G-20 não deve encontrar solução para questão cambial

Analistas e governos entendem que boa vontade de Estados Unidos e China é fundamental, mas pouco provável

Brasil deve se colocar contra a atual posição de EUA e China sobre a questão cambial (Foto: David Siqueira/Sxc.hu)

São Paulo – Um dos principais temas da reunião dos líderes do G-20, o grupo dos países mais industrializados do mundo inclusive emergentes, é o que economistas vêm tratando como guerra cambial. Em Seul, na Coreia do Sul, a partir desta quinta-feira (11), a expectativa de que os chefes de Estado das principais economias mundiais encontrem uma solução é pequena, dizem economistas.

Na avaliação de Ricardo Carneiro, diretor do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica da Unicamp, o problema deve se agravar mais antes de ser resolvido. Para ele, como China e Estados Unidos mantêm suas moedas desvalorizadas, aos demais países, irrelevantes no processo, cabe apenas se defender.

Durante o encontro do G-20, caberá ao Brasil o esforço de se colocar contra a atual postura de Estados Unidos e China, que prejudica bastante a política industrial dos emergentes. “A desvalorização da moeda chinesa e da moeda americana diante das outras moedas está causando um desequilíbrio no comércio mundial, e nós precisamos voltar a ter um equilíbrio”, indicou na segunda-feira (8) o presidente Lula.

A questão é que Estados Unidos e China, tidos como os principais responsáveis pela crise, andam em caminhos opostos. Como são países de imensa força econômica e não parecem dispostos a ceder, não há muito o que os outros possam fazer a não ser pressionar. Rogério de Souza, economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), entende que é difícil imaginar que a reunião do G-20 termine com uma solução. “É um fórum importante para que as questões sejam colocadas, e neste sentido o governo brasileiro está fazendo o papel correto de ir e chamar atenção.”

O Federal Reserve, banco central do país do Norte, anunciou na última semana uma injeção de US$ 600 bilhões na economia, o que foi imediatamente criticado pela União Europeia e pelo Brasil, entre outros. Trata-se de mais uma tentativa de fazer o país voltar a crescer, mas a avaliação mundial é de que a medida é incorreta, porque já há crédito farto no mercado dos Estados Unidos e, como a economia local não se recupera, esse dinheiro vai viajar pelo mundo, forçando a valorização de outras moedas.

O Brasil, pelos juros altos, é um dos alvos prediletos dos capitais especulativos, o que deve aumentar ainda mais a sobrevalorização do real. “Todo mundo quer que a economia americana se recupere, mas não adianta ficar jogando dólar de helicóptero na economia, porque isso não fará brotar o crescimento”, acusou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que entende que a Casa Branca deve se preocupar em buscar outras medidas para estimular a retomada do mercado interno.

As cartas na manga ainda disponíveis são um problema. No ápice da crise internacional, os Estados Unidos optaram por pouca regulação, deixando ao mercado a saída da recessão e da falta de crédito. O governo de Barack Obama tentou um pacote fiscal que, no entanto, não parece ter surtido efeito. A saída mais convencional a esta altura seria baixar os juros, medida comum na tentativa de estimular crescimento econômico. Porém, como a taxa básica da economia dos Estados Unidos já é de 0% a 0,25%, menor do que a inflação (negativa em termos reais), não há espaço para mais cortes.

Por isso, a opção por injetar dinheiro foi buscada para tentar acelerar a economia. A medida, anunciada no último dia 3, tem efeitos colaterais para os países que se veem “inundados” por dólares, prejudicando ainda mais as moedas locais e, por consequência, a balança comercial. “A economia dos Estados Unidos está no chão, muito desestimulada. Eles decidiram não seguir na questão do gasto público e só têm esse caminho, que é de tentar ampliar a liquidez com a emissão de moeda”, avalia Ricardo Carneiro.

Com dinheiro sobrando no mercado financeiro, os investidores levam recursos a outras partes do mundo e “desbalanceiam todas as taxas de câmbio”. “A questão cambial é uma espécie de subproduto do que os Estados Unidos estão fazendo. Como os outros países não são agentes relevantes nessa disputa, vão ter de fazer o melhor possível para se defender”, explica Carneiro.

País asiático

O outro agente de peso nessa questão é a China. O país asiático tem enormes reservas cotadas em dólar, as maiores do mundo, e mantém há anos uma desvalorização proposital de sua moeda. A conta é simples: com sua moeda mais baixa, a China breca importações e facilita suas exportações, mantendo seu acelerado ritmo de crescimento econômico graças a um generoso incentivo à indústria local. “Os Estados Unidos têm déficit muito grande com a China e uma medida como a valorização de sua moeda poderia reverter a favor da economia americana, o que é bom para o mundo todo”, acrescenta Souza, do Iedi.

O governo de Hu Jintao já descartou adotar qualquer meta para a limitação dos desequilíbrios mundiais mesmo durante a reunião do G-20. A pressão internacional era para que os chineses aceitassem valorizar o yuan, moderando exportações e acelerando o consumo interno. Após a negativa chinesa, os Estados Unidos também desacreditaram adotar qualquer meta.

Leia também

Últimas notícias