Governo do Rio desiste de demolir museu, mas quer retirar Aldeia Maracanã

Sérgio Cabral e Eduardo Paes falam em tombamento e restauração, mas indígenas afirmam que não pretendem desocupar o local

José Guajajara, líder indígena da Aldeia Maracanã: “A aldeia é um patrimônio imaterial, e nisso não se mexe”. (Foto: Divulgação/Percurso da Cultura)

Rio de Janeiro – O governador Sérgio Cabral e o prefeito Eduardo Paes decidiram hoje (28) recuar da decisão de derrubar o antigo Museu do Índio, prevista pelo plano de reforma do estádio do Maracanã e seu entorno para a Copa do Mundo de 2014. Os governantes garantiram tombar e restaurar o prédio assim que for desocupado pelos cerca de 80 índios de diversas etnias que vivem ali, que compõem a chamada Aldeia Maracanã. 

O valor histórico do museu é o principal argumento usado pelos defensores da sua preservação. Em nota, o governo afirma que “o Estado ouviu as considerações da sociedade a respeito do prédio histórico, datado de 1862, analisou estudos de dispersão do estádio e concluiu que é possível manter o prédio no local”. Segundo o documento, “o governador e o prefeito vão agora tomar a iniciativa de fazer o tombamento do imóvel”.

Já a restauração do prédio do antigo Museu do Índio, segundo a nota divulgada pelo governo, ficará a cargo do concessionário vencedor da licitação do Complexo do Maracanã, “cujo edital sairá em fevereiro”. Além disso, diz o documento, “o destino do prédio, após o tombamento, será discutido conjuntamente entre o Governo do Estado e a Prefeitura do Rio de Janeiro”.

A nota, no entanto, deixa clara a intenção de preservar o prédio, mas retirar dali a Aldeia Maracanã: “O governo está tomando as devidas providências para que o local seja desocupado dos seus invasores. O Governo do Estado comprou o imóvel da Conab em 2012, composto por esse e outros prédios, pelo preço de R$ 60 milhões. O Ministério da Agricultura já está desocupando os demais prédios existentes no local, que serão demolidos para garantir o fluxo de pessoas no entorno do estádio”.

Patrimônio imaterial

Apesar de ter se esgotado hoje o prazo determinado pela Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro para a desocupação do local, os indígenas afirmaram que não pretendem sair. Os líderes da Aldeia Maracanã estiveram reunidos com representantes da Defensoria Pública Estadual durante toda a tarde de hoje. Logo após a reunião, indagado pela reportagem da Rede Brasil Atual sobre o recuo do governo em relação à demolição, José Guajajara, um dos líderes da ocupação ao lado do cacique Carlos Tukano e de Afonso Apurinã, deixou claro que os índios não pretendem deixar facilmente o local: “A aldeia é um patrimônio imaterial, e nisso não se mexe”, diz.

Guajajara diz que nenhuma autoridade do governo ou da prefeitura procurou os índios, e que estes somente souberam da nova posição de Paes e Cabral em relação à demolição após a divulgação da nota oficial: “Vamos nos reunir ainda hoje para conversar e decidir o que fazer. Mas, a tendência é mesmo pela permanência no terreno”, diz o indígena, acrescentando que não interessa aos habitantes da Aldeia Maracanã uma transferência para a Quinta da Boa Vista, como chegou a ser especulado pelo governo.

Nova liminar

Três dias depois de a ministra da Cultura, Marta Suplicy, ter manifestado seu apoio à preservação do prédio do Museu do Índio e recomendado seu tombamento ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), outra novidade tornou ainda mais difícil a posição de Paes e Cabral. Uma liminar concedida pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro em favor da Defensoria Pública Estadual e expedida anteontem (26) impede a demolição do prédio e estipula uma multa de R$ 60 milhões diários à prefeitura em caso de descumprimento da decisão.

O texto da liminar, assinada pelo juiz André Felipe Tredinnick, diz que o prédio do antigo Museu do Índio “tem valor não apenas por suas características arquitetônicas, mas também como espaço de preservação da memória e da identidade dos povos indígenas”. O juiz lembra também que a Fifa afirmou oficialmente jamais ter solicitado a remoção do museu, o que tornaria a demolição do prédio uma “ação injustificável” que provocaria um “dano irreparável” à memória indígena nacional.