o artista, no mesmo texto, que aponta ainda a “grande influência” de Violeta Parra na obra de Víctor Jara. “Ambos compartilhavam as mesmas ideias sobre o papel que deveria ter o folclore na criação artística.” Violeta sugeriu que ele e Ángel, seu filho, tocassem juntos. O projeto não se concretizou, mas os dois se tornaram amigos.

Encontrado na rua, o corpo de Jara foi enterrado em uma cerimônia clandestina em Santiago. Apenas em 2009, seus restos mortais foram exumados, com a perícia constando o brutal assassinato do artista, que só então pôde ter um funeral público e ser homenageado.

A ex-presidenta chilena Michelle Bachelet comentou a notícia em rede social. “Com a condenação de 9 ex-militares responsáveis por seu assassinato há quase 45 anos, Víctor Jara canta com mais força do que nunca e o Chile faz justiça com sua história. Apenas por meio da verdade, da justiça e da reparação se constrói a unidade que os chilenos/as tanto desejamos.”

Com 342 páginas, a sentença de Vázquez começa com os nomes dos acusados: tenente-coronel Hugo Hernán Sánchez Marmonti, 91 anos; tenente Edwin Armando Roger Dimter Bianchi, 68 anos; coronel Nelson Edgardo Haase Mazzei, que completará 72 anos nesta sexta (6); tenente-coronel Ernesto Luis Bethke Wulf, 72 anos; tenente-coronel Juan Renán Jara Quintana, 70 anos; brigadeiro Hernán Carlos Chacón Soto, 81 anos; coronel Patricio Manuel Vásquez Donoso, 72 anos; Raúl Aníbal Jofré González, 70 anos; e coronel Rolando Camilo Humberto Melo Silva, 78 anos.

 

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