Bom senso

Com disparada da ‘inflação do aluguel’, saída é negociar, indicam imobiliárias e inquilinos

IGP-M em 12 meses supera os 37%. Aumento médio do aluguel em São Paulo fica bem abaixo desse índice, mas há mais imóveis vagos

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Inflação de quase 40% assusta inquilinos, que tentam negociar percentuais menores para reajustar contratos de aluguel

São Paulo – Na semana passada, a Fundação Getúlio Vargas (FGV) informou que o Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M), que ainda é usado como referência em contratos de aluguel subiu 4,10% em maio. Com isso, atingiu 14,39% de variação no ano e 37,04% em 12 meses. O índice anual, o maior da série histórica (iniciada em 1994), é seis vezes maior que o da inflação oficial, o IPCA (6,76%). Por isso mesmo, o alarme desta vez vem com mais força. Mas até mesmo imobiliárias estão admitindo que o melhor, neste momento de pandemia e queda na renda, é negociar caso a caso. A chamada Lei de Locações não prevê um índice específico.

“Se o imóvel é ocupado por um bom inquilino, que sempre cumpriu em dia suas obrigações contratuais, o proprietário vai preferir negociar a ter seu imóvel vazio e arcar com os custos de manutenção como condomínio e IPTU. E, ainda, ter de buscar um novo inquilino”, afirma Adriano Sartori, vice-presidente do Secovi-SP, sindicato do setor imobiliário. Segundo ele, boa parte dos proprietário tem o aluguel como renda familiar ou complemento de aposentadoria, por isso não consegue dispensar o reajuste. “Portanto, é importante a negociação.”

Índice ligado ao câmbio

Em maio do ano passado, o IGP-M acumulado estava em 6,51%, próximo do atual IPCA. Começou a desgarrar em setembro, superando os dois dígitos, e não parou mais. A FGV afirma que se trata de indicador ligado à produção, bastante sensível ao câmbio (desvalorização do real em relação ao dólar) e preços de commodities. Já o IPCA, calculado pelo IBGE, coleta apenas preços de produtos ao consumidor interno.

Três índices compõem o IGP-M. Neste mês, o IPA (preços ao produtor), que responde por 60% do total, variou 5,23%. Sob “forte influência” dos aumentos de três commodities: minério de ferro, cana de açúcar e milho. Esses três itens responderam por 63% do IPA de maio, que em 12 meses acumula alta de 50,21%.

Pesquisa do Secovi-SP mostra que aumento do aluguel permanece abaixo da inflação medida pelo IGP-M, índice calculado pela FGV

Já o IPC (preços ao consumidor), responsável por 30% do IGP-M, mostra resultados bem mais próximos do IPCA: 0,61% em maio e 7,36% em 12 meses. Já o INCC (custo de construção), que tem peso de 10% no índice geral, varia 1,80% e 14,62%, respectivamente.

Alta do índice deve continuar

Apenas o minério de ferro somou 20,64% no mês. A cana teve alta de 18,65% e o milho, de 10,48%. Outro item importante é a soja, com aumento bem menor (3,74%). Dados e análises do IGP-M apontam para a permanência do cenário de incerteza. Ou seja, o “índice do aluguel” deve continuar elevado.

Com isso, as redes sociais mostram a preocupação de inquilinos com a variação do IGP-M, índice de referência para reajuste do aluguel. Em vários casos, a negociação prevaleceu. Mesmo os dados do Secovi-SP demonstram que o aumento médio dos contratos fica bem abaixo da inflação medida pelo IGP-M. Em abril, o índice acumulado em 12 meses atingia 32,02%. Já o aumento médio do aluguel, no mesmo intervalo, foi de 2,91%.

Projetos na Câmara

No último dia 18, a Câmara aprovou o Projeto de Lei (PL) 827, que proíbe despejo ou desocupação de imóveis até o fim deste ano, inclusive suspendendo atos praticados desde 20 de março do ano passado. O plenário da Casa aprovou um substitutivo do deputado Camilo Capiberibe (PSB-AL). O texto foi para o Senado.

“O projeto protege os mais vulneráveis, aqueles que passam fome e ainda têm de arranjar dinheiro para pagar o aluguel”, disse à Agência Câmara a deputada Natália Bonavides (PT-RN), uma das autoras do projeto original, ao lado de André Janones (Avante-MG) e Professora Rosa Neide (PT-MT).

No caso de imóveis urbanos regulares, o locatário terá de “demonstrar a mudança de sua situação econômico-financeira em razão de medidas de enfrentamento à pandemia a tal ponto que tenha resultado na incapacidade de pagamento do aluguel e demais encargos sem prejuízo da subsistência familiar”. O limite é de aluguel residencial de até R$ 600. E de R$ 1.200 para não residenciais.

Outro projeto (PL 1.026/2021), de Vinícius Carvalho (Republicanos-SP), determina que os contratos não podem ser reajustados acima da inflação oficial. Ou seja, do IPCA.

Questão de bom senso

De acordo com a Associação das Administrador de Bens Imóveis e Condomínios de São Paulo (AABIC), os reajustes de contratos neste ano variam de 6% a 10%, também bastante abaixo do IGP-M. “Com as altas taxas de vacância e o IGP-M muito fora da realidade, inquilinos e proprietários têm usado o bom senso para fazer as negociações sobre o aluguel”, diz o presidente da entidade, José Roberto Graiche Júnior, “Hoje, a lei permite que locador e locatário consigam definir o índice mais adequado para ambos.”

A taxa de vacância a que ele se refere foi de 22,9% em março, ante 18% em igual período de 2020. É o percentual de imóveis vagos e disponíveis para aluguel. No setor comercial, essa taxa é de 27,5%, ante 20% há um ano, mas abaixo do recorde de dezembro (38%). Já o aluguel residencial tem vacância de 20,6%, bem acima de março de 2020 (9%).