Mundo corporativo é desculpa para ‘Duplicidade’

Atores Julia Roberts e Clive Owen na estreia de “Duplicidade” em Paris (Fonte: Reuters/Gonzalo Fuentes) São Paulo – A julgar pela temática dos dois filmes que escreveu e dirigiu, Tony […]

Atores Julia Roberts e Clive Owen na estreia de “Duplicidade” em Paris (Fonte: Reuters/Gonzalo Fuentes)

São Paulo – A julgar pela temática dos dois filmes que escreveu e dirigiu, Tony Gilroy anda bastante preocupado com o mundo das grandes corporações. “Duplicidade”, que estreia no país nesta sexta-feira (5), é uma combinação entre espionagem, romance de alta voltagem, intriga e um pouco de comédia — vinda basicamente do absurdo de toda a situação — no mundo das grandes empresas.

No fundo, uma história de amor e sensualidade entre duas pessoas repletas de motivos para não confiarem uma na outra, “Duplicidade” é uma espécie de “Sr & Sra Smith” sem violência e com inteligência no lugar das armas.

Talvez o filme possa assustar quem busca um divertimento descompromissado estrelado por Julia Roberts. Divertimento há, mas este não vem de graça — na contra-mão dos produtos pasteurizados e auto-explicativos de Hollywood que desembarcam semanalmente nos multiplexes do mundo.

Ao contrário de sua estreia na direção com “Conduta de Risco” (2007), Gilroy aqui deixa de lado a seriedade, tentando (e conseguindo) se comunicar melhor por meio da comédia logo nos créditos iniciais, quando dois chefões sisudos da indústria de higiene — interpretados por Paul Giamatti e Tom Wilkinson — caminham um em direção ao outro e se atracam exageradamente em câmera lenta.

Num prólogo, Claire (Julia) conhece Ray (Clive Owen, de “Filhos da Esperança”) numa festa da independência dos EUA, em Dubai. Eles dormem juntos, mas ela sai à francesa e leva consigo alguma informação importante. Anos depois eles se reencontram e, por mais que ele insista que a conhece e foi enganado, ela nega. Os dois são ex-espiões governamentais que agora trabalham para empresa privadas — o que é muito mais rentável. Durante o reencontro se dá um diálogo memorável, que será repetido outras vezes em diversas situações e para os mais variados efeitos.

Há um motivo óbvio mostrando como um foi feito para o outro: jamais encontrarão um par tão à sua altura, mas, ao mesmo tempo, nunca poderão confiar no outro. Ainda assim nenhum dos dois ex-espiões, embora juntos por motivos do coração e do bolso, quer confessar seu amor. Afinal, a outra parte iria acreditar?

Se no passado o que movia os filmes de espionagem era a Guerra Fria, com nações assimétricas e igualmente poderosas, agora o marketing global é responsável por movimentar esse gênero cinematográfico.

Gilroy, que também roteirizou os filmes da trilogia “Bourne”, sabe disso e coloca em cena duas empresas de grande porte, chamadas Burkett & Randle e Equikrom, numa guerra séria, pelo mercado de xampu, fraldas geriátricas, cremes e loções — a diferença entre esses dois produtos, aliás, como fica claro, é importante.

Num mundo onde segredos valem ouro, Claire e Ray fazem de tudo para esconder o seu relacionamento. Viajando de lado a lado — Roma, Londres, Dubai, Nova York — a dupla se encontra e se desencontra, seduz um ao outro e troca segredos e informações confidenciais. Indo e voltando no tempo, Gilroy pede de seu público concentração para montar o quebra-cabeça de intriga e enganos da trama de “Duplicidade”.

Uma das duas empresas tem uma fórmula rentável — ninguém sabe qual é o produto, mas todos garantem que ele renderá lucros incalculáveis. Juntos, Claire e Ray deverão roubar a fórmula e enviá-la para a concorrente. A sequência do roubo, por exemplo, garante um dos momentos mais tensos do filme.

Gilroy brinca o tempo todo com o conceito de duplicidade: quem trabalha, na verdade, para quem; quem, realmente, seduz a quem? Por isso, o longa é um jogo de espelho, repleto de reflexos e leituras: uma comédia romântica no mundo da espionagem industrial, um suspense cômico cujo pano de fundo é o amor — ou um filme bastante inteligente, que brinca de se levar a sério; ou um filme sério, que parece estar zombando do estado das coisas. Qualquer que seja a opção, “Duplicidade” mostra que ainda há vida inteligente respirando em Hollywood.

Fonte: Reuters/Cineweb

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