Insegurança nas escolas

Especialistas pedem revogação de aulas presenciais obrigatórias em São Paulo

Escolas estaduais e privadas devem recebem a partir desta quarta todos os alunos sem o protocolo de distanciamento. Em carta aberta, pesquisadores e instituições advertem para os riscos da flexibilização

Rovena Rosa/EBC
Rovena Rosa/EBC
De acordo com as autoridades, a volta às aulas presenciais deveria acontecer com o cumprimento de "condições mínimas", que não estão sendo respeitadas pelo Estado

São Paulo – Em uma carta aberta, divulgada no último domingo (31), um grupo de 53 especialistas de 19 instituições e 3 redes nacionais de pesquisadores em saúde pública e educação recomendou ao governo de João Doria (PSDB), em São Paulo, que seja revogada a decisão que tornou as aulas presenciais obrigatórias, a partir desta quarta-feira (3), para 100% dos alunos da rede pública e privada, sem os protocolos de distanciamento físico. 

O documento lista pelo menos 19 riscos por trás das medidas de flexibilização que tornam as aulas presenciais neste momento “um grande equívoco”. De acordo com as autoridades, a volta às aulas presenciais deveria acontecer com o cumprimento de “condições mínimas”, que não estão sendo respeitadas pelo estado. Entre elas, o distanciamento de 1,5 metro entre os alunos, o uso obrigatório de máscaras do tipo PFF2 e reformas estruturais das unidades escolares. Assim como um plano de testagem e aumento de funcionários administrativos devidamente capacitados para dar suporte e monitoramento para garantir um ambiente seguro. 

A Rede de Pesquisa Solidária – Políticas Públicas e Sociedade; o professor e dirigente da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara; a coordenadora do projeto Direitos na Pandemia, Deisy de Freitas Lima Ventura; e o coordenador da Rede Análise Covid-19, Isaac Schrarstzhaupt, são alguns dos nomes que assinam a carta. A iniciativa foi organizada pelo Movimento Famílias pela Vida, que reúne mães, pais e responsáveis por estudantes do ensino público do estado. Preocupados com a segurança sanitária da comunidade escolar, o grupo vem tentando estabelecer um diálogo com o governo Doria. 

Relatos de insegurança e medo

Na última sexta (29), eles protestaram em frente à secretaria de educação, no centro da cidade de São Paulo, para apresentar as demandas do movimento. Segundo o grupo, no entanto, o secretário se negou a recebê-los. E, no lugar, enviou um pedaço de papel com o email de contato escrito à mão para que os responsáveis escrevessem a ele. A postura de Rossieli foi vista como uma forma de “escárnio” pelo Movimento Famílias pela Vida, que protocolou uma ação popular no Ministério Público.

Secretário Rossieli Soares se negou a receber o movimento e enviou um pedaço de papel com o email de contato escrito à mão para que as mães e os pais escrevessem a ele

Leia mais: Pais se opõem a volta às aulas sem rodízio de alunos em São Paulo

Os relatos de medo e insegurança estão baseados principalmente na falta de recursos humanos. Eles se queixam da ausência de um monitoramento da qualidade do ar e testagem, e da lotação das salas de aula, sem distanciamento. A preocupação dos responsáveis é também com as crianças menores de 12 anos que ainda não estão no plano de vacinação. 

Na última semana, a Rede de Pesquisa Solidária divulgou nota técnica, alertando que a falta de imunização e o retorno às aulas presenciais podem colocar essa população em maior risco para a covid-19. De acordo com o IBGE, as crianças de 0 a 11 anos representam 16,6% do total de habitantes no país. O equivalente a 35,2 milhões de brasileiros. Os especialistas também advertem para o risco de covid longa, com efeitos a longo prazo já documentados para crianças e adolescentes. 

Os dados da pandemia

“Acreditamos que não há justificativa educacional, social ou sanitária para o retorno obrigatório de 100% dos alunos neste momento. Neste momento, as crianças de menos de 12 anos são um dos grupos mais vulneráveis, pois não foram vacinados”, observa uma das integrantes do Famílias pela Vida, também mãe de um aluno da rede pública, Thalita Pires. 

O governo de São Paulo, por outro lado, alega que o avanço da vacinação e as condições atuais da pandemia no estado permitem a retomada. Segundo dados da secretaria, 97% dos profissionais da educação estão com o esquema vacinal completo. E até 96% dos adolescentes de 12 a 17 anos já tomaram a primeira dose. “O que fortalece a manutenção das medidas”, argumenta o estado. A obrigatoriedade da volta às aulas também não se aplica a crianças e adolescentes com comorbidades ou que pertençam aos grupos de risco para a covid-19, gestantes ou puérperas, que devem comprovar a condição com atestado médico para poder permanecer no ensino remoto.

Prioridades

Em entrevista nesta quarta ao canal da Globonews, Rossieli Soares também sustentou que “se não voltarmos as crianças para as salas de aulas não temos como falar em recuperação”.

A menos de um mês para o encerramento do ano letivo, a avaliação dos responsáveis e pesquisadores é que da forma que está sendo feita “esse retorno não vai resolver os desafios dos alunos, nem o problema do abandono e da evasão escolar. Para isso, é necessário um planejamento de longo prazo, realizado de forma multidisciplinar e com protocolos mais seguros para proteger a comunidade escolar”, frisa Thalita. 

O documento também cobra do governo estadual prioridade na produção dos documentos exigidos pela Anvisa para a inclusão das crianças menores de 11 anos entre as pessoas que podem receber a CoronaVac no Brasil. Nesta terça (2), a diretora do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, Rochelle Walensky, deu apoio ao uso da vacina da Pfizer-BioNTech contra a covid-19 em crianças de 5 a 11 anos. A decisão abre caminho para que a imunização do grupo comece imediatamente no país. 

De acordo com a Reuters, a Pfizer também pediu autorização da Anvisa para aplicar a vacina nas crianças de 5 a 11 anos. Atualmente, o imunizante é o único aprovado para idades de 12 a 17 anos no Brasil.