Direito e eleição

Para Thomaz Bastos, ambiente eleitoral pode favorecer retrocessos nos direitos individuais

Em evento em São Paulo, jurista diz que influência da mídia nos processos criminais está dificultando trabalho dos advogados: 'O que temos visto é o linchamento dos réus. O réu já entra condenado'

Pedro Ladeira/Folhapress

Para ex-ministro da Justiça, combate à criminalidade deve ser mais preventivo do que repressivo

São Paulo – O jurista Márcio Thomaz Bastos acredita que conjunturas e períodos eleitorais exigem atenção e podem trazer consequências negativas aos direitos individuais duramente conquistados no país. “O ambiente da eleição é propício a retrocessos. É preciso cuidado para que eles não se efetivem e aqueles que são enunciados fiquem apenas no discurso”, disse Bastos à RBA.

O jurista também falou sobre a interferência do caso do delator Paulo Roberto Costa, exposto pela mídia por suas denúncias contra o PT e acusações de envolvimento do partido em suposto pagamento de propina em negócios da Petrobras. Ontem (13), a direção nacional do PT protocolou representação no Supremo Tribunal Federal e na Procuradoria-Geral da República, com pedido de acesso à delação premiada de Costa, que tem alimentado as páginas dos grandes jornais com as denúncias não comprovadas. No mesmo dia, o partido apresentou queixa-crime contra o delator no juizado Especial Criminal do Foro Central da Região Metropolitana de Curitiba, no Paraná. “É preciso cuidado para que ele (o processo de Paulo Roberto Costa) não interfira na eleição”, comentou Márcio Thomaz Bastos.

Em palestra na Fenalaw, feira para operadores do direito realizada em São Paulo de hoje (14) a quinta-feira (16), o ex-ministro da Justiça (de 2003 a 2007) falou sobre o sistema carcerário brasileiro e a proposta de reduzir a maioridade penal no Brasil, defendida pelo candidato à Presidência da República Aécio Neves (PSDB), assim como pelo governador de São Paulo, o também tucano Geraldo Alckmin. “A reforma do sistema carcerário passa pelas penas alternativas. Elas existem no ordenamento jurídico, mas não estão na cultura brasileira”, disse.

“Encarcerar não resolve”, diz o jurista. Ele acredita que o encarceramento deve ser um recurso utilizado em casos muito graves, como para réus fisicamente perigosos e organizações criminosas. “Daqui a pouco a maioridade penal estará em dez anos. Vários países que aumentaram a maioridade penal depois a reduziram de novo, porque não resolveu.” Segundo Bastos, é importante a criminalidade ser combatida mais preventivamente do que por repressão.

Na palestra, o jurista e advogado também abordou a interferência midiática nos julgamentos criminais e sua ameaça aos direitos individuais. “É o que chamamos trial by media (conceito popularizado para definir a influência da televisão e dos jornais na reputação das pessoas). O que temos visto hoje é o linchamento dos réus. O réu já entra no julgamento condenado. A profissão de advogado hoje está muito difícil”, disse à plateia de profissionais da área. “A Constituição Federal e a consciência vedam absolutamente a censura. Ao mesmo tempo, a influência da mídia é uma preocupação no mundo inteiro. Fazer o julgamento com (a pressão da) mídia é muito difícil.”

O jurista Tércio Sampaio Ferraz Jr. vê um caráter eleitoreiro em propostas de mudar direitos, como reduzir a maioridade penal. “O processo eleitoral, principalmente o brasileiro, engana um pouco em relação ao que vai acontecer depois. Tudo o que depende do Congresso, depende do Congresso. É uma ilusão você achar que o presidente, porque é o presidente, vai fazer isso ou aquilo”, disse.

“Existem promessas, por exemplo, de diminuir maioridade penal, mas é complicado fazer isso. Sem maioria no Congresso, você não faz. Esse é um caso desses. Isso tem mais efeito eleitoral do que efeito pós-eleitoral. É muito difícil você fazer esse tipo de mudança, a não ser que você use instrumentos drásticos, como Collor fez, e caiu”, lembra Ferraz.

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