Paraatletas brasileiros sofrem com falta de investimentos e de apoio

O programa Bolsa Atleta, do governo federal, apesar de importante, é insuficiente para suprir todas as necessidades de quem já trava batalhas diárias para superar as limitações do corpo

Infraestrutura e equipamentos de qualidade fazem falta no dia a dia dos paraatletas (Foto: Sérgio Caddah/Águias SP)

São Paulo – Apesar de iniciativas do governo federal para alavancar o esporte nacional de competição, como o  programa Bolsa Atleta, os paraatletas brasileiros continuam bastante afetados pela ainda carente estrutura do Brasil para lidar com as necessidades de esportistas com deficiência. Falta de patrocínio, de materiais e equipamentos adequados, infraestrutura inadequada e ausência de políticas de investimento dos governos estaduais e municipais constituem as barreiras a serem vencidas.

O Grêmio Recreativo Independente “Águias da Cadeira de Rodas”, ou simplesmente Águias, com sede na capital paulista, ilustra essa realidade. O time de basquete adaptado  ̶  formado por um misto de atletas paulistas e de outros estados  ̶  enfrenta dificuldades para conseguir reconhecimento, obter visibilidade e prover ao menos uma renda mínima aos jogadores.

“Mesmo as empresas sabendo que, apoiando e patrocinando o esporte, poderiam ter descontos nos impostos e a imagem divulgada pelo time, é muito difícil apoiarem e quererem patrocinar o esporte para-olímpico”, explica o pivô Luciano da Silva, do Águias e da seleção brasileira da modalidade.

Como forma de estimular a prática esportiva, inclusive entre atletas com deficiência, o governo federal lançou, em 2005, o programa Bolsa Atleta. A ideia é auxiliar atletas de alto rendimento que não possuem patrocínio ou condições de se dedicar exclusivamente ao esporte. “O público-alvo são atletas e para-atletas de alto rendimento que obtêm bons resultados em competições nacionais e internacionais de sua modalidade”, explica secretário de Esporte de Alto Rendimento do Ministério do Esporte, Ricardo Leyser.

Para ter direito à bolsa, porém, é necessário que o atleta, ou a equipe à qual pertence, consiga se classificar como um dos três primeiros colocados de sua categoria em nível nacional, internacional, olímpica ou paraolímpica. Os valores repassados variam de R$ 370, para o nível básico e estudantil, a R$ 3,1 mil para as categorias olímpica e paraolímpica.

No entanto, apesar dos avanços da iniciativa, os jogadores do Águias São Paulo, por exemplo, não contam com o benefício, apesar de sempre estarem entre as três melhores equipes de basquete adaptado do país. “Nos últimos anos não ficamos pensando na bolsa, pensamos em ganhar. É o nosso ganha-pão, esse é o objetivo pelo qual nos esforçamos e treinamos”, disse o armador Anderson Ferreira.

 A insegurança de um dia perder a colocação e consequentemente o Bolsa Atleta, já afligiu muito os jogadores do Águias, mesmo tendo conseguido permanecer no pódio do basquete adaptado durante todos esses anos. “Tivemos alguns momentos muito difíceis, se o Águias não conquistasse um dos primeiros lugares, a equipe poderia se desfazer devido às condições financeiras em que se encontrava”, diz Luciano da Silva.

A escolha, decidida após muito debater o futuro da turma, foi abrir mão do incentivo oficial, deixar de lado o risco da acomodação e partir para buscar recursos próprios para a manutenção do trabalho e do time. “Muitos que nunca viram o nosso basquete acham que ele é recreação e não é. Esse é o nosso trabalho. Aqui estão os nossos esforços e as nossas conquistas. Por isso precisamos de patrocínio, para dar continuidade à prática desse esporte no Brasil”, explica Anderson , que também é da seleção brasileira.

Ação local

Buscando formas de amenizar a situação dos esportistas que não se enquadram no programa federal, alguns estados, a maioria do Nordeste, criaram uma espécie de bolsa estadual de incentivo ao atleta. São apenas sete estados que mantêm algum tipo de financiamento ao esporte amador. Porém, alguns dos principais estados do país, como São Paulo e Rio Grande do Sul, não possuem nem ao menos propostas para futuros projetos.

São Paulo, por exemplo, tem somente o Bolsa Talento Esportivo, um programa voltado ao incentivo da prática de esportes por alunos de escolas do estado. Alguns dos maiores times e atletas nacionais estão concentrados em São Paulo, porém a falta de perspectiva e de apoio são fatores que atrapalham a decisão de se dedicar cada vez mais ao esporte e conquistar títulos.

A dificuldade em conseguir patrocinadores é o que separa o sonho da realidade, pois permite o acesso a bons equipamentos esportivos, bons treinadores e tudo que envolve as necessidades dos atletas que competem em alto nível. Para a captadora de recursos Fernanda Dearo, o grande problema de se conseguir patrocínio no Brasil é a falta de profissionais qualificados para realizar o trabalho.“Você precisa de um profissional de captação de recursos, para fazer um trabalho sério da venda do produto atleta. É necessário estudar o mercado, saber o que as empresas estão procurando, mostrar a dimensão do público que vai ser atingido etc.”, ressalta.

Em meio a tantas dificuldades, o trabalho do Bolsa Atleta é visto pelos esportistas como algo benéfico. De acordo com Anderson Ferreira, existem atletas cadeirantes que nunca pensaram em ser remunerados pelo governo. “O Bolsa Atleta é um incentivo a mais, não apenas pelo dinheiro, mas também por indicar que somos reconhecidos. Isso só veio incentivar o para-esportivo de modo geral”, completa Luciano da Silva.

De acordo com o secretário Ricardo Leyser, o Bolsa Atleta tem conseguido alcançar seu objetivo, ou seja, apoiar os esportistas para que eles tenham mais condições de se dedicar ao treinos e aumentar as chances de conquistar seus objetivos. “O Brasil chegou ao nono lugar em Pequim (nas Olimpíadas de 2008) e deverá chegar entre os sete melhores em Londres graças, em boa medida, ao apoio do Bolsa-Atleta”, defende o secretário.

Na visão do paraatleta Anderson Ferreira o governo está se esforçando, mas é preciso fazer mais. “Não basta o trabalho em um período para disputarmos uma paraolimpíada. A paraolimpíada acontece de quatro em quatro anos, então é necessário ter um trabalho de quatro anos, para quando chegar a hora nós estarmos preparados”, explica.

Em 2011 foi aprovada e sancionada a Lei Federal 12.395, que criou o programa Cidade Esportiva e a Rede Nacional de Treinamento, ambos em fase de regulamentação. Os projetos terão como objetivo investir na formação de atletas nos municípios brasileiros e dar treinamentos com foco nas atividades olímpicas e paraolímpicas, o que pode representar um salto na qualidade e no investimento do esporte brasileiro.

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