Era Bolsonaro

PEC dos Combustíveis é solução eleitoreira para problema econômico estrutural

Privatização fatiada da Petrobras e política de Temer e Bolsonaro, ancorada no mercado externo, provocam explosão dos preços de gasolina e diesel

Divulgação/Petrobras
Divulgação/Petrobras
É preciso discutir a recuperação de uma empresa integrada, que atue em várias etapas da produção

São Paulo – A chamada PEC dos Combustíveis, que o Palácio do Planalto está elaborando a pretexto de conter a alta descontrolada dos combustíveis, é uma tentativa de solução política e eleitoreira, enquanto o problema concreto é econômico e estrutural. A proposta de emenda à Constituição, com que Bolsonaro quer reduzir ou “zerar” impostos sobre gasolina e diesel, encontra resistências até entre membros do governo. Mas, neste caso, por ofender os princípios neoliberais do ministro da Economia, Paulo Guedes.

O economista Guilherme Mello, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), observa que a questão é delicada. Isso porque o custo de cortar tributos para reduzir o preço na bomba é alto tanto para os governadores como para a União. E o sacrifício de abrir mão da arrecadação não proporcionaria um beneficio tão significativo para o consumidor.

Na opinião de Mello, seria necessário discutir uma nova política de preços, que até poderia envolver uma questão tributária, mas, fundamentalmente, precisaria pensar formas de estabilização frente à volatilidade dos preços internacionais da taxa de câmbio e do próprio petróleo. Uma ideia, lembra o professor, seria criar um fundo de estabilização, como proposto no Projeto de Lei 1.472/21, do senador Rogério Carvalho (PT-SE).

A proposta, cujo relator é o senador Jean Paul Prates (PT-RN), cria um imposto sobre a exportação de petróleo bruto, que alimentaria o Fundo de Estabilização. Desse modo, os preços internos praticados por produtores e importadores teriam como referência as cotações médias do mercado internacional, os custos internos de produção e os custos de importação.

Acionistas comemoram

A PEC dos Combustíveis que o governo pretende apresentar pode incorporar a ideia de um fundo, mas não se sabe ainda como seria a sistemática. Desde 2016, com o governo Temer, o preço dos combustíveis pago pelos brasileiros é atrelado ao dólar e reajustado de acordo com o mercado internacional. A política, hoje, não é por acaso: ela favorece os acionistas, que auferem lucros bilionários com a alta dos combustíveis.

Guilherme Mello chama a atenção para o fato de que, com o desmonte ou privatização fatiada da Petrobras, também desde Temer, e a venda da área de refino e distribuição, reduziu-se a capacidade da estatal de fazer preço. “Estruturalmente, para recuperar essa capacidade teria que se discutir o que se quer da Petrobras. Uma recuperação de uma em´presa integrada, que atue em várias etapas da produção: refino, distribuição. As pessoas esquecem da questão estrutural.”

Contra a agenda ambiental

Além disso, zerar impostos “vai totalmente contra a agenda ambiental contemporânea, ao baratear um combustível fóssil, poluente, quando os principais países do mundo estão discutindo baratear as alternativas verdes e encarecer as poluentes”, acrescenta.

O relator do projeto no Senado também observa a questão. “Tratar somente de ‘zerar impostos’ não é suficiente, e ainda significa subsidiar combustíveis fósseis com receita governamental geral”, diz Jean Paul em mensagem de texto. Para ele, “zerar impostos meramente não é solução, e sim provocação para iniciar nova querela com os governadores. O governo não parece querer resolver o problema, apenas propor algo impossível para jogar a culpa nos Estados e no Senado”.