Decisão paraguaia de não vender energia é positiva, diz Marco Aurélio Garcia

Para assessor da Presidência, medida contribuiria para o desenvolvimento energético do país, hoje deficiente

São Paulo – O assessor especial da Presidência da República para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, afirmou ontem (10) que apoia a decisão do Paraguai de não vender mais sua energia excedente ao Brasil. Para ele, o tom incisivo do atual presidente Frederico Franco quando afirmou há dois dias que não iria mais “ceder” energia para o Brasil, no caso da hidrelétrica de Itaipu, e para a Argentina, no caso de Yaciretá, “foi para consumo interno”.

“As autoridades paraguaias andaram dizendo que não vão mais precisar vender a energia para nós, que irão consumir tudo. Estamos felizes com isso, sempre defendemos que fosse feito, tomando iniciativas concretas. Com recursos nossos e do Mercosul, o Paraguai está construindo uma linha de transmissão de Itaipu até Assunção, para transformar a capital paraguaia em um grande  centro industrial”, afirmou o assessor, durante palestra na Faculdade Getúlio Vargas, em São Paulo. O Paraguai ainda não tem capacidade para utilizar todo o potencial energético a que tem direito na hidrelétrica binacional e, por contrato, vende o excedente para o Brasil.  

“Passamos todo o tempo, desde o governo Lula, estimulando investimentos industriais no Paraguai, que por si só já consumirão muita energia. Só podemos estar saudando qualquer iniciativa de industrialização do Paraguai. Acho que há muito jogo de cena e desinformação nessa história, não tem nenhum problema”, esclareceu o político.

Garcia também falou que, após a próxima eleição presidencial paraguaia, marcada para o próximo ano, o país vizinho poderá ser naturalmente reintegrado ao bloco. O assessor foi acusado pela imprensa paraguaia de impor novas condições ao Paraguai para que este fosse reabilitado ao Mercosul.

No entanto, o país terá de aceitar a inclusão da Venezuela como novo membro pleno. “A oposição ao ingresso da Venezuela é inacreditável. Se fossemos seguir o que os paraguaios pedem à risca, não poderíamos tomar nenhuma decisão até a volta deles. E se, nesse período, o acordo com a União Europeia finalmente progredir? E se a China propuser um acordo comercial com o bloco, não iremos aceitar?”, perguntou.

Garcia lembrou que o Brasil fez um acordo em 2009 (aprovado em 2011) em que o país triplicou o valor pago pela energia elétrica ao Paraguai, dizendo que essa decisão teve alto custo político ao governo na época. “O que mais eles querem?”, desabafou.

No entanto, ao ser lembrado que o chanceler paraguaio José Félix Estigarribia falou nesta sexta-feira que este valor seria insuficiente e precisaria ser renegociado, Garcia excluiu qualquer possibilidade de se sentar à mesa novamente com os paraguaios. “Isso não estará em consideração. Fizemos uma negociação muito importante que sofreu restrições no Brasil. A triplicação do recurso está em vigor há poucos meses”, contou.

Saída do Mercosul

Garcia também afirmou não acreditar na saída do Paraguai do bloco, que tem sido apoiada por parte do Congresso paraguaio, nem de no futuro assinar um TLC (tratado de livre comércio) com outro país fora do Mercosul, o que inviabilizaria seu retorno. “Seria contrário aos interesses dos paraguaios. As pessoas não podem cair nessa miragem que os TLCs vão resolver os problemas que o Mercosul resolve pra eles hoje. Mas é um pais soberano que pode tomar essa decisão. É  um problema deles e o próprio chanceler não compartilha desse ponto de vista”, disse o assessor.

Fernando Lugo

Garcia também deu sua versão sobre as razões que provocaram o impeachment do ex-presidente Fernando Lugo em junho, e que causou toda a crise diplomática do Paraguai em relação aos seus vizinhos. Além de criticar o processo que resultou na queda de Lugo, o qual classificou como uma “ruptura democrática”, ele também culpou a falta de apoio político e popular do ex-presidente com fatores significativos.

“Tivemos um outsider [Lugo] que ganhou a eleição presidencial fora do esquema tradicional, em um sistema ainda muito marcado pela ditadura de Alfredo Stroessner (1954-1989). Esse outsider não fez nenhuma negociação política no estilo Brasil, Argentina, Uruguai e Chile, e nem fez tampouco um movimento da sociedade como uma espécie de refundação institucional. E se enfraqueceu”, explicou.