Eleições na Venezuela revelam amadurecimento das forças políticas

Em pleito mais disputado do período Chávez, candidatos deixaram de lado a guerra ideológica e focaram mais em projetos de governo, diz especialista

Venezuelanos comemoram vitória de Chávez, em eleição que teve novo discurso adotado pela oposição (Telam/ABr)

São Paulo – Os resultados das eleições presidenciais da Venezuela, que deram vitória a Hugo Chávez, candidato pelo Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), revelam um amadurecimento das forças políticas do país. É essa opinião do professor de relações Internacionais e Geopolítica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Leonardo Valente. 

Chávez, com 54,4% dos votos, caminha para o quarto mandato, com o qual cumprirá mais de 20 anos no poder. Henrique Capriles Radonski, candidato opositor pela Mesa de Unidade Democrática (MUD), conquistou 44,97%. Segundo Valente, a eleição mais disputada desde que Chávez chegou ao poder em 1999 é resultado de uma oposição unida. Chávez chegou a prometer que será um “presidente melhor”.

A diferença foi de cerca de dez pontos percentuais. Em 2006, quando Chávez enfrentou o opositor Manuel Rosales, a diferença foi de 25 pontos. Para Valente, a diminuição dessa margem representa uma mudança na configuração política da Venezuela. 

“É natural que governos com períodos muito prolongados de atuação sofram um desgaste eleitoral. Essa diminuição do percentual em parte se deve a isso, não depende somente da performance do governo em relação à a vida da população cotidiana. A outra parte é que a oposição venezuelana mudou nos últimos anos. Ela era fragmentada e, durante muitos anos, se recusou a participar do processo eleitoral das eleições majoritárias. A oposição se uniu, conseguindo mais recursos e uma campanha mais estruturada”, comentou ele. Capriles obteve o apoio de 14 partidos políticos nessas eleições.

Para conquistar mais popularidade, a oposição também mudou seu discurso, de acordo com Valente. Nas outras eleições, os adversário de Chávez criticam sua chamada “Revolução Bolivariana”, que consiste em políticas econômicas e sociais que procuram diminuir a desigualdade e oferecer mais serviços públicos à população menos favorecida. 

Nestas eleições, contudo, Capriles concentrou-se nos projetos do governo. “Houve uma predisposição ao diálogo, uma iniciativa de se evitar uma polarização excessiva, que era marca do embate político da Venezuela durante quase todo o período Chávez. A oposição começou a perceber que essa polarização acirrada não é a melhor receita. A receita é o diálogo, não é criticar o presidente em todos os elementos do seu governo. E isso tem dando certo”, disse Valente.

A reação do governo às críticas da oposição também mudou. Ontem, do palácio presidencial de Miraflores, em Caracas, capital da Venezuela, Chávez demostrou respeitar Capriles. “Minha palavra de reconhecimento a todos que votaram contra nós, por seu critério democrático, pela demonstração cívica que nos deram”, declarou o presidente. Ele disse que o fato da oposição reconhecer os resultados “é um passo importante para a paz e para a convivência na Venezuela” e afirmou que, para ter um país melhor, é preciso “trabalhar em conjunto”. 

“O próprio Chávez, ontem, antes dos resultados, fez questão de frisar que o resultado deveria ser respeitado, seja ele qual fosse”, disse Valente. Ele apontou que ambos os lados estão mais dispostos em fazer o processo democrático na Venezuela mais tranquilo.

“A democracia venezuelana, do ponto de vista estrutural e eleitoral, está bem configurada há muitos anos, mas, de fato, houve um amadurecimento do comportamento das forças políticas, tanto da oposição, como do governo. Esse amadurecimento é muito importante, porque vai dar uma sensação de tranquilidade ao país”, afirmou Valente.

Ele destacou que a vitória de Chávez indica que a população menos favorecida economicamente ainda o apoia. “As classes mais pobres ainda veem o presidente com uma perspectiva de melhoria de vida e de inclusão social. Ele ainda significa oportunidade pra essas populações”.

Na avaliação de Valente, o presidente tem agora dois desafios. “O primeiro é manter o indicadores socioeconômicos da Venezuela, a distribuição de renda que ele fez nos últimos 10 anos, e o aumento da qualidade de vida das classes mais baixas, algo difícil diante da crise econômica mundial. O outro grande desafio é também governar pras classes médias. E para isso, precisa dinamizar a economia venezuelana. O país, há muitos anos, depende exclusivamente do petróleo, e Chávez não conseguiu diversificar seu parque industrial”, comentou.

Política externa

A política externa da Venezuela dependerá mais dos resultados das eleições nos Estados Unidos do que propriamente de Chávez, segundo Valente. 

“A antiga retórica de confrontação, que existia em relação aos EUA, aquela velha política que é a mais conhecida de Chávez, mais opositora, vem se enfraquecendo desde 2009, quando Barack Obama chegou ao poder. Nos últimos dois anos, Chávez passou a ter uma política mais moderada, mais cautelosa. A tendência é que ele se mantenha ainda discreto, mas se houver uma intensificação de políticas conservadoras nos EUA, se os republicanos chegarem ao poder e implementarem uma política parecida com a de George W. Bush, é possível que a gente veja uma Venezuela mais opositora no cenário internacional”.

Com informações de El Nacional.

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