Eleições 2018

Uma ‘nova direita’ pior do que a antiga

Para o doutor em Ciência Política pela USP Vinicius do Valle, mídia tradicional e legendas como o PSDB fomentaram um clima antipolítico que permitiu o crescimento do grupo bolsonarista

Nilson Bastian/Câmara dos Deputados

Perspectivas em relação à agenda do Congresso Nacional a partir de 2019 não são boas

São Paulo – Após o primeiro turno das eleições de 2018, pode-se dizer que a direita saiu fortalecida mas houve uma recomposição desse campo. A chamada direita tradicional e a centro-direita, que correspondiam ao MDB e ao PSDB tiveram uma uma queda importante, com redução do seu poder eleitoral. Ao mesmo tempo, uma “nova direita”, representada principalmente pelo PSL, ganhou espaço. Mas como esse segmento que conquistou representação vai atuar no campo político-institucional?

“Essa direita é mais religiosa, liberal no plano da economia e menos apegada à democracia. A gente ainda não sabe até que nível esse grupo tem uma defesa de princípios básicos como igualdade perante à lei, respeito aos direitos humanos, isso ainda está em questão. Mas é uma direita diferente da anterior”, explica o cientista político Vinicius do Valle, doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP).

O PMDB foi a legenda que mais perdeu cadeiras, passando de 66 eleitos em 2014 para 34 em 2018. O PSDB, que tem 49 deputados atualmente, elegeu 29, enquanto o PSL, que nas últimas eleições havia conquistado apenas uma cadeira na Câmara, chega a 52, tornando-se o segundo maior partido da Casa.

De que forma o grupo heterogêneo que se elegeu na onda bolsonarista e inclui celebridades, delegados, policiais, ex-atletas, militares e até membro da “família real” brasileira vai se comportar ainda é uma incógnita. Mas as perspectivas em relação à agenda do Congresso Nacional não são boas. “Agora é hora de vermos o que é retórica para ganhar votos de um conservadorismo social que cresceu bastante, e o que de fato vão fazer. Mas é possível dizer que vamos ter vários recuos com relação a pautas como direitos LGBT e discussão sobre gênero nas escolas, por exemplo. Isso foi muito colocado durante a campanha e vai aparecer nesse novo período”, avalia. “Se a gente não tinha força para discutir descriminalização do aborto, uma nova política de drogas, vamos ter menos ainda.”

A atenção voltada para as pautas de cunho moral facilitam a adesão de denominações evangélicas e também a inserção em camadas mais pobres da população. “Os setores religiosos, principalmente os evangélicos pentecostais, têm um papel muito grande no  crescimento dessa nova direita. Não é à toa que boa parte das pautas colocadas são morais, absorvidas por um discurso religioso feito por algumas igrejas”, diz Vinicius. “Colocam pautas de direita junto a setores populares, que continuam sendo, mas em menor parte, base do lulismo.”

O triunfo da antipolítica

Para o cientista político, as próprias legendas de centro-direita – em especial os tucanos – e setores relacionados criaram o ambiente que por fim aumentou sua própria rejeição. “Foi um tiro no pé do PSDB, da mídia tradicional e dos setores tradicionais da direita brasileira. Eles alimentaram o clima de antipetismo, forçaram as instituições no caso do impeachment, principalmente, no caso da prisão do Lula, e fomentaram um clima antipolítico na sociedade no qual esses grupos acabaram não sendo beneficiados”, pondera. “Quem foi beneficiado foram os grupos à margem do sistema político e o candidato que confrontou esse sistema a partir de um discurso reacionário de direita.”

“É um trabalho que vem sendo feito principalmente nos últimos oito anos. A campanha do PSDB de 2010 apelou muito para o moralismo religioso e para teorias da conspiração, como a de que o Foro de São Paulo quer dominar o Brasil e o mundo, e que o país vai ‘virar uma Venezuela’. E alguns setores da mídia vêm colocando isso no debate público desde 2010. Agora, estamos colhendo os frutos disso”, analisa.

Vinicius acredita que o atual panorama, no qual emerge “nova direita é muito pior do que a antiga”, exigiria uma autocrítica de todo o sistema político e também do meio jornalístico. “Isso foi consequência de um ambiente político que a própria direita ajudou a criar, inclusive com apoio da mídia nacional e do jornalismo como um todo. O jornalismo que se mostra agora preocupado com a democracia deveria fazer uma autocrítica da sua postura nos últimos anos.”

Para o cientista político, no segundo turno as rede sociais seguirão como meios fundamentais para as campanhas, mas não se pode desprezar a televisão.
A partir da próxima sexta-feira (12), cada candidato terá direito a 5 minutos no horário eleitoral gratuito em rádio e TV. “É uma mudança as redes sociais serem tão fortes nessa campanha, mas não podemos dizer que a TV vai deixar de ser importante, embora tenha perdido a importância de antes. Ela foi fundamental, por exemplo, para a ascensão do Haddad, em especial para as pessoas da classe mais baixa não têm acesso à internet e às redes sociais ainda.”