‘Educação inclusiva não exclui trabalho das Apaes’, afirma militante do setor

Federação das Apaes teme que mudanças no Plano Nacional de Educação acabe com repasse de verbas federais; para ativista, essas entidades devem permanecer, mas complementares à escola

Elza Fiuza/ABr

PNE prevê inclusão de todos na escola regular. Atendimento especializado, como das Apaes, deve ser complementar

São Paulo – A meta 4 do Plano Nacional de Educação (PNE), que trata da educação inclusiva, é um dos pontos mais polêmicos do projeto em tramitação no Congresso e tem preocupado sobretudo gestores de entidades como as associações de pais e amigos dos excepcionais (Apaes). Eles temem que entre as mudanças propostas pelo PNE esteja o fim do repasse do Ministério da Educação por meio do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação Básica (Fundeb). O projeto, cujo relator é o senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), está em análise na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.

Para a presidenta da Federação Nacional das Apaes, a professora Aracy Ledo, uma mudança sutil no substitutivo do senador José Pimentel (PT-CE) pode abrir caminho para o fim do financiamento federal e o consequente fechamento. Pelo relatório aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, o atendimento escolar aos estudantes com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento ou superdotação deve ser universalizado na rede regular de ensino. E não mais “preferencialmente na rede regular”, conforme o texto original do deputado Angelo Vanholi (PT-PR).

“Com essa alteração, as Apaes perderiam a prerrogativa que têm hoje de substituir a escola regular no atendimento e até vir a limitar o financiamento federal a partir de 2016”, disse Aracy. A mobilização do setor, conforme ela, é para que o texto do PNE volte a incorporar o termo “preferencialmente”.

A presidenta rebateu ainda a crítica de que em vez de trabalhar pela inclusão, as Apaes estariam segregando as pessoas com deficiência por elas atendidas. “Há muitos anos trabalhamos pela inclusão. Temos muita experiência em incluir a criança quando ela já se desenvolveu o suficiente para ser incluída na rede regular. Afinal, atendemos crianças com diferentes tipos e graus de deficiência mental.”

Na avaliação da jornalista e fundadora da organização não governamental Escola de Gente Comunicação em Inclusão, Claudia Werneck, a polêmica não faz sentido. “Vivemos hoje avanços nos direitos das pessoas com deficiência. É uma grande conquista do país uma política de educação inclusiva que completa 12 anos, que aumentou a inserção dessas pessoas na escola. E nesse tempo todo as Apaes não foram excluídas”, disse. Para a ativista, a desinformação ou manipulação podem estar por trás da celeuma.

A professora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e especialista em educação inclusiva Maria Teresa Egler Mantoan defende que os alunos da chamada educação especial tenham garantido o seu direito de serem escolarizados em escola comuns, como disposto na Constituição Brasileira e na Convenção da ONU sobre o Direito das Pessoas com Deficiência.

“O repasse de recursos para as Apaes é um outro assunto, que tem de ser discutido a partir do novo papel que essas entidades e atividades congêneres deverão assumir, que é o atendimento clínico aos alunos da educação especial e, principalmente, a salvaguarda dos direitos, inclusive o da própria educação escolar inclusiva a seus assistidos conforme proclama a nossa lei maior”, afirmou. “O problema é que os dirigentes e políticos que se encarregam dessas instituições apelam, misturam o direito à educação inclusiva a repasse de verba. E isso tem de ter um fim.”

A professora da Unicamp afirmou perceber cada vez mais que essas instituições não estão preocupadas ou mesmo em busca de se adequarem à Política Nacional de Educação Especial, “mas lutando para se manterem como estão, assim como seus interesses financeiros. E estão jogando pesado, envolvendo e expondo seus próprios assistidos para não perderem seus privilégios”.

Segundo o MEC, o objetivo é a construção de uma política educacional com o apoio de todos, inclusive das Apaes, que não vão deixar de existir. E que esse modelo de educação seja apoiado por entidades especializadas no atendimento de pessoas com deficiência, como a Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down e União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), entre outras.

O atendimento educacional especializado (AEE) de que trata o artigo 208, inciso 3° da Constituição Federal é complementar ou suplementar à escola regular. Esse serviço atende tanto a estudantes com deficiência ou transtornos gerais do desenvolvimento como estudantes com altas habilidades ou superdotação.

Ainda segundo o ministério, como o Brasil é signatário da Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que desde 2008 tem força de norma constitucional, estão sendo criadas políticas que garantam igualdade de oportunidades às pessoas com deficiência, inclusive na escola, assegurando o chamado sistema educacional inclusivo em todos os níveis. Mas não há legislação a respeito do atendimento especial substitutivo à educação escolar na rede regular.

Assim, o atendimento de estudantes com deficiência precisa ser feito de maneira integrada, por meio de ações que proporcionem o pleno desenvolvimento dessas pessoas, como o duplo financiamento por meio do Fundeb, conforme o número de matrículas dos estudantes com deficiência nas escolas regulares e no atendimento educacional especializado em turno complementar à escola, como prevê a Declaração Universal dos Direitos Humanos e outras convenções compartilhadas pelos países membros das Nações Unidas.

Segundo o Censo Escolar, em 1998 somente 337.326 estudantes com deficiência estavam matriculados na rede de ensino da educação básica. Em 2012, havia 820.433.