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Dúvidas sobre programa de Marina se estendem a propostas trabalhistas

Sindicalistas se dividem entre apoio à candidata do PSB, que pretende regulamentar terceirizações, atualizar CLT e limitar papel da Justiça do Trabalho. CUT critica ex-ministra

Código19/Folhapress

Com sindicalistas, Marina prometeu não retroceder ‘um milímetro’ em direitos trabalhistas

São Paulo – As dúvidas sobre o programa de governo de Marina Silva, candidata do PSB à Presidência da República, se estendem às suas propostas para o mundo do trabalho. A ex-ministra do Meio Ambiente foi a única entre os três primeiros colocados que formulou suas ideias no papel. Isso não tem servido, porém, para esclarecer as medidas que implementará caso seja eleita devido ao tom das 242 páginas em que desenvolve suas propostas.

Entre “regulamentar” terceirizações, “atualizar” a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e “limitar” o papel da Justiça do Trabalho, Marina é constantemente questionada por não apresentar propostas claras sobre temas que interessam aos trabalhadores. Diante das críticas, a candidata reafirmou seu compromisso em “não retroceder um milímetro das conquistas alcançadas a duras penas pelos trabalhadores brasileiros” durante encontro com sindicalistas em São Paulo, na quarta-feira (24).

Ontem (25), ao telejornal Bom Dia Brasil, da TV Globo, Marina disse que não iria mexer na CLT, mas logo em seguida prometeu submetê-la a uma “atualização” para “manter os direitos já conquistados e ampliar os que ainda se precisam conquistar” e também “para que aqueles aspectos que não estão sendo cumpridos adequadamente possam ser cumpridos”. Marina citou ainda a necessidade de avançar na formalização dos trabalhadores. “Não é simples, mas não podemos condená-los à informalidade.”

Sobre terceirizações, tema em que também vem sendo cobrada por posições mais claras, a ex-senadora afirmou aos jornalistas da Globo: “FHC fez um processo de terceirização para atividades-meio, que o PT manteve. Nem todos os trabalhadores têm seus direitos assegurados e nem todas as empresas se sentem seguras com a forma como esse processo foi estabelecido”.

Para Joílson Cardoso, vice-presidente da CTB e secretário sindical do PSB, a candidata tem sido bastante direta em suas propostas. “A CLT é o direito básico dos trabalhadores, que não pode ser mexido. Vamos adaptá-la à realidade, porque é uma lei que tem 70 anos”, aponta o sindicalista, que ajudou na formulação do plano de governo e participa da coordenação da campanha marinista. “Queremos ampliar direitos, por exemplo, equiparando salários de brancos e negros, homens e mulheres, que são discriminações inaceitáveis.”

“É inacreditável que uma candidata a presidente fale em mudar uma lei que afeta mais de 100 milhões de trabalhadores e não explique o que pretende mudar”, rebate o presidente da CUT Vagner Freitas, em artigo que defende a candidatura à reeleição da presidenta Dilma Rousseff (PT). “Pior é a resposta que Marina deu quando questionada: ‘Ainda não temos resposta, esse assunto é muito complexo’.”

Quanto às terceirizações, Joílson reforça que a candidata do PSB já assumiu que não irá modificar o atual ordenamento jurídico. “Não aceitaremos qualquer quebra nos conceitos de atividade-fim e atividade-meio.” O sindicalista considera que Marina é contra o Projeto de Lei 4.330, de 2004, do deputado federal Sandro Mabel (PMDB-GO), o que não aparece em seu plano de governo, que defende uma “atualização” do marco legal do setor. “Defendemos o enunciado da Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que proíbe a terceirização das atividades-fim.”

“Marina defende a terceirização usando os mesmos argumentos dos patrões”, contrapõe Freitas, da CUT, citando trechos do programa da candidata sobre o tema: “A terceirização leva à maior especialização produtiva, à maior divisão do trabalho e, consequentemente, à maior produtividade das empresas”.

A proposta de Marina também critica um certo “viés contra a terceirização” vigente no país, que, denuncia, acaba se traduzindo em impostos elevados – como ICMS e ISS – sobre as transações realizadas entre empresas. A consequência disso, de acordo com o texto, é que “algumas atividades que poderiam ser terceirizadas por empresas acabam sendo realizadas internamente, em prejuízo da produtividade”.

“O que queremos saber é: como Marina pretende mudar a CLT ou ‘regulamentar’ a terceirização sem tirar direitos dos trabalhadores?”, questiona o presidente da CUT. “Ela fala em atualizar as regras para ajudar na geração de empregos. O que isso significa? Quando os empresários falam isso, eles querem diminuir direitos e ampliar lucros. Nada mais que isso.”

“Não sou radicalmente contra, mas também não sou radicalmente a favor das terceirizações. Acho que precisamos discutir”, avalia Antônio Carlos dos Reis, o Salim, vice-presidente nacional da UGT, que participou do encontro da candidata com dirigentes sindicais. “Também defendo discutir as leis trabalhistas, porque muitas delas estão ultrapassadas. Mas iremos exigir que Marina esteja junto dos sindicatos.”

Outro ponto obscuro do plano de governo de Marina é o novo papel que pretende atribuir à Justiça do Trabalho. “Há que se buscar um modelo onde os atores coletivos sejam mais representativos, cabendo ao Estado impulsionar a organização sindical e a contratação coletiva. O novo modelo diminuiria o papel do Estado na solução dos conflitos trabalhistas coletivos, e a Justiça do Trabalho se limitaria à nova função de arbitragem pública”, diz o texto.

Joílson, da CTB, explica que a ideia da campanha é que o Estado brasileiro fortaleça o diálogo entre patrões e empregados na busca de soluções para impasses trabalhistas. “Na medida em que você investe na negociação coletiva, os litígios trabalhistas começam a diminuir”, explica. “Isso já acontece hoje, mas de uma forma muito prejudicada pela pouca cultura de diálogo que temos. Queremos que vá parar na Justiça apenas aquilo que realmente não tem solução, como última instância.”

Quanto ao papel da Justiça do Trabalho como protetora dos trabalhadores na relação patrão-empregado, assegurando condenações às empresas que descumprem a lei, muitas delas com fim didático, restituindo direitos, Joílson acredita que os tribunais devem seguir desempenhando suas funções. “Na questão dos direitos individuais, a Justiça do Trabalho continuará cumprindo seu papel.”

Ao comentar a divisão do movimento sindical entre os três principais candidatos à Presidência, Salim, da UGT, afirma que não há nenhum presidenciável que defenda integralmente a agenda dos trabalhadores. E reconhece, sem revelá-los, a existência de pontos que o desagradam no programa de Marina. “Há temas que queremos discutir. Qual presidente fez tudo 100% para os trabalhadores?”

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