Reforma bancária

PT quer competição entre bancos para reduzir os juros e aumentar o crédito

Novo sistema funcionaria baseado na progressividade da cobrança de impostos sobre o spread bancário. Bancos que reduzirem juros serão compensados com queda na tributação

Ricardo Stuckert/Jefferson Rudy/Agência Senado

Para manter lucros elevados nas operações de crédito, taxas de juros dos bancos ultrapassam os 280% no cartão

São Paulo – Um dos eixos econômicos do programa do PT é a “democratização do crédito”. O candidato a vice na chapa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e seu porta-voz, Fernando Haddad, tem defendido uma reforma do sistema bancário brasileiro, com a instituição da cobrança progressiva de impostos para estimular a concorrência entre os grandes bancos privados. O objetivo é forçar a redução do spread, que é a diferença entre o que as instituições bancárias pagam como remuneração ao poupador e o quanto cobram para emprestar. 

“Nós vamos dar um choque de juros nos bancos. Vai ter que baixar o juro para a pessoa poder tomar empréstimos, fazer o crediário, abrir um negócio, gerar emprego, limpar o nome”, afirmou Haddad, nesta quarta-feira (22), após participar de uma carreata em Aracaju. Em outras palavras, “Quanto mais juros o banco cobrar, mais imposto ele vai pagar. Quanto menos juros cobrar, menos imposto vai pagar”, explicou o candidato.

As elevadas taxas de juros cobradas pelos bancos complicam a vida das empresas que, com o dinheiro mais barato, poderiam tomar empréstimos para expandir a produção, criando vagas de empregos. Também é um tormento na vida do cidadão que, ao se endividar, se vê enforcado com juros que ultrapassam os 280% ao ano no cheque especial e no cartão de crédito. 

Segundo o economista Guilherme Mello, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), trata-se de uma proposta “simples, mas bastante inovadora” porque estabelece uma regra geral, que vai funcionar tanto para os bancos públicos e privados, como para cooperativas de crédito e fintecs (empresas digitais que prestam serviços financeiros). 

Vamos supor que o Banco do Brasil resolva baixar a sua taxa de juros e o spread cobrado. Num primeiro momento, teria uma rentabilidade esperada um pouco inferior à média do mercado. Com esse novo tratamento, baseado no conceito de progressividade tributária, o banco não perde rentabilidade, porque é compensado com uma queda da tributação (impostos), e consegue repassar isso para o consumidor, com um crédito mais barato”, detalha Mello.

Com a queda na tributação e ofertando crédito mais barato, a tendência é que o banco aumente a sua participação no mercado, obrigando as demais instituições a seguirem a mesma trilha. “O que a gente está propondo é simplesmente mais competição. Se bem compreendida a proposta, não é motivo para nenhum tipo de reação violenta de qualquer tipo. Ela não opera na lógica da intervenção e do controle estatal, está inserida na lógica da concorrência capitalista”, defendeu o economista. 

O economista João Sicsú, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), relaciona a proposta petista com as formulações do economista norte-americano Sidney Wintraub, que concebeu solução parecida, nos anos de 1970, para conter combater a inflação provocada por grandes empresas que aumentavam os salários dos seus trabalhadores mas repassavam diretamente o custo dessa elevação para o consumidor final.

“Wintraub identificou que eram poucas empresas que tinham esse poder de mercado, e eram justamente aquelas que atuavam em mercados oligopolizados (quando um pequeno número de empresas controla um determinado mercado), e que podiam sacrificar os consumidores sem perda de receita. Sua proposta, então, foi impor um sacrifício a essas empresas, aumentando os seus impostos. Logo, a receita adicional adquirida ‘à força’ dos consumidores seria perdida, o que obrigaria as empresas a não utilizar o seu poder de mercado impondo os preços que quisessem aos consumidores”, explica Sicsú. 

Ele diz que aplicar os conceitos de Wintraub ao sistema financeiro nacional, altamente concentrado – os  quatro maiores bancos do país (Itaú-Unibanco, Bradesco, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal) responderam por 78,51% do mercado de crédito, em 2017 – é uma “ideia excelente”. 

“Para poderem praticar um elevado spread nas operações de crédito, os bancos brasileiros cobram taxas de juros elevadas dos clientes. Assim, inspirado por Wintraub, preços mais elevados implicariam maiores volumes de impostos cobrados dos oligopólios. Isso aplicado ao caso brasileiro seria: maiores spreads (juros mais elevados) implicaria maiores volumes de impostos”, diz o professor da UFRJ.