Presidente de Israel: não há outra opção além da paz e da criação de um Estado palestino

Oriente Médio

STEFAN ZAKLIN/EFE

Peres mostrou-se convencido de que ainda poderá ver um Estado israelense e um palestino convivendo em paz

Jerusalém – O presidente de Israel, Shimon Peres, disse hoje (18) que “não há nenhum tipo de alternativa” para israelenses e palestinos que não seja alcançar a paz com base na solução de dois Estados, um acordo que não se pode evitar e para o qual é preciso “mudar o estado de ânimo” de ambas as partes.

Em entrevista concedida à Agência Efe em um “momento crucial” para o processo negociador (nas palavras do secretário de Estado americano, John Kerry), o presidente israelense, prestes a completar 90 anos, mostrou-se convencido de que ainda poderá ver um Estado israelense e um palestino convivendo em paz como vizinhos.

Peres, que conhece como poucos os segredos do conflito e da complicada história do Estado Israel desde sua fundação, há 65 anos, quando o atual presidente começava a ocupar postos de relevância, acredita que a realidade impõe a paz como única opção e que essa tendência “cresceu” também no mundo árabe.

Conforme vai respondendo às perguntas, o veterano dirigente faz com que se esqueça que ele se trata do chefe de Estado mais velho do mundo ao mostrar a lucidez do político que manejou durante décadas boa parte das peças do quebra-cabeças do Oriente Médio.

Segundo sua opinião, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, quer realmente alcançar a paz com os palestinos com base na solução de dois Estados?

Temos que julgar uma pessoa pelo que diz e o que faz. Ele declarou sua posição claramente e agora acho que deve traduzi-la em ações.

Mas considera possível conseguir a paz com o atual governo de coalizão israelense, no qual convivem partidos com notáveis diferenças em relação à maneira de abordar o processo?

Acho que sim, mas o problema é como traduzir isso em uma solução acordada, em um caminho acordado para fazer a paz. E essa é a missão agora do secretário Kerry. Temos que apoiar sua missão. E acho que não há nenhum tipo de alternativa à solução de dois Estados, nem para os palestinos nem para nós. É a única alternativa real existente para as duas partes para se viver em paz e poder avançar no futuro.

As diferenças em todas as partes são mais psicológicas que reais. O que temos que fazer, embora pareça estranho, é mudar o estado de ânimo para que possamos ser capazes de mudar o mapa.

O ceticismo está ganhando agora a partida, mas o ceticismo não é uma política. A meu ver é algo preguiçoso. As pessoas preguiçosas podem ser céticas, mas é um erro. Qualquer outra coisa exige ações, decisões, mas as pessoas se cansam, dizem que não sabem e isso é um erro.

O senhor está disposto a debater com os palestinos uma das questões mais espinhosas: o status de Jerusalém?

Será discutido em qualquer caso nas negociações. O problema é se temos que discutir antes das negociações, ao longo delas ou no final. Acho que ambas as partes, incluindo a parte árabe, com a qual estou falando com seus líderes com boas relações, estão de acordo em adiar o tema de Jerusalém, que é um tema muito sensível e muito conturbado, para o final das negociações, para evitar queimá-las em seu início.

É um tema extremamente delicado e complicado. É possível resolver, mas necessitamos um ambiente diferente para isso. E acho que ao final das negociações o ambiente será diferente, mais razoável e isto fará com que sejamos capazes de lidar com as questões difíceis.

Deve-se interromper a construção de assentamentos judaicos em Jerusalém Oriental e Cisjordânia, como pedem os palestinos, para dar uma oportunidade ao reinício das negociações?

Acho que já não é o que costumava ser, não quero falar em nome do governo, mas Netanyahu disse: “precisa ser sábio, não só estar certo”, portanto tome isso como uma linha política.

Prestes a completar 90 anos e após mais de 60 na política israelense, como o senhor gostaria de ser recordado?

Não estou preocupado com a pergunta de como deveria ser recordado, mas pela de como devo lembrar. O que significa que para mim a questão é o futuro, não o passado. O que passou, passou, pode-se lembrar se desejar, pode-se esquecer. O passado não se pode modificar, o que podemos realmente mudar é o futuro. Portanto para mim a questão é sempre lembrar o amanhã e ver o que se pode fazer no futuro.

E como vê esse futuro? Estará em perigo a existência do Estado de Israel se não se chegar a um acordo com os palestinos?

Todo país pode realmente decidir sua política, mas todo país tem suas limitações e todo governo tem um parceiro silencioso que se chama realidade.

Pela minha experiência, sei que os líderes, mais que influenciarem a realidade, são influenciados por ela. E não há nenhuma alternativa mais real do que fazer a paz. Pode-se adiá-la, esperar um pouco, mas não se pode escapar dela. O povo não quer viver no perigo e no desespero. E acho que finalmente, a realidade, como uma visão, será a vencedora.

Acredita que o senhor poderá ver ainda um Estado israelense e um palestino convivendo em paz um ao lado do outro?

Sim, acredito. E acredito pois julgo a história não por seus eventos mas por sua evolução, e o mundo árabe não é só rico em eventos trágicos e dramáticos mas também está começando a se movimentar para uma nova era. Existem 350 milhões de árabes, dos quais 99 milhões estão com seus computadores na internet. Este é um movimento mais importante, na minha opinião, do que um choque de soldados.

Eu nunca deixei de ser otimista, não entendo por que as pessoas escolhem ser pessimistas. Os otimistas e os pessimistas morrem da mesma maneira, mas vivem diferente.

Como são as relações atuais entre Israel e América Latina? Se sentiu decepcionado porque todos os países do continente, salvo Colômbia e Panamá, votaram a favor do reconhecimento da Palestina como Estado na ONU?

A América Latina está atravessando uma grande mudança, como o resto do mundo. Estamos diante de uma nova era e existe uma nova América Do sul. Ir ao ontem, à história, talvez seja importante, mas o que será decisivo realmente é o futuro. E na América do Sul, além de um despertar democrático político há também um despertar democrático econômico que está chegando, junto à ciência, e que está mudando todo o continente.

Portanto para mim os votos de ontem não são uma indicação das posições do amanhã. Eu não julgo as situações só pelos votos. Trato de entender os eventos e vejo a América Latina se fazendo moderna, movimentando-se para frente.

Como opina sobre as transformações provocadas pela chamada primavera árabe?

Hoje é muito difícil ver onde existe um país árabe coeso. Todos os países árabes e o mundo árabe estão atravessando tremendas mudanças.

Uma deles para melhor: acho que a tendência para a paz cresceu e a paciência com o extremismo está diminuindo. O terrorismo, que é uma ameaça para Israel, se transformou em um problema para os países que têm terroristas em seu interior.

Os terroristas estão partindo o território de seus países em pedaços. As guerras civis em muitos países se devem a existirem tantas organizações terroristas, sem um denominador comum, sem uma política clara.

Tomemos o exemplo de Gaza. Além do Hamas há outras três ou quatro organizações terroristas e ninguém pode controlar isso, nem sequer o Hamas. Olhe Líbano, com o Hezbollah. Para onde estão indo?

Penso que finalmente o mundo árabe também tomará uma posição contra o terrorismo, porque é seu inimigo e não uma ameaça ao que eles acham que é seu inimigo. E acho que o verdadeiro problema no Oriente Médio hoje é existencial, mais que político. Portanto, em um momento de mudança, temos que mudar as perguntas pois as respostas são diferentes.

Israel atacará as instalações nucleares iranianas este ano caso não tenham êxito as sanções econômicas e a pressão diplomática?

O Irã é um problema para o resto do mundo e Israel não deve monopolizá-lo. E há uma clara política dos Estados Unidos, liderada pelo presidente Obama, que diz que não devemos permitir ao Irã obter armas nucleares. Devemos tentar evitar isso através de vários meios: sanções econômicas, pressões políticas, mas não excluímos nenhuma outra opção.

Eu não acho que Israel deva ter um plano separado, somos parte do mundo e fomos ameaçados pelo Irã, apesar de ninguém ameaçar os iranianos, não sei por que eles fazem isso. O mundo não pode ficar louco e permitir que gente fanática tenha armas de destruição em massa.

Em relação à Síria, Israel tem alguma intenção de se envolver no conflito nesse país?

Israel não quer se envolver no conflito sírio. Qualquer intervenção de nossa parte pioraria a situação e não estamos interessados em aumentar o perigo e as mortes.

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