Cesta básica

Inflação dos alimentos também está relacionada ao modelo do agronegócio

Alta no dólar, que favorece a exportação do setor, deixa o mercado interno desabastecido e prejudica o trabalhador mais pobre do Brasil. “Isso mostra a importância da agricultura familiar”, destaca diretor técnico do Dieese

Marcelo Camargo/EBC
Marcelo Camargo/EBC
O arroz e o feijão estão entre os alimentos com alta no mês, segundo a pesquisa

São Paulo – A opção do agronegócio brasileiro pela monocultura, que limita a produção de grãos e alimentos no país, tem provocado também um alta no preço dos produtos da cesta básica. Levantamento do Dieese, divulgado na sexta-feira (4), já mostrava que os alimentos mais básicos do dia a dia registraram um aumento muito acima da inflação. No atacado, subiram 15,02% em 12 meses, até agosto. E para o mesmo período, no varejo, houve alta de 8,5%. 

Mas os dados também chamam a atenção para os alimentos que têm seu valor vinculado ao dólar, como é o caso do óleo de soja e derivados do leite e da carne – e que são exportados pelo Brasil. Com a moeda estadunidense em alta, cotada a R$ 5,30 na semana passada, grandes produtores rurais estão dando preferência à exportação, deixando o mercado interno menos abastecido. E, com isso, o preço sobe, como explica o diretor técnico do Dieese, Fausto Augusto Júnior, em sua coluna no Jornal Brasil Atual

“Um conjunto de produtos está vinculado à bolsa internacional, são commodities cotadas internacionalmente, como é o caso do açúcar. E, nesses casos, quando o mercado internacional se aquece, o trabalhador aqui no Brasil perde”, afirma Fausto ao jornalista Glauco Faria. 

Atingindo a mesa dos mais pobres

Em São Paulo, por exemplo, como mostrou a RBA, a cesta básica já superou os R$ 539,95. Ou seja, o trabalhador gasta mais da metade do salário mínimo, de R$ 1.045, para adquirir os produtos do dia a dia. O preço médio do arroz tipo agulhinha registrou alta em 15 capitais, o que ocorre também por conta da dependência maior da importação em um cenário de alta do dólar.

“O feijão tem uma produção cada vez menor, vinculada ao Nordeste, e vem perdendo espaço na cesta de produtos produzidos pela agropecuária, em especial porque a agricultura familiar vai encolhendo. Hoje, o quilo do feijão está passando da casa dos R$ 8. É algo quase que inadmissível num país da dimensão do Brasil, com a área produtiva que o país tem, termos alimentos de alta necessidade com redução de produção e inclusive com dificuldades para se encontrar dentro do mercado”, alerta o diretor técnico do Dieese. 

O impacto do setor na recente inflação de alimentos mostra a “importância da agricultura familiar”, como destaca Fausto. “Porque de fato é a agricultura familiar que coloca a comida no prato dos brasileiros. Mas que no Brasil é bastante prejudicada e pouco apoiada”, pontua. 

Reportagem desta terça (8) mostra que a proposta de orçamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em 2021, enviada pelo presidente Jair Bolsonaro ao Congresso Nacional, praticamente reduz a zero a verba para a reforma agrária. Quando, na verdade, o país deveria impulsionar um processo de democratização e desconcentração da terra, como defende o Dieese. Do contrário, o foco na monocultura, que privilegia apenas a produção de alguns grãos, vai continuar penalizando os mais pobres. 

Redação: Clara Assunção. Edição: Glauco Faria