Chile: popularidade de Bachelet não traz votos a governista

Aprovação recorde da presidente não é suficiente para garantir vida tranquila ao candidato da Concertação, que entra desacreditado na reta final de campanha

O candidato à presidência do Chile, Eduardo Frei, durante visita a Brasília este ano (Foto: Antônio Cruz. Agência Brasil)

Neste momento, os líderes da principal coalizão partidária chilena estão em escritórios de Santiago arrancando todos os fios de cabelo em busca de uma saída. Depois de 20 anos no poder, a Concertação entra na reta final de campanha sem encontrar o caminho para manter-se no Palácio de la Moneda.

Guardadas as proporções, o caso chileno pode servir de objeto de estudo a analistas do Palácio do Planalto, em Brasília (DF), depois de 11 de dezembro. A coalizão governista chilena formada por PS, PDC, PPD e PRSD tenta transferir a popularidade da presidente Michele Bachelet para o candidato governista. Atualmente a socialista possui 72% de aprovação em pesquisa do Centro de Estudos Políticos, o mais alto das últimas duas décadas.

A pesquisa mostra que Bachelet saiu da crise sem arranhões e, mais que isso, ganhou novas cores. A gestão econômica do governo é aprovada por 64% e a presidente cresceu como nunca nos quesitos confiança, habilidade e firmeza.

Leia também:

>> Revista do Brasil: A última ceia – Indústria do pescado no Chile mostra que ausência de sustentabilidade pode deteriorar condições de trabalho e de saúde

>> Exclusivo: candidato à presidência da Colômbia promete vencer com ou sem Uribe

Por outro lado, Eduardo Frei, ex-presidente de 1994 a 2000 e atual candidato, está estacionado entre 25% e 30% das intenções de voto, contra 37% do conservador Sebastián Piñera. Para piorar, o independente Marco Enríquez-Ominami, que saiu literalmente do zero nas pesquisas de intenção de voto, cresce cada vez mais e atinge 18%.

A ascensão do candidato mais à esquerda entre os favoritos é exatamente um dos pontos para explicar a freada de Frei, aponta o cientista político Guillermo Holzmann, professor da Universidade do Chile. Nas palavras dele, Ominami é um fenômeno que mira as eleições de 2014. “Ele representa uma candidatura socialista, mas com uma série de medidas liberais, por exemplo, na economia”, explica.

Ominami_ChileMarco Enríquez-Ominami tem a seu favor, além de uma equipe hábil no uso da internet e da associação com os jovens, o histórico familiar de luta contra a ditadura (Foto: Divulgação)

Além disso, o político que rompeu com a Concertação atrai uma parcela de votos parecida com a que elegeu Barack Obama nos Estados Unidos: a juventude. Entre os principais nomes, o deputado de 36 anos, com histórico de pai morto pela ditadura de Augusto Pinochet e pai adotivo como senador, é o que tem menor taxa de rejeição, além de ser considerado o mais sincero e o mais simpático.

Do outro lado, Frei tem avaliação negativa de 31% da população. E está aí o ponto principal para que a aprovação de Bachelet não seja convertida em votos para a Concertação. “Mais que o passado, Frei representa um modelo de governo que a sociedade já não quer para o Chile”, afirma o professor Holzmann. Parte da população chilena tem dúvidas quanto ao lugar ideológico de Frei, que aparece como um candidato de centro quando se realiza uma média da opinião dos eleitores.

Quanto a seu governo, de 1994 a 2000, a recessão registrada em 1999 abalou fortemente a confiança da população no candidato, que deixou La Moneda em condição extremamente desfavorável.

Transferência de votos

O professor Guillermo Holzmann adverte que a democracia sul-americana é indubitavelmente mais forte hoje que há dez anos. Por isso, a transferência de votos não é automática. Sobre eventuais “aprendizados” para a campanha de Dilma Rousseff a respeito da situação chilena, o cientista político ressalta que transferir votos não é uma questão simples.

“Se o candidato não pode se sustentar sozinho, não tem propostas próprias, não é aceito junto à população, não adianta ter o apoio de um presidente popular”. Ele destaca que o caso argentino, em que Néstor Kirchner conseguiu imediatamente transferir sua popularidade de então para a senadora Cristina, sua esposa, é muito atípico nas condições atuais.

Pinera

Favorito na disputa, Piñera tem mais de 80% de aprovação entre os eleitores que se dizem de direita (Foto: Divulgação)

No Chile, pesa contra Frei a ruptura de setores diversos da Concertação. Para ser indicado candidato, ele venceu prévias do próprio partido, do Partido Radial Social Democrata, do Partido pela Democracia e, por fim, contou com a desistência do secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, que esperava lançar-se pelo Partido Socialista, o mesmo de Bachelet. A explicação, neste caso, é bastante simples: 20 anos de convivência, somados a prévias extensas, são suficientes para rachar de uma vez a coalizão governista.