copo cheio de votos

Na véspera da eleição, racionamento noturno de água desaparece de São Paulo

Risco de Geraldo Alckmin (PSDB) perder votos por conta da falta de água em bairros da periferia da capital paulista leva Sabesp a garantir fornecimento a noite

ADRIANA SPACA/BRAZIL PHOTO PRESS/FOLHAPRESS

Falta de água era o problema que mais afetava a candidatura de Geraldo Alckmin à reeleição

São Paulo – A dois dias da eleição – e com o governador e candidato a reeleição Geraldo Alckmin (PSDB) sofrendo uma pequena queda nas pesquisas – a misteriosa falta de água noturna que vinha afetando a população de bairros das zonas norte, leste e oeste da capital paulista simplesmente deixou de ocorrer. Sempre negado por Alckmin, o racionamento velado vinha acontecendo todos os dias, entre 20h e 5h do dia seguinte. No último debate, o candidato Alexandre Padilha (PT) havia pedido que a população prestasse atenção em suas torneiras antes de ir votar no domingo (5).

A RBA conversou com os mesmos moradores que haviam sido entrevistados há 20 dias e relataram os problemas. A aposentada Elza Mufalo, da Vila Maria (zona norte), o sociólogo Gérson Brandão Júnior e a aposentada Darci dos Santos Braga Duarte, do Jardim Romano (zona leste), e o jornalista Cyro Queiroz Fiúza, do Jardim Previdência (zona Oeste) relataram surpresa com as torneiras nos últimos dias.

“Levantei de madrugada para tomar água e resolvi abrir a torneira. E pela primeira vez em três meses correu água normalmente”, contou Brandão Jr. Várias vezes nos últimos meses o sociólogo teve de armazenar água em garrafas pet e tomar banho de caneca.

A região do Jardim Romano é uma das que mais sofre com a falta de água. Mas contatar a Sabesp não costuma resolver, como contou Darci. Quando a água não chagava até as 9h, ela ligava para a companhia, que sempre negava o problema.”Quinze minutos depois, a água volta”, relatou. Nos últimos dias, não precisou se preocupar. “A gente continua guardando, porque não dá para confiar”, destacou Darci.

O secretário estadual de Recursos Hídricos, Mauro Arce, chegou a dizer que as reclamações de falta de água ocorriam porque a população “gosta de um microfone”. Mas admitiu que a redução de pressão noturna, ação oficial que a Sabesp estaria realizando para evitar perdas de água, poderia fazer com que ela não chegasse em alguns lugares.

A farmacêutica Fernanda Lima de Moura, moradora da Vila Maria Alta, relata que mesmo essa restrição foi retirada. “Na minha casa não chegou a faltar água, mas era notável a redução da pressão nos últimos meses. Tanto que não percebíamos o ruído característico da caixa de água enchendo”, contou. “Desde quinta, está tudo normal.”

O assunto tomou conta do último debate entre os candidatos ao governo paulista, realizado na quinta-feira (2). Padilha, o candidato do PMDB, Paulo Skaf, e concorrentes com menos chances na eleição acusaram Alckmin de ser responsável pela crise e de fazer racionamento às escondidas.

Em comício no bairro de Cidade Tiradentes, extremo leste da capital paulista, no último dia 1º, Padilha reafirmou as críticas a Alckmin pelo racionamento velado e o “desafio da torneira”. “Ele teve a desfaçatez de dizer diante das câmeras que não falta água em São Paulo. Lancei o desafio da torneira, quero ver ele vir num bairro da preferia à noite e abrir a torneira e ver se sai água”, disse.

Mas, segundo relato do jornalista Cyro Queiroz Fiúza, o governador se preparou para o caso de a população ouvir o petista. “Estão garantindo as eleições. Faz dois dias que não tem racionamento aqui. Isso é tão absurdo quanto negar que faltava água antes”, protestou.

Em agosto, o Instituto Datafolha concluiu que 46% dos paulistanos tinham sofrido interrupção no fornecimento de água, até 30 dias antes. No dia 2 de setembro, foi a vez de o Ibope revelar que 38% dos paulistanos tiveram o abastecimento cortado nos últimos três meses. Os dados demonstram que, em alguns lugares, a água não tem chegado regularmente.

Na Vila Maria, no entanto, o fornecimento de água está mantido, mesmo à noite, desde quinta-feira (2), relatou Elza. “Nos últimos meses faltava água toda noite. Nunca tivemos essa situação em dez anos que vivo aqui. Mas do mesmo jeito que começou, acabou”. A mãe dela, Elisa , que mora no Parque Novo Mundo, também percebeu que não está faltando água a noite. “O governador acha mesmo que a gente é besta né!? Mas eu não voto nele, não”, disparou Elza.

O Sistema Cantareira abastece 8 milhões de pessoas nas regiões leste, norte e centro da capital paulista, além de 11 cidades da região metropolitana de São Paulo. Com a crise, deflagrada oficialmente em 20 de fevereiro deste ano, Alckmin ofereceu desconto de 30% na conta para quem reduzisse 20% no consumo de água médio de 12 meses.

Mesmo assim, a Sabesp começou a retirar água dos sistemas Alto Tietê, Billings e Guarapiranga para suprir parte da demanda do Cantareira. E, desde maio, a utilizar o chamado “volume morto”, água que fica abaixo das comportas de saída por gravidade, que serve como sobrevivência do manancial. O esgotamento pode levar à seca irreparável das represas.

Hoje, o Cantareira atingiu 6,2% da capacidade, contando o volume morto. O governo Alckmin já pediu autorização à Agência Nacional de Águas para utilizar a segunda cota da reserva, com 108 bilhões de litros de água. O sistema Alto Tietê, que chegou ao pior nível da história em agosto, continua esvaziando e hoje está com apenas 12% da capacidade.

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