CPI da merenda

Base de Alckmin minimiza dinheiro movimentado por ex-assessores de Capez

Segundo investigação do Ministério Público de São Paulo, Jeter Rodrigues e José Merivaldo movimentaram juntos R$ 622 mil sem origem declarada

Assembleia Legislativa

Zerbini descartou a possibilidade de Capez ter se beneficiado do esquema

São Paulo – Os deputados da base aliada do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), que compõem a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura pagamento de propina a servidores públicos e parlamentares em contratos de fornecimento de merenda escolar, minimizaram hoje (8) a revelação de que os ex-assessores do presidente da Assembleia Legislativa, deputado Fernando Capez (PSDB), movimentaram juntos R$ 622 mil sem origem declarada. O valor bate com a delação do lobista Marcel Ferreira Júlio, que atuou para a Cooperativa Orgânica da Agricultura Familiar (Coaf), pivô no esquema de corrupção. A reunião foi acompanhada por apenas quatro alunos.

Em depoimento à Justiça paulista, no final de setembro, o ex-assessor de Capez José Merivaldo foi confrontado com uma movimentação bancária de aproximadamente R$ 500 mil, de origem não declarada, utilizada para “pagar muita conta”, na afirmação do procurador que o interrogou. Somado aos R$ 122 mil encontrados na conta de Jeter Rodrigues, também ex-assessor do deputado, o valor total é compatível com a delação de Marcel, que declarou ter repassado propina da ordem de R$ 650 mil da Coaf aos servidores, sendo R$ 200 mil para Jeter e Merivaldo e R$ 450 mil para ajudar na campanha à reeleição do deputado. Nenhum dos dois soube explicar a origem e o destino do dinheiro.

Ambos já foram ouvidos na CPI e negaram ter recebido qualquer valor. Porém, os parlamentares da base do governador avaliam que não há interesse em convocá-los novamente. “Eles vão vir e vão mentir de novo”, avaliou o vice-presidente da CPI, deputado Adilson Rossi (PSB), do partido do vice-governador, Márcio França. Questionado sobre os ex-assessores de Capez terem movimentado esse montante, ele se sensibilizou com o presidente da Assembleia. “Infelizmente, ele tinha essas pessoas com ele. Todos nós estamos propensos a essa situação. O cara está lá e você não sabe o que ele faz”, afirmou.

Para o presidente da comissão, deputado Marcos Zerbini (PSDB), seria perda de tempo reconvocar os dois. “O importante é que isso conste do relatório final que será encaminhado ao Ministério Público. Não tenho dúvidas de que os dois agiram de forma ilícita, que outros servidores erraram e que a Coaf agiu para fraudar a licitação”, afirmou. Questionado sobre a possibilidade de Capez ter se beneficiado do esquema, Zerbini descartou. “Eu acho difícil. Foi um equívoco do presidente ter trazido gente que não conhecia para o gabinete dele. Mas não vejo nada nos depoimentos que possa incriminá-lo”, afirmou.

Essa convicção é semelhante à do deputado Barros Munhoz (PSDB), que chegou a sugerir a prisão de Jeter após o depoimento do ex-assessor à CPI. “A CPI tem de caminhar para a frente agora. Tenho convicção do envolvimento de servidores e dos dois”, disse. Mas, quando questionado sobre o valor da verba encontrada nas contas ser próximo ao que Marcel disse ter repassado, sendo parte para a campanha de Capez, Munhoz disse que não tinha como comentar.

lobista relatou ter ido três vezes ao escritório de Capez. E que o próprio deputado ligou na Secretaria da Educação e falou com o chefe de gabinete da pasta, Fernando Padula, sobre o fato de a Coaf ter vencido a chamada pública de 2013 e não ter sido chamada para assinar o contrato. Posteriormente, Marcel disse que foi procurado por Jeter, que informou que tudo seria resolvido, o contrato seria maior e teriam que resolver “a questão financeira”.

Quando a Chamada Pública foi concluída, Jeter o teria procurado. “Viu lá a publicação? Tudo como combinamos. Agora precisamos falar de valores. Eu quero 2% do contrato, mais R$ 450 mil para ajudar na campanha (do deputado Capez)”, teria dito Jeter, segundo o lobista. “Jeter disse que, se não honrássemos o acordo, eles bloqueariam os pagamentos do governo estadual”, relatou Marcel. O lobista disse ter efetuado todos os pagamentos e que os respectivos recibos foram entregues por ele ao Tribunal de Justiça.

Para o deputado Alencar Santana (PT), único membro da oposição na CPI, a revelação insere novos elementos na investigação e deveria ser objeto de acareação entre Marcel, Jeter e Merivaldo. “Diziam que não receberam dinheiro. Agora está demonstrado que movimentaram um valor muito próximo ao denunciado. A questão que a CPI pode ajudar a responder é: para onde foram esse R$ 622 mil”, afirmou.

Santana acredita, porém, que a base de Alckmin resolveu minar a CPI por temer as consequências dessas revelações. Um requerimento de prorrogação da CPI por 60 dias, feito pelo relator, deputado Estevam Galvão (DEM), foi mudado na hora da votação para prorrogar os trabalhos por 30 dias. Oficialmente, os deputados da base argumentaram que 60 dias ia incidir no recesso e complicar o processo.

“Na verdade, eles perceberam que a situação pode ficar insustentável, mesmo eles sendo ampla maioria na comissão. Com as denúncias que têm saído na imprensa, eles ficaram sob pressão”, avaliou Santana. A prorrogação por 30 dias foi aprovada. Amanhã estão previstas as votações de requerimentos pedindo a acareação entre os envolvidos. Santana acredita que a base de Alckmin vai votar contra.

Na manhã de hoje, a comissão ouviu servidores da Secretaria da Educação Yuri Keller, Ana Leonor Alonso e Vanessa Alves Vieira. A reunião começou com forte aparato policial dentro e fora da Assembleia, abordando quem chegava para acompanhar a reunião. O objetivo era impedir uma manifestação dos estudantes no local. Apesar do clima tenso, os depoimentos foram pouco interessantes, na opinião dos deputados.

Keller revelou que todos os contratos acima de R$ 650 mil passavam pelo avaliação da chefia de gabinete, sob responsabilidade de Fernando Padula. Em depoimento à CPI, Padula disse que não tinha contato com os processos de chamada pública da merenda escolar. Além disso, admitiu que certas irregularidades, como aceitar dois orçamentos quando o exigido por lei eram três ou prolongar o prazo para correção de pendências, eram relativamente comuns no processo.

Ana admitiu que havia uma orientação da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), para realizar alterações no edital da chamada pública por conta de irregularidades, mas tal parecer foi ignorado. Vanessa não foi ouvida, pois a maioria dos deputados deixou a reunião antes do depoimento dela, alegando outros compromissos.

Amanhã (9) a CPI vai ouvir os servidores da Secretaria da Educação. Foram convocadas Marilena de Lourdes Silva, ex-diretora do Departamento de Suprimento Escolar da Secretaria da Educação; Silvia Cristina Lancellotti Pinto, ex-funcionária do Centro de Serviços de Nutrição do Departamento de Alimentação e Assistência ao Aluno da Secretaria Estadual da Educação; e Célia Falótico, ex-coordenadora da Coordenadoria de Infraestrutura e Serviços Escolares do Departamento de Alimentação e Assistência ao Aluno da Secretaria Estadual da Educação.