Herança

Justiça dos EUA dá vitória a especuladores contra governo da Argentina

Decisão da Câmara de Apelações de Nova York, que ainda depende de ratificação pela Suprema Corte, pode colocar a perder esforço de renegociação de dívida feito por Néstor Kirchner

Peter Foley/EFE

Entre a bolsa de valores e a recuperação da Argentina, a Justiça dos EUA escolheu o lado do investidor

São Paulo – A Câmara de Apelações de Nova York ratificou ontem (23) sentença contra o governo da Argentina na ação movida pelos titulares de “fundos-abutre”. A decisão significa que os magistrados consideram que o país sul-americano deve US$ 1,3 bilhão a investidores que compraram títulos da dívida argentina entre a virada do século passado e o começo deste novo milênio.

A decisão, porém, ainda terá de ser ratificada pela Suprema Corte para que tenha validade. Como há um prazo de 90 dias para a apresentação dos recursos, e a fila de votações na última instância é grande, imagina-se que o governo de Cristina Fernández de Kirchner tenha ao menos até o próximo ano para encontrar soluções.

O problema central é que a confirmação da sentença levaria à desestruturação de toda a negociação empreendida por Néstor Kirchner entre 2003 e 2005, especialmente, quando assumiu um país em crise. A política de privatizações da década de 1990, comandada por Carlos Menem, havia levado o país à quebra, e em 2001 o presidente Adolfo Rodríguez Saá decretou o default de uma dívida de US$ 81,2 bilhões, operação chamada pela mídia tradicional de “calote”.

Quando assumiu o governo, Kirchner deu início a uma negociação cuja primeira fase foi encerrada em 2005, quando 65,6% dos donos dos títulos vinculados aos fundos-abutre aceitaram uma renegociação que incluía a troca por títulos de mesmo valor, extensão dos prazos de pagamento e redução da taxa de juros. Adiante, em 2010, o governo abriu novo período de negociação, e conseguiu chegar a uma adesão total de 93%.

Os que movem a ação vitoriosa na Justiça dos Estados Unidos são, portanto, 7%, mas o temor do governo da Argentina é de que um triunfo leve a que aqueles que aceitaram os termos apresentados nos períodos de negociação queiram receber nos mesmos moldes dos titulares de fundos-abutre, o que levaria a uma nova quebra do país.

O governo de Cristina ainda não se pronunciou sobre a nova sentença. Via de regra, a linha de argumentação tem se baseado na visão de que se trata de uma violação da soberania argentina, e que as sentenças de primeira e segunda instância desconhecem o contexto em que foi feita a renegociação, com uma nação em crise e com graves problemas sociais.