Sem pressa

TJ suspende liminar que obrigava a prefeitura de São Paulo a entregar tablets a alunos em 10 dias

Decisão é “absurda” na avaliação de familiares de estudantes que entraram com recurso para garantir a distribuição dos equipamentos, prometida para dezembro

Ag. Senado/Reprodução
Ag. Senado/Reprodução
Para a covereadora Silvia Ferraro, governo Covas está atrasado por conta de "desorganização e desprezo total. Eles preferiram recorrer de uma decisão que era justa, do que acelerar a entrega", critica

São Paulo – O desembargador Nogueira Diefenthäler, da 5ª Câmara do Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, cassou a liminar que obrigava a prefeitura de São Paulo a distribuir, dentro de 10 dias, todos os tablets e chips adquiridos para reforçar a educação a distância durante a pandemia. 

Em decisão provisória do dia 26 de abril, o juiz Luís Antonio Nocito Echevarria, atendendo a um pedido de urgência da Bancada Feminista do Psol na Câmara Municipal e do movimento Famílias pela Vida – que reúne familiares de estudantes do ensino público – determinou o prazo que se encerraria já nesta semana. O magistrado considerou que a ausência dos equipamentos estaria “comprometendo o direito à educação, em tempos de necessário isolamento social”.

Antes mesmo de garantir a entrega, no entanto, a prefeitura de São Paulo interpôs um agravo de instrumento contra a decisão, que foi acolhido nesta segunda-feira (10) pelo desembargador. O TJ-SP considerou o argumento do governo Covas, de que seria necessário um período maior, e suspendeu os efeitos da liminar, desobrigando o município de entregar os tablets com chips ainda nesta semana. De acordo com o magistrado, a distribuição tal como determinada em primeiro grau, poderia causar prejuízos financeiros ao ente público.

Atendendo a prefeitura

Diefenthäle considerou como relevantes as alegações da prefeitura para justificar a não entrega dos tablets por questões de ordem administrativa, que envolve o fornecimento dos equipamentos, e técnica, referentes a configuração dos tablets. Segundo o desembargador, o prazo de entrega não se iniciou com a assinatura do contrato, em 19 de novembro de 2020. “Mas com a emissão de ordem de fornecimento pela prefeitura”, escreveu. “Ou seja, os tablets não estão à disposição da agravante (a prefeitura) há 3 ou 4 meses.”

O tribunal também acatou a defesa de que a entrega dos pacotes de dados para acesso à internet móvel ainda está em fase de licitação. E descreveu que, após recebidos os tablets e chips, cada um dos 465 mil equipamentos “deve ser submetido a uma série de procedimentos”. “Inserção de chips, instalação de aplicativos – como o sistema Pulsus, para localizar o aparelho –, testagem de funcionamento. O que demanda tempo”, afirmou Diefenthäle, sem contudo, especificar um prazo final. 

A distribuição dos tablets com acesso à internet havia sido prometida pela gestão Covas para dezembro do ano passado. Mas foi postergada para o final de abril. No último dia 20, porém, o secretário municipal de Educação, Fernando Padula, adiou novamente o prazo e a entrega foi transferida para agosto, um ano após o anúncio de compra. Os autores do pedido de urgência acusam a prefeitura de se “omitir” ao “negar o mínimo existencial” que “obstaculiza o acesso à educação”. À RBA, o movimento Famílias pela Vida confirmou que recorreu da decisão nesta quinta (13). 

Suspensão da liminar é ‘absurda’

“Essa decisão é absurda”, contestou a covereadora Silvia Ferrar,o da Bancada Feminista, em entrevista à repórter Larissa Bohrer, da Rádio Brasil Atual. “Depois de termos obtido a liminar, foi acelerada a entrega e muitas escolas inclusive já entregaram todos os tablets. Mas ao verem que não iam conseguir cumprir o prazo porque estão muito atrasados por conta de desorganização e desprezo total, preferiram recorrer de uma decisão que era justa do que acelerar a entrega com uma força tarefa que pudesse direcionar esforços para que as crianças e adolescentes tivessem acesso imediato aos tablets com internet”, lamentou a parlamentar.

TCM aponta irregularidades

Os consecutivos atrasos por parte da gestão Covas também são alvo de investigação do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCM). No final de setembro, o órgão chegou a suspender a compra devido a denúncias de irregularidades no processo de licitação. Em novo parecer, assinado em 30 de abril pela equipe de Fiscalização e Controle, o TCM emitiu recomendações à secretaria de Educação. No relatório, ele cobra que se “aprimore o processo de ativação dos tablets. Acelerando o atual cronograma e permitindo que os equipamentos sejam liberados para a distribuição aos alunos em prazo razoável, de modo a minimizar os prejuízos educacionais observados”. 

A auditoria do Tribunal já havia encaminhado em março um ofício à pasta, pedindo explicações quanto à entrega dos tablets aos alunos da rede municipal. Mas o TCM julgou as acusações de problemas na distribuição procedentes após análise de uma representação do vereador Celso Giannazi (Psol).

Com base em dados da SME, o Tribunal de Contas afirma ter chegado à conclusão de que não ocorreram atrasos por parte da fabricante dos tablets. Nesse caso, a empresa Multilaser, que teve contrato de R$ 437,5 milhões assinado para o fornecimento dos equipamentos. O TCM aponta que do total adquirido, 333.608 tablets já haviam sido entregues à secretaria até 19 de abril. O problema estaria, no entanto, no preparo dos equipamentos para a distribuição às escolas. O processo foi delegado pela prefeitura à Central IT Tecnologia da Informação Ltda. A empresa é responsável pelo serviço de aferição das características técnicas dos equipamentos, configuração inicial e preparo para uso de chip, além da adição/conferência de registro no sistema Pulsus, segundo o relatório.

Onde está o atraso

Do total de tablets entregues, até 23 de abril, o Tribunal afirma ter tido a informação de que apenas 36.790 equipamentos estavam configurados pela empresa.

“Caso seja mantido o mesmo padrão de produtividade observado no período de 05 a 16 de abril, a ativação dos equipamentos só será finalizada em 22.05.2022”, alertou o órgão de Fiscalização e Controle. “A baixa produtividade no preparo dos equipamentos para distribuição indica a existência de inadequações no planejamento e na execução de tais procedimentos por parte da SME. Sendo essa a principal causa da demora observada para a liberação da entrega dos tablets aos alunos da rede”, explicou. 

Além da configuração inicial, os tablets também precisam ser distribuídos às escolas e ter o aplicativo Claro Monitor ativado pelos profissionais das unidades educacionais. “Outro fato que contribui para o atraso na distribuição dos equipamentos aos alunos”, diz o TCM. A secretaria, ainda segundo o documento preliminar, teria informado que até 23 de abril 35 mil tablets seriam distribuídos aos alunos. O Tribunal de Contas aponta, no entanto, que até o dia 26 de abril, somente 6.735 aparelhos foram distribuídos. O equivalente a 2,01% do total de tablets já entregues nas escolas. 

Na decisão em primeiro grau, o juiz advertia que a “a cada dia que o Poder Público deixa de providenciar o acesso à educação às suas crianças e adolescentes, o dano se torna irreparável”.