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Haddad diz que nota do Copom é ‘preocupante’. Rui Costa: ‘BC é insensível’

Ministro da Fazenda discorda de comunicado do Copom que fala em “incertezas”. Com ele, chefe da Casa Civil também critica manutenção da taxa de juros em 13,75%

Fabio Rodrigues Pozzebom e Antonio Cruz/Abr
Fabio Rodrigues Pozzebom e Antonio Cruz/Abr
Ministros mostram que governo discorda de "independência" do Banco Central, que impõe política monetária que trava projeto econômico para o país

São Paulo – O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, classificou como “muito preocupante” o comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), que ontem (22) apontou a possibilidade de novas altas dos juros no futuro. O ministro comentou a decisão do comitê de manter a taxa de juros básicos da economia em 13,75% ao ano. “No momento em que economia está retraindo, o Copom chega a sinalizar uma subida da taxa de juros. Lemos com muita atenção, mas achamos que realmente o comunicado preocupa bastante”, declarou.

“O comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”, diz o texto divulgado pelo BC para justificar a decisão pela manutenção da atual política monetária.

Haddad se disse surpreendido com o comunicado, justamente quando o governo fez recente demonstração pública do compromisso em reequilibrar as contas públicas. As novas estimativas apontam aumento nas receitas e redução do déficit primário em relação ao valor sancionado no Orçamento.

Contrariado

Segundo o ministro, o relatório deveria ter sido razão suficiente para o comitê iniciar um processo de flexibilização da política monetária. Porém, contrariando as expectativas, o comunicado do BC veio em tom ainda mais duro. “Eu considerei o comunicado preocupante, muito preocupante. Porque hoje divulgamos relatório bimestral mostrando que nossas projeções de janeiro estão se confirmando sobre as contas públicas”, afirmou.

Haddad reiterou que os juros altos travam o crédito e, por consequência, a atividade econômica. E disse ainda que no mês que vem a pasta enviará medidas para reverter a situação. “Devemos mandar ainda em abril para a Casa Civil um conjunto de medidas para melhorar o ambiente de crédito.”

Harmonia

O ministro disse que repassará as constatações sobre o tom do comunicado do Copom nas próximas reuniões institucionais com o presidente do BC, Roberto Campos Neto. Apesar das divergências com a autoridade monetária, Haddad disse que a relação entre o Ministério da Fazenda o BC deve ser de harmonia e que continuará a ser pautada pela institucionalidade.

“Falei em harmonia desde a primeira entrevista e vou continuar perseverando com esse objetivo. Nunca faltei com respeito com diretor ou com presidente do Banco Central”, afirmou Haddad. “Nós temos relação institucional [com o Banco Central]. Somos órgãos de Estado. Temos satisfação a dar para a população. O BC tem mandato. A lei é clara a respeito dos objetivos do BC”, completou.

Rui Costa

Por sua vez, o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, não poupou críticas ao BC e ao seu presidente. Em entrevista aos veículos da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), também na noite de ontem, Costa chamou o resultado da reunião do Copom de “insensibilidade”.

O ministro afirmou que não era só o governo que esperava e queria uma redução na Selic, mas também é “o que povo brasileiro espera”. “Essa insensibilidade do Banco Central só aumenta o desemprego e aumenta o sofrimento do povo brasileiro. Não dá para compreender essa decisão”, criticou.

Rui Costa questionou os motivos de manter um patamar de juros adotado inicialmente em tempos de inflação no patamar de 10%. Porém, os últimos dados da inflação fecharam em 5,6% no acumulado de 12 meses. “Como você mantém a mesma dosagem amarga do remédio quando a inflação já caiu na metade?”

O ministro acrescentou que “quando cai a taxa de juros fica mais fácil para o povo consumir, fica mais fácil para o empresário poder investir na agricultura, no comércio, na indústria”, ao manifestar sua contrariedade pela decisão do BC. “Hoje o juro do Brasil é o maior do mundo. Nada se explica, não tem razão econômica, a não ser outra motivação, que eu não sei qual é” .

Autonomia para quem?

A decisão de ontem do Copom também provocou no ministro da Casa Civil novos questionamentos sobre a autonomia do Banco Central. Para Costa, a questão deve ser debatida por deputados federais e senadores.

“Acho que o Congresso Nacional, que é a casa do povo brasileiro, precisa discutir isso seriamente. Um Banco Central independente não pode ser independente do povo e aliado dos que cobram os juros nas alturas. Acho que o Congresso precisa refletir. É insustentável essa teimosia e esse desserviço que o presidente do Banco Central está fazendo com o povo brasileiro”.

A autonomia do Banco Central entrou em vigor em fevereiro de 2021, após ser aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pelo governo de Jair Bolsonaro. A lei de independência tem como principal mudança a adoção de mandatos de quatro anos para o presidente e diretores da autarquia federal. Esses mandatos ocorrerão em ciclos não coincidentes com a gestão do presidente da República.

BC incerto

No comunicado em que discorre sobre a decisão de não reduzir a taxa básica de juros da economia, o Copom alega incertezas sobre o ambiente internacional, com bancos em problemas nos Estados Unidos e na Europa e com a inflação persistente em um grande número de países.

Afirma também que a economia brasileira segue em desaceleração, com a inflação acima do teto da meta. O texto menciona incertezas em relação ao futuro arcabouço fiscal em elaboração pelo governo, mas elogia a recente reoneração parcial da gasolina e do etanol.

“Por um lado, a recente reoneração dos combustíveis reduziu a incerteza dos resultados fiscais de curto prazo. Por outro lado, a conjuntura, marcada por alta volatilidade nos mercados financeiros e expectativas de inflação desancoradas em relação às metas em horizontes mais longos, demanda maior atenção na condução da política monetária”, destacou o comunicado.

Contudo, Haddad afirma que o Brasil está numa situação diferente das principais economias internacionais, o que não justifica um aumento da taxa Selic neste momento, mesmo com o Federal Reserve (FED, o banco central norte-americano) tendo elevado os juros básicos em 0,25 ponto percentual, também ontem.

Com reportagens da Agência Brasil


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