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Biden aposta no papel do Estado. Brasil vai na contramão

Em “Bidenomics nos Trópicos”, os economistas André Roncaglia e Nelson Barbosa reúnem especialistas que analisam o plano estadunidense para reerguer a economia e combater a crise ambiental

Adam Schultz/White House
Adam Schultz/White House
Biden aposta em "empregos verdes" para estimular a economia e reduzir desigualdades

São Paulo – Recém-lançado, o livro Bidenomics nos Trópicos (FGV Editora) analisa a iniciativa do governo do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que lançou o maior pacote de estímulos econômicos da história recente. O Plano Biden, como ficou conhecido, representa a maior guinada dos últimos 40 anos, abandonando o ideário neoliberal e dotando uma linha keynesiana. Para enfrentar os impactos da pandemia e da emergência climática, o governo aposta em planejamento estatal para modernizar as bases produtivas do país. Outra marca é o fortalecimento do mercado interno, com o objetivo de criar melhores empregos e reduzir as desigualdades sociais.

De acordo com o economista André Roncaglia, professor da Unifesp e pesquisador associado do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), o Brasil vai na contramão, apostando no “desmantelamento” das estruturas estatais.

O livro, organizado por ele e pelo ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa, é uma tentativa de destravar o debate a respeito da atuação do Estado como instância de planejamento econômico. Trata-se de desenvolver e resgatar mecanismos que permitam ao Brasil lidar com os desafios dos novos tempos. Segundo ele, a próxima crise “já chegou”. “É a crise ambiental e ecológica, do nosso modo de vida”, afirmou.

Em entrevista a Glauco Faria, para o Jornal Brasil Atual, nesta segunda-feira (27), Roncaglia disse que é preciso “fechar as portas ao passado”. Enquanto o mundo avança, o governo Bolsonaro segue “passando a boiada”, prejudicando as possibilidades do país de atrair investimentos econômica e ambientalmente responsáveis.

“A crise chegou e não temos um plano. Porque plano é uma palavra que o pessoal do governo abomina. Acham que tudo o que puderem tirar do Estado, vai ser melhor. Mas o resultado está aí, taxa de câmbio nas alturas, preço das commodities nas alturas. E, em vez de nos beneficiar, está causando fome aqui dentro”, frisou.

Destruição do Estado

Para Roncaglia, é preciso que o governo Bolsonaro seja interrompido “o quanto antes”, “para não agravar os problemas de desmantelamento da capacidade estatal”. O caso mais emblemático, segundo ele, é a Petrobras. Antes “integrada”, a empresa tinha capacidade de estruturar toda a cadeia de óleo e gás, da exploração, produção e distribuição, passando por pesquisas de energias renováveis. Hoje, serve apenas para “extrair valor” em prol dos acionistas minoritários. Outro exemplo é o BNDES, que deixou de financiar grandes projetos.

Terceira via?

O economista também criticou representantes da chamada “terceira via“, que se apresentam como alternativa a Lula e Bolsonaro, mas apoiam o projeto de desmantelamento do Estado em curso pelo atual governo. Como exemplo, ele citou especificamente o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e o ex-ministro da Saúde Henrique Mandetta. Ambos, segundo ele, posam como defensores do SUS e das vacinas, mas atuaram para enfraquecer órgãos públicos como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Instituto Butantan.

“Não podemos cair nesse conto da carochinha. A partir do momento em que ganharem o poder e a ameaça da pandemia for embora, a gente vai voltar a desmantelar essas capacidades. O resultado é que a população vai ficar nas mãos do ‘vai e vem’ do mercado, a desigualdade vai aumentar e a pobreza não vai diminuir, a não ser brevemente, se houver uma política efetiva de proteção social”, criticou.

Assista à entrevista

Redação: Tiago Pereira