sem festa

SP: após um ano de torcida única, arquibancadas esfriam e ‘perdem a graça’

Corinthians e São Paulo se enfrentam neste domingo (23), mais uma vez, apenas com torcedores do clube mandante presentes. 'Derrota do futebol', avalia movimento Agir

FLICKR CC

Apesar da redução de brigas em dias de jogos, movimentos denunciam a criminalização da festa nas arquibancadas de São Paulo

São Paulo – No próximo domingo (23), Corinthians e São Paulo voltam a se enfrentar na semifinal do Campeonato Paulista. No jogo de ida, vitória do Alvinegro, mas outra derrota nas arquibancadas com apenas uma torcida presente. Há um ano homologada pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, a medida é criticada por diversas entidades ligadas ao futebol.

Apesar da redução de brigas em dias de jogos, a ação tem um balanço negativo dentro dos estádios, afirma o integrante do Movimento Arquibancada Ampla, Geral e Irrestrita (Agir) Caio Latufo. “Por outro lado, há uma criminalização das torcidas organizadas e da própria festa com a proibição de sinalizadores, bandeiras e instrumentos. Então, não é só a questão da torcida única, mas há a criminalização da festa em São Paulo e essa situação dificilmente vai alterar”, diz à RBA.

Com 38 anos de presença nas arquibancadas, André Azevedo, presidente da Associação Nacional de Torcidas Organizadas (Anatorg), diz que o radicalismo do Ministério Público de SP, que propôs a iniciativa, diminuiu a essência do futebol. “Depois de ter vivido o passado, acho que (o estádio) está sem graça. É óbvio que a violência diminuiu, mas não é certo ser tão radical sobre o assunto, porque mata um pouco a essência do futebol e a rivalidade entre os torcedores.”

Ao falar sobre o ambiente em volta dos 22 jogadores em campo, ambos afirmam que a medida esfria o clima nos clássicos, sem provocações e a disputa saudável entre as torcidas, por meio dos gritos. “É uma grande derrota do futebol. Uma das coisas mais legais que existe dentro do estádio são as torcidas se provocando ou uma gritar mais alto que a outra, e aí os torcedores aumentam o volume”, afirma Caio. “Quando você está no estádio e seu time faz um gol é bem melhor você brincar com o adversário. Os estádios, hoje, são grandes cemitérios”, acrescenta Azevedo.

O presidente da Anatorg também critica a “criminalização” das festas nos estádios. “Eles colocaram a torcida única e mesmo só com os torcedores do mesmo time, não permitem as bandeiras, o papel picado, nem nada.”

Segurança

A medida de torcida única em clássicos de São Paulo foi tomada em abril de 2016, quando José Sinval Batista foi vítima de bala perdida em São Miguel Paulista, zona leste da capital, após confronto entre as organizadas do Corinthians e Palmeiras. Ele não participava da briga.

No final de 2016, houve uma reunião entre representantes da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo, da Federação Paulista de Futebol, do Ministério Público, do Poder Judiciário com emissários dos quatro maiores clubes estaduais. Conforme declarou na ocasião a secretaria do governo paulista, a decisão de manter a torcida única nos clássicos foi unânime.

Ao Conjur, o sociológo Maurício Murad, diz que o banimento de torcidas visitantes não é o caminho correto. Escritor do livro A Violência do Futebol, ele explica que, de acordo com uma pesquisa de elaboração própria, cerca de 6% dos membros das torcidas organizadas cometem delitos, portanto “não seria justo punir a maioria por causa dos atos de uma minoria”. 

Um levantamento feito pelo jornalista Mauro Cezar Pereira mostra que, entre 2013 e 2016, 99,996% dos jogos do Campeonato Brasileiro são seguros. Ele aponta que entre a briga de torcedores do Vasco e Atlético Paranaense, em 2013, até o conflito entre organizadas de Palmeiras e Flamengo, em 2016, foram disputadas 820 partidas sem violência na arquibancada. Ao todo, foram 910 dias. 

André Azevedo lembra que ‘os responsáveis pelo futebol brasileiro’ gostam de usar a Inglaterra como exemplo esportivo, mas vão na contramão do país europeu. “Lá eles fazem mecanismos para que sempre tenha o visitante no estádio. Usamos como modelo de combate ao hooliganismo, que ainda continua existindo, mas eles nunca tiraram o visitante dos jogos.”

Além da segurança, razões lucrativas também influenciam na decisão de torcida única em São Paulo, afirma Caio. “Lógico que existem questões de violência no futebol, mas são casos bem destacados, bem coloridinhos pela mídia. A gente vê que há uma movimentação contrária à torcida divida nos estádios, até porque quando uma torcida inteira não for ao estádio ela estará na frente da televisão vendo o jogo.”

Mesmo acreditando ser difícil, o integrante da Agir diz torcer para que os dirigentes dos grandes clubes paulistas se unam para alterar a situação. “Já vimos no Rio de Janeiro uma preocupação dos clubes em não jogar clássico com torcida única e em São Paulo, há uma tendência contrária, infelizmente.”

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