Negócios à parte

União Europeia quis fragilizar Venezuela por acordo com Mercosul

Segundo o analista político Amauri Chamorro, acordo anunciado é prejudicial aos trabalhadores do bloco sul-americano e resistência da Venezuela, Uruguai e Bolívia era empecilho

Agência Brasil/EBC
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Junto com Uruguai e Bolívia, a resistência da Venezuela a pontos do acordo que prejudicam os trabalhadores atrapalhava a negociação do Mercosul com a União Europeia

São Paulo — O papel desempenhado pela Venezuela na presidência rotativa do Mercosul em 2016, ainda que não tenha sido pleno, provocou pressões dos Estados Unidos e União Europeia sobre a América Latina, e isso influiu na reta final da negociação do acordo de livre comércio entre o bloco sul-americano e a Europa, anunciado e comemorado pelo governo de Jair Bolsonaro. A análise é de Amauri Chamorro, jornalista e analista político, em entrevista aos jornalistas Glauco Faria e Marilu Cabañas, na Rádio Brasil Atual.

Chamorro destaca que o Mercosul não poderia ter suspendido a Venezuela, pois não há essa prerrogativa no estatuto do bloco.“Já existia a pressão internacional de tentar deixar a Venezuela ‘num canto’ em relação à sua capacidade de articulação na América Latina”, explica.

Ele pondera que o Mercosul é fundamentalmente um bloco econômico, num modelo neoliberal, diferente de outros blocos, como a União de Nações Sul-Americanas (Unasul), a Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (Alba) e a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), esses com viés mais político e social. No período em que a Venezuela foi impedida de exercer de maneira plena a presidência do Mercosul, já era conhecida a posição crítica do presidente venezuelano Nicolás Maduro com relação a determinados pontos da negociação entre o bloco sul-americano e a União Europeia. Ao presidente em exercício do Mercosul cabe o papel de liderar as negociações.

Acompanhe a entrevista

O acordo recentemente anunciado, segundo o analista político, obrigará os países do Mercosul a mudarem suas leis trabalhistas. “Vai haver a destruição dos direitos dos trabalhadores no Mercosul”, afirma. “Na verdade, o Mercosul vai se colocar à disposição daquilo que a União Europeia impôs. Isso é contrário, inclusive, em alguns países, às suas constituições. Então, a Venezuela era um problema, que somado ao Uruguai e à Bolívia, formava uma resistência.”

Os interesses econômicos estão por trás, também, da formação do chamado “Grupo de Lima”, um grupo de líderes de direita que atua como “tropa de choque” para impedir a Venezuela de se articular com as forças sociais e políticas do continente. O grupo surge após sucessivas derrotas dos Estados Unidos em tentar impor sanções à Venezuela no âmbito das Organizações dos Estados Americanos (OEA).

Nesta quarta-feira (17), inclusive, o ministro das Relações Exteriores da Venezuela, Jorge Arreaza, se reuniu com António Guterres, secretário-geral da ONU, para tentar articular ações contra o bloqueio econômico que a Venezuela sofre atualmente. “São medidas coercitivas dos Estados Unidos contra um país absolutamente soberano”, afirma Amauri Chamorro.