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Cristina se despede: ‘Maior legado do kirchnerismo foi o empoderamento do povo’

'Vamos voltar, nós vamos voltar', cantavam multidão na Praça de Maio à presidente, que brincou com o fim de seu governo: 'À meia-noite viro abóbora'

Aline Gatto Boueri/Opera Mundi

Para simpatizantes reunidos na Praça de Maio, escutar a mandatária trazia sentimentos entre a emoção e a angústia

Opera Mundi – A mobilização estava marcada para 18h na Praça de Maio, em frente à Casa Rosada. Ali, ontem (9), militantes e simpatizantes, famílias com bebês, jovens, idosos e crianças se aproximavam da sede do governo argentino onde, horas mais tarde, Cristina Fernández de Kirchner discursou como presidente pela última vez.

Em tom épico, enquanto a multidão entoava – como durante toda a tarde – “vamos voltar, nós vamos voltar”, a mandatária se despediu com um chamado: “Cada um de vocês tem um dirigente dentro de si. Quando vocês sentem que aqueles a quem confiaram seus votos os traíram, tomem suas bandeiras e saibam quem é o dirigente de seu destino e o construtor de sua vida. Porque foi esse meu maior legado ao povo argentino: o empoderamento popular, cidadão, das liberdades, dos direitos”.

Cristina, cujo mandato terminou – por decisão judicial – às 23:59h de ontem, fez piada com o inusitado fim de seu governo. “Não posso falar muito porque à meia-noite viro abóbora.” Cristina não participará da posse de Mauricio Macri hoje. O presidente eleito vai receber o bastão e a faixa das mãos de Federico Pinedo, seu aliado e presidente provisório do Senado, que ocupará a Casa Rosada durante as 12 horas que separam o fim do governo de Kirchner e a ascensão de Macri.

Cristina Kirchner alternou bom humor, como no momento em que trocou declarações de amor com seu neto, Néstor Ivan, e o tom provocador que lhe é característico, como quando afirmou que “se com tanto ataque contra nós fizemos tantas coisas pelos argentinos, quantas poderão fazer aqueles que têm tantos fatores a seu favor. Tenhamos muita fé e muita esperança”.

Com a presença do presidente boliviano, Evo Morales, Cristina inaugurou um busto de Néstor Kirchner, seu falecido marido e ex-presidente (2003-2007). Em seguida, subiu a um palco montado em frente à Casa Rosada, que ocupou por oito anos. Em seu discurso, destacou o ineditismo de um quarto governo constitucional consecutivo na história argentina e aproveitou o assunto da transmissão de poder para disparar contra vários de seus oponentes políticos ao mesmo tempo: o Grupo Clarín, alguns setores do Judiciário e o presidente eleito Mauricio Macri.

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Estudante Florencia Bueno e seu cartaz com os dizeres: ‘obrigada, morena’

“Presidente cautelar”

“Gostaria de poder entregar os atributos presidenciais diante da Assembleia Legislativa, órgão máximo popular e federal do nosso país. E a verdade é que eu vi muitas medidas cautelares: contra a Lei de Meios, contra decretos do Poder Executivo. Mas posso garantir que nunca nessa vida imaginei que fosse haver um presidente cautelar durante 12 horas no meu país”, disse Cristina.

Assim como falou a seus detratores, Cristina também nomeou seus principais interlocutores: seu aliados na política regional, como Hugo Chávez, Lula e o próprio Evo, e também os destinatários de políticas que ela destacou de seu governo. Durante os 40 minutos em que discursou, dirigiu-se aos jovens, aos aposentados, aos universitários, aos trabalhadores, às famílias beneficiárias da AUH (Concessão Universal por Filho), bem como aos organismos de direitos humanos.

“Podemos olhar nos olhos das mães e avós da Praça de Maio, dos filhos. Demos resposta à demanda histórica de memória, verdade e justiça”, afirmou.

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“Parrillas” levantavam fumaça e as pessoas dançavam, riam, choravam e cantavam

Emoção e angústia

Dança, choro, risos, bandeiras. “Parrillas” levantavam fumaça e as pessoas dançavam, riam, choravam e cantavam enquanto comiam “asado”. O que se viu na despedida da primeira mulher eleita presidente na Argentina foi uma típica festa peronista, popular, em que apareciam tanto bandeiras, quanto cartazes artesanais com mensagens de carinho para a mandatária.

Para simpatizantes reunidos na Praça de Maio, escutar a mandatária trazia sentimentos encontrados. Entre a emoção e a angústia “com o que Macri representa e que podemos advertir pelo gabinete que nomeou”, a estudante de comunicação social Florencia Bueno, de 28 anos, afirmou que o kirchnerismo “desnudou o papel dos meios de comunicação em operações políticas e nos ensinou a discernir entre o que é correto e o que é errado”.

Florencia, que carregava um cartaz onde dizia “obrigada, morena”, destaca o que Cristina diria horas mais tarde no momento de concluir seu discurso: que o “empoderamento do povo” é a grande herança do kirchnerismo.

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