Futebol

Prisões de dirigentes da Fifa e de Marin respeitam soberanias nacionais

Juristas são unânimes em dizer que os Estados Unidos estão rigorosamente de acordo com o direito internacional ao deter, na Suíça, na semana passada, cartolas envolvidos em escândalo de corrupção

Tomaz Silva/Agência Brasil

Ex-presidente da CBF e atual vice da entidade, ao lado do atual mandatário, Marco Polo Del Nero

São Paulo – As prisões do ex-presidente e atual vice da CBF, José Maria Marin, e outras autoridades do futebol mundial, em território suíço, em ação desencadeada por autoridades dos Estados Unidos no dia 27 de maio, nada têm a ver com afronta à soberania do Brasil, da Suíça ou de qualquer país, e estão de acordo com o Direito Internacional. A opinião é unânime entre especialistas ouvidos pela RBA.

“O argumento dos Estados Unidos para justificar a aplicação de sua legislação é que ocorreram os chamados ‘elementos de conexão’ (termo técnico utilizado para a situação) com o território americano, o que justificaria o exercício da jurisdição pelos Estados Unidos”, esclarece Paulo Borba Casella, titular da cadeira de Direito Internacional Público da Universidade de São Paulo. “A conexão seria o fato de dinheiro (oriundo de corrupção e atividades ilícitas) ter circulado por bancos americanos.”

Os advogados lembram que não há desrespeito a soberanias nacionais porque a ordem de prisão só tem efeito para países com quem os Estados Unidos têm acordo de extradição, caso da Suíça.

Também para o jurista Pedro Serrano, professor de mestrado e doutorado em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), os procedimentos conduzidos pelos norte-americanos são juridicamente cabíveis, de acordo com os “elementos de conexão”. “A legislação americana enquadra os crimes de fraude, corrupção ou uma série de condutas ilícitas, mesmo que praticadas fora de seu território, quando tenham usado o sistema bancário norte-americano.”

Serrano ressalta o fato de que a Suíça é soberana para decidir se acata ou não o pedido de extradição dos acusados para os Estados Unidos.

No caso do Brasil, como o país não extradita (cidadão) nacional, por determinação da Constituição de 1988, se Marin estivesse em seu território, não seria preso em consequência das investigações americanas. “Seria impossível acontecer de ele ser preso no Brasil. Ele poderia ser preso no Brasil só por crimes ocorridos aqui, por investigação brasileira”, resume o professor de Direito Internacional da Universidade Mackenzie, Clayton Vinicius Pegoraro.

Para ele, “à luz do Direito internacional, no caso de Marin aplica-se a questão dos ‘elementos de conexão’: o fato de haver possíveis movimentações ilegais e fraudes, movimentação de valores utilizando o sistema bancário americano e em solo americano; nesse caso, a lei dos Estados Unidos é extremamente forte e punitiva”, diz. “Não entendo que seja uma afronta à soberania do Brasil ou de quem quer que seja.”

Marin poderá se defender perante as autoridades americanas, inclusive quanto ao pedido de extradição que o governo dos Estados Unidos já formulou junto ao governo suíço.

Geopolítica

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, disse na semana passada que a ação desencadeada pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos “é mais uma tentativa por parte dos EUA de espalhar a sua jurisdição para outros Estados”. Mas, se questões geopolíticas estão ou não por trás da ação dos Estados Unidos contra a corrupção na Fifa e na CBF, e se interesses norte-americanos em esvaziar a Copa do Mundo da Rússia, em 2018, são ou não o motivo oculto que motiva as prisões, essas supostas intenções não descaracterizam a legitimidade jurídica da operação que colocou Marin e outros dirigentes na cadeia.

Segundo o líder russo, os norte-americanos têm a intenção de “evitar que o sr. Blatter seja reeleito como presidente, o que é uma grande violação dos princípios de operação das organizações internacionais”.

Seja como for, nesta terça-feira (2), o presidente da Fifa, eleito na sexta passada, renunciou ao cargo. Redes de TV dos Estados Unidos informaram que Blatter também estaria sendo investigado.

“A Rússia questionou a aplicação extraterritorial (na operação que prendeu os sete dirigentes, entre os quais Marin) dizendo que, de seu ponto de vista, foi um ato abusivo. Entende-se a posição da Rússia, porque a Copa de 2018, que será realizada lá, está colocada sob suspeita”, avalia Casella.

Ele lembra as especulações sobre o fato de os Estados Unidos, supostamente, terem ficado “incomodados” por terem sido excluídos da organização da Copa do Mundo de 2022 (que será no Catar), à qual eram fortes candidatos. Para quem segue essa análise, os EUA estariam retaliando ao deflagrar a ação na Suíça. Mas, em que pese eventuais interesses políticos, a ação americana na Suíça, do ponto de vista do Direito, é legítima e foi executada de maneira “muito inteligente”, reafirma o professor da USP.


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