Europa

Socialistas mantêm Paris, mas direita recupera várias cidades nas eleições municipais

A taxa de abstenção bateu mais uma vez todos os recordes, chegando a 36,45%, apesar dos apelos da esquerda pelo voto

IAN LANGSDON/EFE

Anne Hidalgo, eleita prefeita de Paris pelo Partido Socialista, celebra a vitória na capital francesa

Paris – Paris tem a primeira prefeita mulher de sua história, a socialista Anne Hidalgo, que ganhou com 54,5% dos votos e sucede seu colega de partido Bertrand Delanoë. Sua principal oponente, Nathalie Kosciusko-Morizet, da União por um Movimento Popular (UMP), obteve uma leve vantagem no primeiro turno, mas acabou ficando para trás. Apesar da conquista do Partido Socialista em Paris, a extrema direita foi a grande vitoriosa das eleições no país.

A disputa na capital francesa acontece por distritos e Hidalgo acabou conquistando os dois mais decisivos deles – selando sua vitória. A nova prefeita de Paris é conhecida por sua discrição e foi acusada pela oposição de “hibernar” durante a campanha e evitar debates. “Anne construiu tijolo por tijolo e um dia acordamos e já estava feito”, admitiu Marie-Pierre de La Gontrie, atual vice-presidente do conselho regional de Île-de-France, antiga rival que acabou apoiando a candidata.

Mas a vitória socialista em Paris não se reflete no restante da França. A esquerda foi considerada a grande perdedora das eleições, um golpe duro para o presidente François Hollande, que viu sua administração ser avaliada negativamente pela população. O ministro do Interior, Manuel Valls, anunciou que o partido perdeu o controle de 155 municípios de mais de nove mil habitantes, entre eles cerca de trinta cidades de médio porte. Toulouse foi a única grande cidade que trocou o PS pela UMP em uma disputa apertada, decidida por 2% dos votos.

Em Grenoble, o PS perdeu a prefeitura para o ecologista Eric Piolle. Esta foi a primeira vez que os verdes chegam ao poder em uma cidade de médio porte. Um dia antes da eleição, Piolle prestou queixa em uma delegacia por causa da agressão física que sofreu na rua enquanto andava de bicicleta, na sexta-feira. Já a extrema-direita, grande surpresa do primeiro turno, teve um desempenho menos impressionante neste domingo, mas ainda assim conquistou a prefeitura de uma dezena de municipalidades, entre elas Béziers e Fréjus. Por outro lado, perdeu cidades importantes, como Avignon e Perpignan, onde saiu na frente no primeiro turno. Nesta última, o PS preferiu se retirar da disputa, deixando o caminho livre para a UMP para não correr o risco de vitória da Frente Nacional.

Desilusão com a política

A taxa de abstenção bateu mais uma vez todos os recordes, chegando a 36,45%, apesar dos apelos da esquerda para a população sair de casa para votar. Na França o voto não é obrigatório e a baixa participação no pleito foi interpretada pelo governo como uma avaliação negativa dos rumos da política atual. Valls afirmou durante discurso que entende a rejeição do povo e que “a mensagem é clara e deve ser amplamente entendida”. Eduardo Cypel, deputado e porta-voz do PS, disse em entrevista a Opera Mundi que o desempenho de seu partido é resultado de “ uma raiva eleitoral que se produz no voto”, mas também garante que “o recado foi recebido”.

Na esfera do país, a direita tradicional conquistou um total de 45,9% dos votos, enquanto a esquerda ficou com 40,6% e a extrema-direita com 6,6%. Nas cidades com mais de dez mil habitantes, os partidos de esquerda comandam 349 prefeituras, contra 572 para a esquerda e 11 para a direita radical. Nas últimas eleições municipais, em 2008, as prefeituras socialistas eram maioria e nenhuma estava nas mãos da extrema-direita.

Entretanto, especialistas alertam que o avanço da Frente Nacional, maior representante deste eixo conservador radical, não deve ser visto com uma ameaça iminente. “Não é a primeira vez que a FN conquista algumas cidades. Mas depois eles acabaram perdendo tudo por causa da administração”, afirmou Béatrice Giblin, professora universitária e fundadora do Institut Français de Géopolitique.

Giblin faz referência a cidades como Toulon e Vitrolles, que caíram nas mãos do FN na década de 90, mas que em seguida preferiram outros partidos. “A democracia funciona assim. A direita foi a grande vencedora dessas eleições, mas não podemos dizer que ela vai ganhar tudo a partir de agora”, disse a professora, acrescentando que atualmente “a única coisa que conta é abaixar a taxa de desemprego, depois disso tudo ficariam menos dramático”

Remanejamento

Drama é o que não falta nesta segunda-feira pós eleição para Hollande. Opositores e até mesmo membros de seu partido já manifestaram o desejo de um um remanejamento no quadro administrativo, que deve ser decidido ainda no início desta semana pelo presidente. A saída do primeiro-ministro Jean-Marc Ayrault é uma possibilidade, mas o nome de um provável substituto ainda está sendo discutido.

Hidalgo disse em entrevista à TV francesa nesta manhã, que é favorável a uma modificação de seu partido: “Uma grande mudança de equipe, uma mudança de governo, se faz necessária. Os franceses esperam por isso”. Jean-François Copé, presidente da UMP, também afirmou que seria “impossível manter a mesma equipe governamental” depois do fracasso do partido do governo nas municipais. “Para mim, é o primeiro-ministro que deve ser trocado”, alfinetou.

Uma pesquisa do instituto Ipsos/Steria publicada nesta segunda-feira aponta que 86% dos franceses também são favoráveis ao remanejamento no governo, tanto pela substituição de alguns ministros, como a própria saída do primeiro-ministro.

A mesma pesquisa sondou também as intenções de voto para as eleições europeias daqui a alguns meses e constatou uma tendência ainda mais alarmante para o Partido Socialista. Cerca de 24% dos entrevistados afirmam que votariam UMP, 22% escolheriam a FN e apenas 19% deles votariam no PS. O partido ecológico ficaria com 10% dos votos. As eleições europeias acontecem dia 25 de maio.