Com bandeira olímpica, Rio corre contra o tempo e moradores protestam

Movimentos entregam a assessores do prefeito da capital fluminense dossiê mostrando as consequências da remoção forçada de moradores para abrir caminho para obras dos jogos de 2016

A chegada da Bandeira Olímpica faz o mundo voltar os olhos para o Brasil. Para o bem ou para o mal (Foto: Roberto Stuckert Filho. Presidência)

Rio de Janeiro – Uma comitiva composta pelos “irmãos medalha” Esquiva e Yamaguchi Falcão, boxeadores, e que incluiu ainda o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, o governador Sergio Cabral e o presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), Carlos Arthur Nuzman, entre outros, esteve hoje (14) no Palácio do Planalto para apresentar oficialmente à presidenta Dilma Rousseff a Bandeira Olímpica. O pavilhão oficial da Olimpíada permanecerá no Brasil pelos próximos quatro anos. 

Mais do que um símbolo, a presença da bandeira atrai para o Rio de Janeiro os olhos do mundo, chamando atenção para alguns problemas que já começam a ameaçar a agenda dos jogos de 2016, como a indefinição do orçamento olímpico e o impasse político que envolve remoções de população e outras ações necessárias à conclusão das obras previstas para o evento. A corrida, agora, é contra o tempo. 

Quando chegou ao aeroporto do Galeão ontem (13), trazendo de Londres a Bandeira Olímpica, Eduardo Paes, acompanhado por atletas e outras autoridades, foi recebido por uma manifestação de cerca de 50 moradores da Vila Autódromo, comunidade localizada na zona oeste da cidade e que deverá ser removida para a conclusão das obras viárias previstas no pacote olímpico. Os manifestantes tentaram, sem sucesso, entregar ao prefeito uma “medalha de ouro” na modalidade “ataque ao direito à moradia”. 

Também no aeroporto, integrantes do Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas entregaram o dossiê “Megaeventos e Violação dos Direitos Humanos” a assessores do prefeito: “As remoções no Rio de Janeiro representam um flagrante desrespeito à legislação brasileira e aos compromissos internacionais assumidos pelo país para a defesa dos direitos humanos, e não são casos isolados”, afirma Clara Silveira, do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM). Segundo o dossiê, no Rio 22 mil pessoas vivem sob a ameaça de perderem suas casas por conta das Olimpíadas, sendo que 8 mil já foram removidas em 24 comunidades.

Segundo o projeto olímpico, os moradores removidos da Vila Autódromo serão transferidos para edifícios a serem cedidos pela prefeitura em um bairro próximo. Sobre o local onde hoje se encontra a comunidade, deverá passar o traçado da Transcarioca, via expressa de ônibus prevista no projeto. O dossiê afirma que “a prefeitura pretende legitimar a remoção de 500 famílias e a cessão, para o consórcio privado Odebrecht – Andrade Gutierrez – Carvalho Hosken, de uma área de 1,18 milhões de m2, dos quais 75% serão destinados à construção de condomínios de alta renda”. 

Orçamento atrasado

Outro fantasma que assombra os Jogos Olímpicos de 2016 é a indefinição quanto ao orçamento final do evento. Os números estimados pela prefeitura ultrapassam os R$ 28 bilhões, mas o custo total está longe de ser definido. O atraso na definição do orçamento mereceu críticas do presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI), o belga Jacques Rogge: “Estamos pedindo [ao COB e à Prefeitura do rio] para o orçamento ser finalizado o quanto antes”, disse aos jornalistas, ainda em Londres, minutos antes de assistir à cerimônia de passagem da Bandeira Olímpica a Eduardo Paes. 

Apesar da pressa do COI, o orçamento das Olimpíadas do Rio só deverá mesmo ser fechado no segundo semestre e anunciado no ano que vem. “Os projetos mudaram e há uma discussão sobre o que é conta olímpica e o que é política pública. Além disso, nem todas as obras têm projetos executivos. Somente em 2013 teremos um orçamento”, disse, em entrevista ao jornal O Globo, a economista Maria Silvia Bastos Marques, presidenta da Empresa Olímpica Municipal. 

Segundo a prefeitura, alguns projetos já estão orçados, como as reformas do Maracanã (R$ 860 milhões) e do Aeroporto Internacional do Galeão (R$ 845 milhões), que servirão também à Copa do Mundo de 2014. Também têm orçamento já estimado a construção do Parque Olímpico (R$ 1,35 bilhão) e a instalação do corredor expresso de ônibus Transolímpico (R$ 1,6 bilhão), que interligará bairros da Zona Oeste da cidade. 

Outras obras, como a reforma do Sambódromo (R$ 65 milhões), que receberá a chegada da maratona, a construção do Centro de Operações Rio (R$ 25 milhões) na Cidade Nova ou a instalação do corredor expresso Transoeste (R$ 1,8 bilhão), já foram concluídas, parte delas com o custo dividido com o orçamento da Copa do Mundo.

Boxear

Mesmo com a presença das autoridades, a cerimônia de apresentação da Bandeira Olímpica à presidenta Dilma ficou marcada pela participação dos irmãos e pugilistas Esquiva Falcão e Yamaguchi Falcão, que ganharam medalhas de prata e bronze, respectivamente, nos recém-encerrados jogos de Londres. Indagada por um jornalista se gostaria de boxear os juros, Dilma respondeu: “Acho que a gente tem de boxear todas as coisas que atrapalham o crescimento do país”.

Após ser oficialmente apresentada à presidente da República, a Bandeira Olímpica retorna ainda hoje ao Rio de Janeiro. Amanhã (15), o pavilhão inicia pelo bairro de Realengo e pelo Complexo do Alemão uma série de exposições em diversos pontos da cidade. À tarde, a Bandeira Olímpica será oficialmente apresentada à população pelo prefeito Eduardo Paes, em cerimônia no Palácio da Cidade.

A bandeira, que mede 2,22 metros de largura por 1,54 metro de altura, foi confeccionada com pura seda e é utilizada desde as Olimpíadas de Seul (1988). A relíquia olímpica ficará guardada em uma caixa especial de madeira na Gávea Pequena, residência oficial do prefeito do Rio.