O resultado

Petrobras ‘surpreende’ e vai pagar R$ 87,8 bilhões de dividendos aos acionistas

Pesquisador do Ineep chamou de “butim” o montante bilionário entregue principalmente a investidores estrangeiros, enquanto a maioria da população sofre com a alta dos derivados

Agência Petrobras/Divulgação
Agência Petrobras/Divulgação
Dividendos pagos nos dois primeiros trimestres deste ano já superam os R$ 101,4 bilhões do ano passado

São Paulo – A Petrobras anunciou nesta quinta-feira (28) que vai distribuir R$ 87,8 bilhões em dividendos aos acionistas. O valor é referente ao lucro da empresa no segundo trimestre deste ano. E trata-se de um novo recorde, superando R$ 48,5 bilhões que a empresa distribuiu aos acionistas no trimestre anterior. Mais do que isso, os valores somados atingem a marca de R$ 136,3 bilhões, e superam os R$ 101,4 bilhões que a empresa distribuiu aos acionistas no ano passado.

Esse valor supera inclusive as estimativas do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), que havia calculado entre R$ 47 bilhões e 58 R$ bilhões os dividendos a serem pagos nesse trimestre.

Isso porque a Petrobras registrou lucro líquido de R$ 54,3 bilhões no segundo trimestre deste ano. É um avanço de 26,8% em relação ao segundo trimestre do ano passado. Assim, nos primeiros seis meses deste ano, a estatal registrou um ganho de R$ 98,891 bilhões, alta de 124,6% em relação ao mesmo período de 2021.

É o maior valor trimestral desde o quarto trimestre de 2020, quando registrou ganho de R$ 59,89 bilhões. O resultado entre abril e junho veio R$ 40,4 bilhões acima do projetado pelo mercado.

Na conta da população

Como antecipou o Ineep, no entanto, os “superlucros” resultam da alta dos preços dos combustíveis no mercado interno, que respondem por 74% dos lucros totais da companhia. Na comparação com o segundo trimestre do ano passado, o preço médio dos derivados vendidos pela estatal teve alta de 55%.

Essa brutal elevação é resultado da política de Preço de Paridade Internacional (PPI), que a Petrobras vem aplicando desde 2016. Assim, a companhia repassa as variações do petróleo no mercado internacional – com cotação em dólar – diretamente ao consumidor brasileiro. Além disso, o PPI também considera custos de logística para importação que são inexistentes.

Butim

O economista Eduardo Costa Pinto, vice-diretor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE-UFRJ) e pesquisador do Ineep, chamou de “butim” os bilhões entregues pela estatal. Isso porque a maior parte – R$ 35,5 bi – vai parar nas mãos de acionistas estrangeiros. Outros R$ 32,5 bilhões ficam para o governo brasileiro, e R$ 20,7 bilhões, para os acionistas privados nacionais.

Em apenas um trimestre, o valor entregue pela Petrobras aos acionistas representa 20,5% do valor de mercado da empresa, comparou Costa Pinto. Ele ainda ironizou as recente reduções no preço da gasolina, quando comparado ao lucro dos investidores. “A Petrobras reduziu em 0,15 centavos o litro da gasolina e distribuiu R$ 6,73 para os detentores de uma ação”.

Encolhimento

Outra faceta do “butim” é o encolhimento da Petrobras. No trimestre passado, os investimentos totais da Petrobras somaram R$ 9,2 bilhões. Assim, a participação da estatal na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) – índice que mede os investimentos totais no país – ficou em apenas 2,2%, menor nível da série histórica. Nos dois anos anteriores, esse índice ficou em 3,8%. Para efeitos de comparação, em 2009, a Petrobras chegou a responder por 11,1% dos investimentos no Brasil.

A política de desinvestimento, em benefício dos acionistas, vem desde 2016, quando começou a ser aplicado o PPI. De lá para cá, a Petrobras privatizou duas refinarias – a Refinaria Isaac Sabbá (Reman), no Amazonas, e a refinaria Landulpho Alves (Rlam). Também vendeu a BR Distribuidora, a Transportadora Associada de Gás (TAG), dentre outros ativos importantes. O governo Bolsonaro insiste em vender outras três refinarias, ainda antes das eleições.

Tudo isso em nome da ampliação dos lucros dos investidores privados, enquanto a população sofre com a falta de uma política energética autônoma, que permitira reduzir os preços dos combustíveis no país. Apesar da reduções no preço da gasolina anunciadas recentemente pela Petrobras, o combustível acumula alta de 147,3% durante o governo Bolsonaro.

Já o preço do diesel, que não foi afetado pelo teto do ICMS, mantém trajetória contínua ascensão, custando acima de R$ 7 em todos os estados do país, de acordo com levantamento da Agência Nacional de Petróleo (ANP). Assim, o combustível superou o preço da gasolina, situação inédita na história do país.

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Com CartaCapital