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Chega ao fim turnê histórica de Roger Waters no Brasil

Marcada por forte engajamento político, a turnê 'Us + Them' chega a seu último show em Porto Alegre. Britânico ex Pink Floyd fez barulho contra 'banquete selvagem para os cães mais fortes'

divulgação

Em uma série de shows grandiosos, músico se levantou contra o fascismo e contra Bolsonaro

São Paulo – Roger Waters, fundador de uma das maiores bandas de rock da história, o Pink Floyd, chega hoje (30) ao seu último show no Brasil. Sua turnê Us + Them foi marcada pelo forte engajamento político justamente em um dos períodos mais delicados da história da jovem democracia brasileira. No domingo (28), as urnas elegeram Jair Bolsonaro (PSL), político de extrema-direita, que defende um modelo autoritário de governo.

Coerente com seu estilo crítico ao neoliberalismo, ao modelo de exploração capitalista, e a toda forma de totalitarismo, Waters fez frente à ascensão do fascismo em todos os seus shows. Em sua primeira apresentação, para 45 mil pessoas, no dia 9, no Allianz Parque, em São Paulo, projetou, durante um show grandioso e impecável, a #EleNão, o que provocou reações de apoio e repúdio da plateia. Desde então, seu tom político só foi amplificado.

O espetáculo apresentado é originalmente dividido em três partes. Entre as duas primeiras, mensagens politizadas sobre temas urgentes como defesa do meio ambiente, combate ao preconceito e a desigualdade, e, especialmente, um alerta para a escalada de regimes fascistas em todo o mundo. No telão, líderes dessa vertente. Entre eles, Bolsonaro.

Após as vaias, no dia seguinte, ainda em São Paulo, em apresentação extra, o nome do presidente estava com uma faixa vermelha. “Ponto de vista político censurado”. Waters seguiu sua defesa dos direitos humanos e reiterou suas críticas. No telão, as palavras: “Nem fodendo”.

Três dias depois, em Brasília, a mesma censura no nome de Bolsonaro. Waters pediu para que a plateia não brigasse entre si, em uma grande disputa de gritos de apoio e repúdio ao político extremista.

Quatro dias depois, um dos shows mais emocionantes. No dia 17, a Arena Fonte Nova, em Salvador, o recebeu de braços abertos, sem manifestações contrárias. Em coro, saudavam a presença e a preocupação de Waters com a situação do país. Em determinado momento, o ex-Pink Floyd parou o show e prestou uma homenagem ao capoeirista Moa do Katendê, assassinado por um apoiador de Bolsonaro após se declarar opositor. “Era um grande exemplo para todos nós sobre como espalhar o amor”, disse o músico com lágrimas nos olhos.

No dia 21, o Mineirão, em Belo Horizonte, foi palco de show similar ao de São Paulo e Brasília. Já em sua passagem pelo Rio de Janeiro, no dia 24, o tom emotivo voltou. Como era de se esperar, no Maracanã, Water homenageou Marielle Franco, vereadora do Psol assassinada em março. O britânico chamou para subir no palco a mãe de Marielle, a irmã e também sua viúva. Ele cobrou respostas da Justiça enquanto vestia uma camiseta “Lute como Marielle Franco”. “Ela acreditava em direitos humanos, assim como eu”, disse.

Na véspera do segundo turno, o show mais tenso. Há poucas horas da decisão do destino do país, o estádio Couto Pereira, em Curitiba, recebeu Waters. A cidade possui uma maior concentração de conservadores e reacionários, e havia uma expectativa forte para o show, após a Justiça brasileira ter ameaçado Waters de prisão, caso falasse sobre política após as 22h.

O britânico não perdoou. Faltando poucos segundos para as 22h, ele interrompeu a música Breathe, do icônico ábum Dark Side of the Moon, para projetar: “Essa é nossa última chance de resistir ao fascismo antes de domingo. Ele não”. Algumas vaias e muitos aplausos.

Passada a eleição, hoje ele finalmente encerra sua passagem histórica pelo país.

O clima obscurantista que paira sobre o Brasil ainda deixou outra marca na turnê do ícone. A equipe de Bolsonaro entrou com uma ação contra seu opositor, Fernando Haddad (PT), alegando que Waters estaria em propaganda pelo petista. Em nenhum momento o músico sequer falou sobre Haddad. A ação pede inelegibilidade de Haddad e sua candidata a vice, Manuela d’Ávila, por oito anos.

Ironicamente, Bolsonaro é acusado de promover propaganda ilegal por meio de caixa dois financiado por empresários que investiram na extrema-direita neoliberal.

Waters falou sobre a ligação entre o autoritarismo e o neoliberalismo em entrevista concedida a Caetano Veloso. “É um fenômeno global colocado me parece nas nossas cabeças pelas novas políticas neoliberais desenvolvidas em Chicago e vendidas ao mundo por Ronald Raegan, Margareth Tatcher e outros. Dizem que tudo que temos que fazer para resolver problemas sociais é desacorrentar corporações e sistemas econômicos. Desregulamentar tudo e simplesmente permitir liberdade para todos. Um banquete selvagem para os cães mais fortes e selvagens.”

“Só de brincar com a ideia de ter alguém como Bolsonaro na presidência seria impensável se você tivesse qualquer sentimento social, político ou humanitário, ou educacional. Porque só pelo que o cara fala, ele se afunda nas próprias palavras. É sem sentido. O Brasil é um grande e extraordinário país, com diversidade. As pessoas estão desesperadas em razão do neoliberalismo já”, completou sobre Bolsonaro.

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