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Cortes nas universidade federais são ‘colapso anunciado com calma e precisão’

Avaliação é do professor e vice-diretor da FFLCH-USP, Paulo Martins, que pede reflexão às universidades. 'Temos de mostrar para a sociedade quão equivocadas são essas medidas'

Fabio Rodrigues Pozzebom/EBC

Campus da Universidade de Brasília (UNB), uma das primeiras que serão afetadas pelos cortes no orçamento

São Paulo – O bloqueio de 30% do orçamento de dezenas de universidades e institutos federais, o ataque à área de humanidades e o cerco aos professores sob o falso argumento da “doutrinação” são algumas das medidas promovidas pelo governo de Jair Bolsonaro que representam uma “situação que beira ao ridículo”. A análise é do professor Paulo Martins, vice-diretor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP).

Em entrevista aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, na Rádio Brasil Atual, o docente criticou o desmonte, anunciado na semana passada, que deve atingir ao menos 60 universidades e 40 institutos, afetando primeiramente a UnB, em Brasília, a UFBA, na Bahia e a UFF, no Rio de Janeiro.

“O que está carecendo nesse governo é justamente uma preocupação com políticas públicas efetivas e que, efetivamente, resolvam os problemas que nós temos, e que são muitos, mas parece que eles fazem justamente o contrário”, contesta Martins.

Reportagem da RBA mostra que desde 2014 a 2018, a rede federal registra queda nos investimentos da ordem de 15%, passando de R$ 39,2 bilhões para R$ 33,4 bilhões. No entanto, é sob o governo de Bolsonaro que as instituições públicas têm encontrado uma oposição maior, que reforça uma visão crítica comum à época da ditadura civil-militar. “Essa é uma tendência já de governos autoritários no Brasil, não é de hoje”, observa o professor. “Jair Bolsonaro e sua equipe, na verdade, reproduzem um velho modelo, de desmonte, a fim de favorecer as universidades particulares”.

Não parece à toa ao professor, por exemplo, que essa relação de “favorecimento” tenha em uma das pontas a presidente da Associação de Universidades Particulares (Anup), Elizabeth Guedes, irmã do ministro da Economia, Paulo Guedes, que é também integrante do Conselho de Participação do Fundo Garantidor do Fies, programa de financiamento público para acesso ao ensino superior.  “Me parece que esse é outra relação espúria, ou seja, você colocar o lobo para tomar conta das ovelhas (…) Você vai entregar o dinheiro público aos empresários do ensino, isso me parece algo perigoso”, afirma Martins. 

Chantagem com “reforma” da Previdência

Apesar de as universidades brasileiras, principalmente as públicas, serem responsáveis pelo desenvolvimento de pesquisas no país, o governo, para promover o desmonte, se apoia em críticas ao ensino das instituições, mas também tem buscado justifica-lo como um “contingenciamento” para, no entanto, defender a “reforma” da Previdência.

“Nós esperamos que, no segundo semestre, com a aprovação da nova Previdência, a arrecadação melhore e, em consequência, esse recurso vai retornar”, argumentou o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, no sábado (4).

“Na verdade, isso é história para boi dormir, porque a rigor, é chantagem para aprovação”, rebate Martins. “Estamos diante de um colapso anunciado com muita calma e precisão pelo governo federal, e é momento de reflexão séria dentro das universidades (…) a gente tem que fazer tudo para mostrar para sociedade o quão equivocadas são as medidas”, finaliza.

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