SOBERANIA EM XEQUE

Senador defende nova análise do Cade sobre fusão entre Boeing e Embraer

Conselheiro aprovou operações, mas Jean Paul Prates (PT-RN) entende que todo o colegiado deve se manifestar. Ontem, empresa realizou 30 demissões

Roosevelt Cássio / smsjc
Roosevelt Cássio / smsjc
Trabalhadores em defesa da empresa: "A forma como os cortes estão acontecendo reafirma a postura nada transparente que a Embraer está assumindo durante todo o processo de transição", afirma diretor do sindicato

São Paulo – O senador Jean Paul Prates (PT-RN) afirmou nesta terça-feira (4) que vai entrar no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) com uma interpelação para que o colegiado do órgão se manifeste sobre a fusão da Embraer com a Boeing. Em 27 de janeiro, o conselheiro do Cade Alexandre Cordeiro Macedo aprovou duas operações envolvendo as empresas.

A primeira consiste na aquisição pela Boeing de 80% do capital do negócio de aviação comercial da Embraer. A outra aprova a criação de uma joint venture (reunião de duas ou mais empresas para realizar uma atividade econômica comum) voltada à produção da aeronave de transporte militar KC-390.

Segundo regulamento do Cade, os conselheiros têm 15 dias para contestar a decisão de Cordeiro Macedo, que é superintendente-geral do órgão – o prazo, portanto, expira na próxima segunda-feira (10). Se a decisão for contestada, automaticamente será revista pelo colegiado do órgão.

Crítico da fusão, Jean Paul Prates entende que decisão dessa magnitude não pode ser definida por um único conselheiro do órgão. “O Brasil é a parte mais interessada no assunto. Precisamos nos manifestar para que esse tema seja apreciado por todo o colegiado do Cade. Estou entrando com uma interpelação nesse órgão sobre o tema”, disse.

Ontem (3), a Embraer demitiu 30 trabalhadores da área de aviação executiva, segundo informou o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, no interior paulista. Foi o primeiro corte realizado após a transferência do setor para o distrito de Eugênio de Melo, também em São José.

Até 1º de janeiro, a aviação executiva ficava na sede da Embraer, que agora é ocupada pela Yaborã, figura jurídica criada como empresa de transição até que a venda para a Boeing seja concluída. A Embraer, agora, centraliza-se em Eugênio de Melo e possui cerca de 3.500 funcionários.

Jean Paul afirmou que o legislativo e a sociedade precisam debater melhor esse tema. “Querer passar uma empresa valiosa brasileira para outra que está quebrando é o mesmo que dizer que a Boeing vai abraçar nossa Embraer e vai levá-la para o fundo do poço”, afirmou. Ele lembrou também que a empresa Boeing está envolvida com sérios problemas na fabricação de seus modelos 737 Max, que protagonizou dois acidentes fatais nos últimos cinco meses. “A Boeing é um buraco negro, um sugador de energia e de dinheiro diante dessas vítimas fatais. Ela vai engolir nossa Embraer.”

Demissões preocupam

As 30 demissões desta segunda-feira são vistas com preocupação pelo sindicato. Sem que a empresa detalhasse as justificativas sobre os cortes, os demitidos foram informados apenas que “não havia lugar para eles na nova fábrica”.

Nos últimos meses de 2019, a Embraer já havia demitido cerca de 300 trabalhadores – sendo a maioria da aviação executiva. O sindicato chegou a organizar um protesto, no dia 19 de dezembro, contra as demissões que vinham acontecendo. No dia 21 de janeiro, a Embraer fez uma cerimônia de inauguração das novas instalações da fábrica de Eugênio de Melo, com a presença dos trabalhadores, mas a realidade começa agora, segundo o sindicato.

“A forma como os cortes estão acontecendo reafirma a postura nada transparente que a Embraer está assumindo durante todo o processo de transição. Apesar de todas as tentativas feitas pelo sindicato para conversar com o presidente da empresa, não houve qualquer abertura de diálogo”, afirma o diretor do sindicato André Luis Gonçalves, o Alemão.

Na Europa

Depois de suspenderem a análise da fusão, os reguladores de mercado da União Europeia (UE) marcaram para até 30 de abril o prazo para apresentarem uma decisão. Diferentemente do Cade, a União Europeia pretende tomar uma decisão com base em informações dos impactos do negócio para o mercado.

Em dezembro, a UE chegou a pedir dados de 20 anos de atuação de vendas das duas empresas. As preocupações se justificam pela redução do número de empresas atuantes no segmento de jatos, o que apontaria para a monopolização do mercado de aeronaves.