Mercado de trabalho

Governo corta verba, e pesquisa que mede desemprego e desalento está ameaçada

Divulgação da PED, desenvolvida pelo Dieese e Fundação Seade, caiu de sete municípios para três. Metodologia identifica quem procura emprego e não acha, e quem deixa de procurar por falta de condições

Roberto Parizotti/CUT

Patricia, do Dieese: prejuízo para a academia e também para as políticas públicas

São Paulo – Na semana passada, entre outros dados ruins, o IBGE apontou crescimento do desalento, que indica a quantidade de pessoas que desistiram de procurar trabalho. O conceito foi criado nos anos 1980, no surgimento da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), do Dieese, mantido por entidades sindicais, e da Fundação Seade, ligada ao governo estadual paulista.

A PED, que detalha o mercado de trabalho na região metropolitana de São Paulo, passou a ser divulgada em 1985. Depois, espalhou-se para outras regiões. Atualmente, está sob ameaça, por falta de recursos: o governo federal não liberou nenhum centavo este ano.

O chamado Sistema PED já chegou a ser divulgado em seis áreas metropolitanas, além do Distrito Federal. Acabou nas regiões de Belo Horizonte, Fortaleza, Recife e, no mês passado, em Porto Alegre. A implementação dessas pesquisas ocorreu entre 1984 e 2008. A PED passou a integrar o Sistema Público de Emprego, Trabalho e Renda e servir como termômetro a ser considerado na elaboração de políticas públicas.

Quando era aplicada nas sete regiões, a PED cobria 147 municípios, com 219 mil entrevistas domiciliares por ano. As entidades parceiras incluía as sete secretarias estaduais, um consórcio intermunicipal (ABC paulista) e uma prefeitura (Porto Alegre), envolvendo 520 pessoas, com orçamento de aproximadamente R$ 24 milhões.

Devido ao fim dos recursos, agora está apenas em três regiões, que não dependem de dinheiro federal: São Paulo, Distrito Federal e Salvador. Em São Paulo, onde a pesquisa surgiu, o orçamento é do governo estadual.

A pesquisa Dieese-Seade inclui uma taxa de desemprego total, que é a divulgada mensalmente. Essa taxa se divide em desemprego aberto e fechado, e este tem ainda uma subdivisão: por trabalho precário e por desalento. 

“Na década de 80, a gente tinha taxas elevadíssimas de desemprego e as estatísticas oficiais não colavam na realidade. Só pegavam o desemprego aberto. Foi assim que a pesquisa nasceu”, diz a técnica do Dieese Patricia Pelatieri, coordenadora da PED.

Desemprego aberto, pelo conceito da PED, inclui pessoas sem trabalho nos últimos sete dias, mas que procuraram trabalho nos 30 dias anteriores ao da entrevista. No oculto pelo trabalho precário estão aqueles que fizeram algum trabalho, remunerado ou não, nos últimos 30 dias e buscaram uma ocupação regular. Por fim, o desemprego oculto pelo desalento é aquele em que as pessoas desistiram de procurar, por desestímulo ou outras circunstâncias, como falta de dinheiro para a condução. 

Arte desemprego 1.jpg

Arte desemprego 2.jpg

Cortes

A diferença, em relação à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE, é que os “desalentados”, no caso do instituto, são considerados inativos e não desempregados.

Embora eles não apareçam na taxa oficial de desemprego, Patrícia observa que o IBGE passou a incorporar conceitos nascidos na PED, também reconhecidos pela Conferência Internacional dos Estatísticos do Trabalho (Ciet) da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Nada disso sensibilizou o governo federal, que vem cortando recursos desde 2016 (gestão Temer). Para este ano, não veio nada. O secretário-executivo do Ministério do Trabalho, Leonardo Arantes, apenas encaminhou um ofício falando em dificuldades financeiras. A técnica do Dieese observa que a decisão sobre o tema caberia ao Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Procurado, o ministério não se manifestou.

Por mobilização da Comissão de Trabalho da Câmara, foi incluído no orçamento da União deste ano um valor de R$ 5 milhões destinado à pesquisa. Mas os recursos foram contingenciados (bloqueados) pelo governo.

“Concretamente, estamos sem nenhum recurso”, lamenta Patricia. No Rio Grande do Sul, a pesquisa se manteve até o mês passado. Continua sendo feito nas três regiões que não dependem do dinheiro federal. No Distrito Federal, o Dieese elaborou novo questionário, já abordando mudanças vindas com a Lei 13.467, de “reforma” trabalhista.

A política do governo Temer compromete, mais uma vez, o acompanhamento sistemático do mercado de trabalho. A Pnad Contínua tem uma série histórica muito recente, apenas a partir de 2012, depois que o IBGE optou por não manter a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), que era feita em seis regiões metropolitanas – e também havia tido sua série histórica interrompida em 2002, por mudanças metodológicas. Agora, a ameaça recai sobre a PED. Patrícia lembra que a pesquisa de Porto Alegre tinha quase 30 anos. “É uma perda muito grande, não só para a academia, mas para as políticas públicas”, diz, sobre as dificuldades para manutenção das pesquisas.

Em 2017, na média anual, a região metropolitana de São Paulo tinha 2,002 milhões de desempregados, sendo 1,646 milhão no desemprego aberto, 278 mil no trabalho precário e 78 mil no desalento. A taxa total foi de 18% – 14,8% no aberto e 3,2% no oculto (sendo 2,5% no precário e 0,7% no desalento).

Na comparação com 2016, todos os resultados pioraram. São 137 mil desempregados a mais, crescimento de 7,3%. O que mais cresceu foi o desemprego pelo desalento: 16,4%, ou 11 mil a mais.