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Programa de Aécio admite que inflação de alimentos é fruto de fatores externos

Plano de governo reconhece que especuladores no mercado agrícola são fator fundamental para encarecer comida. Nas propostas para agricultura somem promessas sobre superministério e terras indígenas

ruralbr / reprodução

Preços dos alimentos sofrem pressão de especuladores financeiros, admite programa de governo proposto pelo PSDB

São Paulo – O diagnóstico elaborado pela equipe de campanha do candidato à presidência da Republica pelo PSDB, Aécio Neves, conclui que existe um arranjo internacional no mercado agrícola: “demanda forte com baixos estoques e com alta presença de especuladores acarreta instabilidade permanente e altos preços”. Embora ataquem firmemente o aumento de preços nos alimentos nos últimos anos, evocando o fantasma da volta da inflação, os tucanos admitem que é “forçoso reconhecer” que existe uma situação mundial interferindo nos preços e nas demandas dos alimentos.

Ao compor a argumentação sobre a necessidade de o Brasil melhorar sua já destacada posição no cenário internacional de exportações agrícolas, ressaltando um importante aumento na demanda, a campanha de Aécio indica também que muitos investidores viram no mercado agrícola uma maneira de se proteger contra a desvalorização do dólar na última década.

“O mundo agrícola assistiu nos últimos dez anos à entrada maciça de fundos de investimentos e especuladores nos mercados de futuros agrícolas. As posições compradas e vendidas desses agentes trouxeram grande volatilidade aos preços das commodities agrícolas, complicando o quadro de precificação desses produtos”, diz um trecho do documento. Commodities são produtos em estado bruto, normalmente com cotação internacional.

Outro ponto destacado é a eliminação dos grandes estoques públicos de alimentos, utilizados para garantir preços e atender à demanda em situações de desabastecimento, ao mesmo em que a demanda mundial cresce sem parar. Segundo Aécio, os grandes investidores do setor passaram a utilizar as diferentes periodicidades de safra nos hemisférios norte e sul do planeta para ter sempre o produto, sem estocar.

“Ao fazer isso, reduz-se substancialmente a quantidade de estoques necessários para atender ao comércio mundial. Entretanto, é forçoso reconhecer que o risco do novo modelo agrícola internacional é extremamente alto. Demanda forte com baixos estoques e com alta presença de especuladores acarreta instabilidade permanente e altos preços. Eis o novo equilíbrio da economia agrícola internacional.”

Porém, ao mesmo tempo que reconhece a dificuldade em garantir preços baixos nos alimentos, o tucano ataca o governo da presidenta e candidata à reeleição Dilma Rousseff (PT), por conta da inflação que ele considera “descontrolada”. “Como eu acho que [a inflação] não está sob controle, vou decretar guerra à inflação, tolerância zero, nós vamos tirar esse fantasma de novo da vida da dona de casa do trabalhador brasileiro”, prometeu na tarde de ontem (20), em visita ao Santuário de Aparecida.

O Brasil é hoje o maior exportador de suco de laranja, com 81% do total global. Também é líder na exportação de soja, com 41% do volume mundial. E ainda controla um terço do comércio mundial de carne de frango.

Embora o agronegócio não seja responsável pelo atendimento da maior parte da demanda interna brasileira – cuja produção vem dos pequenos produtores e de agricultura familiar –, uma situação de instabilidade no setor, acrescida de um cenário de crise internacional e de condições climáticas adversas como a estiagem em São Paulo, pode interferir no preço praticado internamente, promovendo altas como as vistas com os tomates no início do ano passado.

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Propostas

O diagnóstico do PSDB, no entanto, não se reflete em propostas. A dificuldade em conciliar os pedidos da excandidata Marina Silva (PSB), que ficou em terceiro lugar no primeiro turno das eleições, com os compromissos apresentados em sabatina na Confederação Nacional da Agricultura, em julho, podem ter pesado nas escolhas do candidato.

Na ocasião Aécio prometeu criar um superministério da Agricultura, agregando as pastas de Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Meio Ambiente; Desenvolvimento Agrário; e Pesca. Embora mantenha a diretriz de reduzir o numero de ministérios, esta proposta não consta do programa de governo.

Mas o compromisso de aceitar as orientações de entidades e lideranças do agronegócio para a indicação de membros do ministério está mantido. “Nós teremos lá pessoas do ramo, que sejam indicadas e representativas do setor”, disse o candidato em julho. No programa, Aécio diz que vai “devolver ao Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) seu poder de decisão sobre as políticas agrícolas. Resgatar a sua representatividade”.

O que sumiu foi a demarcação de terras indígenas. Estes povos são citados apenas em ações culturais e de saúde. Com a CNA, Aécio assumiu o compromisso de que participariam do processo os estados, o Congresso Nacional e outros órgãos federais, como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), além da Fundação Nacional do Índio (Funai). Ele também já se declarou favorável à Proposta de Emenda Constitucional 215, que passa para o Congresso Nacional o poder de definir a demarcação de terras indígenas.

Hoje, a Funai realiza um estudo multidisciplinar no território para atestar, ou não, sua ancestralidade. Depois o órgão indigenista recebe alegações e documentos em contrário. Se nenhuma contestação derrubar o estudo, o documento segue para o Ministério da Justiça e depois para a presidenta da República, que homologa a demarcação.

Marina havia pedido compromisso do candidato com as demarcações como uma das condições para apoiá-lo. Assim como pediu quanto à reforma agrária, tema que o candidato só trata superficialmente.