Entrevista

Clube de Engenharia: ‘Lava Jato está esfacelando a indústria nacional’

A operação da PF tem como fundamento aparente a apuração de corrupção, mas o resultado é o esfacelamento da indústria aqui instalada. Âncora do desenvolvimento, Petrobras precisa ser defendida

Geraldo Kosinski/Petrobras

“Se a Petrobras for destruída, as empresas estrangeiras vão se apoderar do nosso petróleo”

Brasil de Fato – Pedro Celestino é engenheiro civil, especialista em transportes, e comanda há mais de 40 anos uma empresa de engenharia consultiva. Por anos, foi presidente do conselho da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), que administra 60 aeroportos. Hoje é presidente do Clube de Engenharia, instituição às vésperas de completar 135 anos de existência. Em entrevista ao Brasil de Fato, Celestino afirma que a Petrobras está sendo alvo de desmonte e deve ser defendida, pois é a âncora do desenvolvimento industrial brasileiro. Para ele, os desdobramentos da Operação Lava Jato estão levando ao desmantelamento das empresas nacionais e de tudo o que foi desenvolvido nos últimos 60 anos.  

O que está acontecendo com a indústria brasileira, com o avanço das investigações da Operação Lava Jato?

A Operação Lava Jato tem como fundamento aparente a apuração de corrupção, mas o resultado disso é o esfacelamento da indústria aqui instalada. Eu uso sempre como exemplo o que está ocorrendo com a Volkswagen, que fraudou mais de 10 milhões de clientes no mundo inteiro, está pagando multas bilionárias, perdeu presidente, tem diretores processados, mas não deixou de produzir um só veículo nesse tempo.

O que estão fazendo no Brasil é acabar com empresas que têm mais de 60 anos de contribuição ao desenvolvimento brasileiro e empregam centenas de milhares de pessoas. Nós do Clube de Engenharia somos a favor do combate à corrupção, mas não podemos nos silenciar diante do que está acontecendo no país.

Qual a importância de preservar as empresas nacionais?

É bom ilustrar essa pergunta com uma experiência prática: Noruega e Nigéria. Os dois eram países pobres que tiveram o petróleo como principal fonte de desenvolvimento. Mas a Noruega se pautou em um programa de desenvolvimento que privilegiava a produção nacional, Nigéria só privilegiou empresas estrangeiras.

Hoje a Noruega é um dos países com maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do planeta. Já a Nigéria é um dos países mais miseráveis, apesar de ser um dos principais produtores de petróleo do mundo. Se a Petrobras for destruída, as empresas estrangeiras vão se apoderar do nosso petróleo, sem compromisso de prestar qualquer contrapartida em termos de transferência de tecnologias, geração de empregos e pagamento de impostos.

Na última licitação aberta pela Petrobras para retomada das obras do Comperj, apenas empresas internacionais foram convidadas. Qual a sua avaliação sobre os caminhos que levaram a Petrobras a tomar essa atitude?

Empresas estrangeiras que não possuem sequer uma fábrica no Brasil. Se estivessem instaladas aqui o problema seria menor. Os acordos de leniência são necessários para que as empresas possam trabalhar. Mas, mesmo com o acordo assinado, a Petrobras se recusa a aceitar. Então podemos ver que o objetivo não é recuperar nossas empresas e sim destruí-las.

O que estão fazendo é menosprezar as empresas brasileiras e deixar de lado o que se acumulou no país ao longo dos anos, por conta de uma visão mesquinha da direção da Petrobras. Querem comprar onde for mais barato. E aí? Só vamos comprar da China então? O que vai acontecer com o brasileiro?

Nesse sentido, acredita que está havendo um desmonte também da engenharia brasileira?

Com certeza está havendo um desmonte da engenharia brasileira. Não só da engenharia, mas de tudo o que foi feito no país nos últimos 60 anos. Do jeito que as coisas estão caminhando, vamos voltar à condição colonial, de produtores de grãos, carne e minério. 

O que está acontecendo com o processo de capacitação que estava em curso no Brasil? Tudo isso fica paralisado diante desse cenário?

Está indo tudo para o ralo. Esse governo que aí está não tem interesse em desenvolver capacitação técnica nacional. Ele não dá a menor importância para o desenvolvimento do conhecimento. É um governo obscurantista.

Como preservar empresas nacionais diante de escândalos de corrupção?

O que temos que fazer é uma ampla aliança entre o capital produtivo e os trabalhadores. Precisamos exigir do governo que haja uma política de desenvolvimento para o país, medidas que sustentem o emprego, uma medida mais drástica para diminuição da taxa de juros. Precisamos ainda lutar pela manutenção do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), que também está na mira desse governo.