'Memórias do chumbo'

Documentário mostra como futebol foi usado pela ditadura para propaganda política

Jornalistas contam que, historicamente, os grandes eventos esportivos sempre estiveram atrelados às estruturas de poder constituído, seja a Copa ou mesmo os Jogos Olímpicos

ACERVO/FOLHA DE S.PAULO

Em Brasília, Pelé levanta a taça da Copa de 1970 ao lado de Médici

São Paulo – O futebol e sua relação com as ditaduras na América do Sul foi tema de debate realizado no Rio de Janeiro, na última quarta-feira (4), com a exibição do documentário Memórias do chumbo – o futebol nos tempos do Condor, do jornalista Lúcio de Castro. O filme lançado em 2010 ganhou o prêmio Gabriel García Márquez de jornalismo e foi selecionado por festivais internacionais, trazendo imagens de Pelé e outros encantando o mundo com seu talento. No entanto, a atuação do escrete canarinho também serviu como cortina de fumaça para esconder os crimes de Estado cometidos à época.

A utilização do desempenho da seleção brasileira na Copa de 1970 como propaganda política, no período mais duro da ditadura, não foi uma estratégia exclusiva do Brasil e governos militares de outros países sul-americanos fizeram o mesmo com suas equipes na época, como a Argentina, Uruguai e Chile. 

“Andam dizendo por aí que o futebol e política não se misturam, mas a história mostra que não. Existe uma mistura até hoje. Os regimes democráticos também se valem muitas vezes do esporte, do futebol, para a propaganda, mas é claro que na ditadura isso se acentua profundamente”, afirma Lúcio de Castro, em entrevista à repórter Viviane Nascimento, da TVT.

Historicamente, os grandes eventos esportivos sempre estiveram atrelados às estruturas de poder constituído. “Para você ter uma ideia, o passeio da tocha olímpica, que mobilizou o Brasil, em 2015, foi criada pelos nazistas para Olimpíadas de 1936, em Berlim. Hitler não realizou os Jogos à revelia do Comitê Olímpico Internacional, eles fizeram juntos. A estrutura de poder do esporte naquele momento se aliou ao regime nazista da Alemanha para fazer o seu evento”, relata o jornalista Aydano André Motta.

Para o jornalista Agostinho Vieira, se o discurso de vitória e superação fosse transposto para o contexto político, seria possível ampliar a conscientização social e ainda ganhar a Copa do Mundo. 

“Acho que a gente tem que equilibrar as duas coisas. O futebol faz parte da vida do brasileiro e a gente não pode abrir mão disso, mas não se pode esquecer do resto. A gente tem que entender que é possível ter um país mais justo, menos desigual e, ao mesmo tempo, torcer pelo futebol. Essas coisas não são incompatíveis”, explica.

Lúcio lembra que torcer sem dor na consciência também é um direito do cidadão. “Os caras tiraram muita coisa da gente, não vão poder tirar meu prazer pelo futebol”, brinca.

Assista à reportagem do Seu Jornal, da TVT: