Eleições

Apuração em Honduras não avança, mas candidato conservador já inicia transição

Oposição continua denunciando fraude, enquanto estudantes vão às ruas contra recusa da autoridade eleitoral em confirmar resultados. Novo presidente assume em janeiro

Gustavo Amador/EFE

Com 68% das urnas apuradas, Hernández continua com 34%, cinco pontos à frente de Xiomara

São Paulo – Uma sucessão de fatos sugere que a confusão eleitoral em Honduras ficará por isso mesmo. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se recusou a declarar um vencedor, mas afirmou que, com 67% das urnas apuradas, os resultados apresentam uma tendência irreversível. Como a situação beneficia seu candidato, o governo hondurenho se apressou a parabenizá-lo.

A Organização dos Estados Americanos (OEA) e a Missão de Observação Eleitoral da União Europeia endossam a confiabilidade dos números apresentados pela justiça até agora. Os meios de comunicação internacionais começam a retirar seus correspondentes do país e a imprensa hondurenha, que apoiou o golpe de Estado de 2009, já publica manchetes sobre o início da transição governamental.

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Ontem (26), o presidente da República, Porfírio Lobo, visitou o candidato que aparece em primeiro lugar na lenta apuração dos votos em curso no país, Juan Orlando Hernández, do Partido Nacional, para iniciar os diálogos que culminarão na transferência do poder em 27 de janeiro. “Vim felicitá-lo, colocar-me à disposição e expressar meu total respaldo à transição”, afirmou Lobo, de acordo com o diário argentino Página 12, depois de deixar a casa de Hernández, na capital Tegucigalpa.

O presidente e seu provável sucessor conversaram sobre a situação da segurança pública em Honduras, um dos maiores problemas do país e principal plataforma da campanha de Hernández. Abordaram ainda temas como investimentos estrangeiros e programas assistencialistas à população mais pobre. “Temos que colocar a transição em marcha o quanto antes”, festejou o possível futuro presidente. “Assim, cumpro com minha promessa de começar a trabalhar imediatamente, porque o país não pode esperar.”

A página do TSE hondurenho na internet informa que, até agora, 68,3% das urnas foram apuradas. Juan Hernández tem 34,13% dos votos. A segunda colocada, Xiomara Castro, do opositor Liberdade e Refundação (Libre), aparece com 28,89%. Num país onde 5 milhões de pessoas estão habilitadas a sufragar, a diferença entre Hernández e Xiomara é de apenas 114 mil votos. Por isso, a oposição reclama que o TSE termine de contar todos os votos. Caso contrário, seguirá sustentando as denúncias de fraude que começaram a ser veiculadas no mesmo domingo (24) das eleições.

Tanto Xiomara como Hernández se consideram vencedores. Porém, enquanto o candidato do Partido Nacional já cumpre agendas públicas como presidente eleito, a representante do Libre adotou perfil mais tímido. Não aparece em público desde segunda-feira (25). Pelo Twitter, ontem, afirmou que irá se pronunciar sobre o “resultado final das eleições” na sexta-feira (29). “Vamos defender a vontade popular expressada nas urnas.”

Derrubado pelo golpe de Estado de 2009, o ex-presidente Manuel Zelaya, líder do Libre e marido de Xiomara, prometera na segunda-feira mobilizar as bases do partido para defender nas ruas o triunfo eleitoral da candidata esquerdista. O Libre é apoiado por sindicatos e movimentos sociais. Também pelo Twitter, ontem, Zelaya afirmou que na sexta-feira 99% das urnas estarão na capital hondurenha – e que, por isso, ninguém deveria continuar “especulando” sobre os resultados. “Confirmaremos nossa vitória e, se for o contrário, também vamos reconhecer.”

No entanto, atendendo ao chamado do ex-presidente para defender a democracia nas ruas, estudantes da Universidade Nacional Autônoma de Honduras (Unah) tomaram algumas vias ao redor do campus, em Tegucigalpa, para protestar contra o que consideram “fraude” eleitoral. A polícia reprimiu os manifestantes com gases lacrimogêneos e pauladas. De acordo com o canal multiestatal Telesur, cinco pessoas acabaram presas. Eles exigem que os votos sejam recontados e auditados com transparência, para que se comprovem os resultados. De acordo com Zelaya, o TSE está “escondendo 19% das atas eleitorais” e que esse “ocultamento” alterará o verdadeiro cômputo dos votos.

Os Estados Unidos ainda não se pronunciaram oficialmente sobre o entrevero. Na segunda-feira, o Departamento de Estado limitou-se apenas a saudar os hondurenhos pela participação “pacífica” no pleito de domingo, e adiantou que acredita na “transparência” do processo. Washington apoiou o golpe de Estado contra Manuel Zelaya em 2009.

Ontem, o jornal mexicano La Jornada publicou editorial recordando que o presidente Porfírio Lobo comanda um regime “ilegítimo e antidemocrático”, nascido do golpe de Estado que “interrompeu a normalidade democrática em Honduras, expulsou do poder o então presidente constitucional e empreendeu uma repressão implacável contra as dissidências”.

O diário continua, lembrando que, “se a oligarquia hondurenha foi capaz de empreender uma quartelada para manter intactos seus privilégios e seu alinhamento incondicional com os Estados Unidos, não parece improvável que agora tenha optado pela fraude eleitoral como uma maneira de defender seus interesses e sua permanência no poder”.

O Brasil, que se colocou contra o golpe de 2009 e abrigou Zelaya por quatro meses em sua embaixada em Tegucigalpa, quando o ex-presidente sofria ameaças de prisão, ainda não se pronunciou oficialmente sobre o assunto.

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