luta estudantil

‘Após ocupação, relação entre professores e alunos não será a mesma’, avalia docente

Após um mês de ocupações, estudantes de São Paulo continuam nas ruas e promovem grande ato público hoje, na capital. Professora conta que movimento mostrou conscientização política e organizacional

Roberto Parizotti/Secom Cut

Para estudantes, o modelo ideal é uma escola horizontal, onde todos têm voz mais ativa

São Paulo – Um mês depois do início do movimento de ocupação das escolas da rede pública do estado de São Paulo, os estudantes secundaristas continuam nas ruas. Hoje (9), os alunos fazem nova manifestação, no Museu de Arte de São Paulo (Masp), agora voltada à defesa de educação de qualidade e de maior participação da comunidade na gestão escolar. O ato também é contra o autoritarismo do estado e os cortes do governo na educação.

Iniciadas na Escola Estadual Diadema, na região do ABC, na noite do dia 9 de novembro, as ocupações começaram com o objetivo de combater a proposta de reorganização escolar do governo estadual. A ação, no entanto, extrapolou a intenção inicial: alcançou cerca de 200 escolas, levantou a discussão sobre a qualidade do ensino nas escolas públicas, derrubou o secretário da Educação, Herman Voorwald, e fez com que o governador Geraldo Alckmin (PSDB) revogasse o decreto que instituía a reorganização escolar em todo o estado.

Os estudantes assumiram o controle das escolas ocupadas, organizaram-se em equipes (de segurança, de limpeza, de atendimento à imprensa, de alimentação, de alojamento) e passaram a deliberar as ações do grupo por meio de assembleias. No lugar das aulas, eles desenvolveram uma rotina própria nos prédios ocupados, organizando aulas públicas e cursos.

O projeto da Secretaria da Educação previa o fechamento de ao menos 93 escolas e a transferência de cerca de 311 mil estudantes para instituições de ensino na região onde moram. O objetivo da reorganização, segundo a secretaria, era segmentar as unidades em três grupos, conforme a idade e o ano escolar. De acordo com o órgão, a segmentação melhora o rendimento dos alunos.

Os estudantes ressaltam que a comunidade escolar não foi ouvida pelo governo sobre as mudanças. Eles argumentam que as alterações e transferências, se colocadas em prática, causariam a ruptura, entre outras questões, da relação que os alunos desenvolveram com colegas e prejudicariam a logística dos pais, que muitas vezes se utilizam dos filhos mais velhos para levar os irmãos mais novos para a escola.

Futuro

Depois das ocupações, as escolas públicas não serão mais as mesmas, e as relações de estudantes com os professores precisarão ser diferente daqui para frente, acredita a professora Marilena Nakano, da Fundação Santo André. Apesar da revogação da reorganização escolar feita por decreto no último sábado (5), os alunos querem outros compromissos do governador Geraldo Alckmin, como a democratização das escolas.

Em entrevista ao repórter Jô Miyagui da TVT, a professora afirma que os estudantes adquiriram a conscientização política e organizacional, e isso vai gerar tensão. “De modo geral os diretores são autoritários. De modo geral os professores também não dão espaço para os alunos. As relações atuais são de não ouvir uns aos outros, e agora, vão ter que ouvir. O que está posto no debate é a forma que adolescentes participam da gestão da escola.”

Nas escolas ocupadas, as atividades continuam, e algumas, com aulas fora do currículo escolar, o que trouxe novas perspectivas de conteúdo e forma de aprendizado.

Segundo o professor de Filosofia da rede pública de ensino Marcos Nakano, há uma necessidade de mudar a maneira de lecionar, mas ele acredita os professores ainda são apegados ao método tradicional. “Eles pensam que processo educacional devem ser dessa forma, a partir de um imposição de que esse é o melhor processo cognitivo e artístico do aluno, e eles não conseguem fazer isso.”

Os alunos não vão mais aceitar que tudo seja igual como era antes, como a luta dos estudantes é por uma escola de qualidade, eles dizem o que imaginam ser a escola ideal.

“É preciso trazerem eventos culturais, como trouxemos nesse tempo que ficamos na escola. Além dos alunos terem uma participação maior dentro das escolas”, avalia o estudante João Vitor Oliveira.

Para o estudante Douglas dos Santos, deve haver um processo de democratização das escolas. “A escola para de ser um movimento vertical, onde a direção manda, e todos devem que acatar. O modelo ideal é uma escola horizontal, onde todos têm voz mais ativa.”

“Acho que uma escola com infraestrutura para dinâmicas diferentes. Não só aquela coisa de texto, lousa, caderno e livro”, diz a aluna Beatriz Ribeiro.

A professora acredita que para a escola ideal na visão dos alunos se transformar em algo real, é preciso escutar e negociar. Mas essa é uma coisa que o governo Alckmin ainda não conseguiu fazer. “Até hoje não é capaz. Revogou, mas não é capaz de dialogar. Essa é a grande lição que esses meninos deixam. Para nós conseguirmos uma país democrático, e uma escola democrática, as pessoas devem sentar e dialogar.”

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