Escassez de tudo

Ministro admite gravidade da crise hídrica e volta a pedir redução de consumo. Aneel aumenta a conta

Bento Albuquerque pede esforço da população e empresas, mas não apresenta planos para recuperação de mananciais e rios, nem fala da volta do horário do verão. Nova bandeira tarifária vai aumentar despesa em quase 7%

Reprodução - CC.0 Wikimedia
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Bento Albuquerque volta à rede nacional para pedir mais esforços da população como forma de suprir a ausência de uma politica energética do governo Bolsonaro

São Paulo – Em pronunciamento em rede nacional de rádio e televisão na noite desta terça-feira (31), o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, voltou a pedir esforço da população para reduzir o consumo de energia, ao anunciar que “a condição hidro-energética do país se agravou”. E deu alguns exemplos: “desligando luzes e aparelhos que não estão em uso, aproveitando mais a luz natural, reduzindo a utilização de equipamentos que consomem muita energia como chuveiros elétricos, condicionadores de ar e ferros de passar”. Ele já havia feito um pronunciamento semelhante, em junho, pedindo aos brasileiros que poupassem energia e água para enfrentar a crise hídrica.

Em sua fala, Bento citou várias vezes a necessidade de a população conter o consumo de energia, acenando com compensações em forma de futuros descontos na conta de luz. Porém, o ministro não anunciou medidas de planejamento para a recuperação dos mananciais do país, limitando-se a responsabilizar a falta de chuvas pela crise hídrica. “O período de chuvas na região Sul foi pior que o esperado. Como consequência, os níveis dos reservatórios de nossas usinas hidrelétricas das regiões Sudeste e Centro-Oeste sofreram redução maior do que a prevista”, afirmou. “Necessitaremos recuperar nossos reservatórios. Isso vai levar tempo, pois dependemos, além do empenho de todos nós, também, das chuvas. É por isso que, nesse momento de escassez, precisamos, mais do que nunca, usar nossa água e nossa energia de forma consciente e responsável”, completou.

Planejamento zero

Bento também não deu sinais de que o governo pretende retomar o horário de verão, como forma de poupar o consumo de energia nos chamados horários de pico. Em abril de 2019, ignorando os alertas de que a economia resultante do período era importante, o presidente Jair Bolsonaro extinguiu a medida por decreto, afirmando, entre outras “justificativas”, que o fim do período aumentaria a produtividade do trabalhador.

Ainda que o ministro não tenha usado a palavra racionamento em seu discurso, a expectativa é de piora na situação, com medidas restritivas inevitáveis para os próximos meses. A previsão é de que os reservatórios das usinas hidrelétricas do Sudeste e Centro-Oeste cheguem ao fim de setembro com 15,4% da capacidade, volume menor do que o registrado na crise de 2001.

Impacto na conta

O pronunciamento de Bento de Albuquerque foi feito no mesmo dia em que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou a criação de uma nova bandeira tarifária, batizada de “bandeira da escassez hídrica”. Ela estabelece uma taxa extra de R$ 14,20 para cada 100 kWh consumidos. Segundo os primeiros cálculos, a medida provocará um aumento médio de 6,78% nas contas de energia. O valor é 49,6% mais alto que a atual bandeira vermelha de patamar 2, de R$ 9,492 a cada 100 kWh consumidos. A nova bandeira começa a ser cobrada já nesta quarta-feira (1), e deve ser mantida até abril de 2022.

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Ao comunicar oficialmente a mudança, a Aneel mencionou também um grande déficit de arrecadação e destacou os custos elevados para a produção de energia, especialmente a proveniente de termelétricas. “Tendo em vista o déficit de arrecadação já existente, superior a R$ 5 bilhões, e os altos custos verificados, destacadamente de geração termelétrica, foi aprovada determinação para que a Aneel implemente o patamar específico da Bandeira Tarifária, intitulado Escassez Hídrica”, disse a agência, em nota.

O acionamento desse tipo de usina, considerada por especialistas e ambientalistas a pior opção possível entre as que o governo poderia lançar mão, veio nos últimos meses, no contexto da crise hídrica, que precede o período de menores índices de chuva no país.